Uma das partes mais agradáveis de pertencer ao mundo pop, é ter sua mail box lotada de listas de discussão de gente que não tem o que falar sobre música, cinema e literatura.
Outro dia, li num weblog de um site "pop" um depoimento que dizia: "nada se compara a receber emails cool de gente pop". Uma das moedas correntes do mundo pop é a quantidade de pessoas "in" que você conhece . Quanto mais losers do circuito alternativo pop você conhecer, mais você será pop, e, como veremos depois, esse fato estará intrinsecamente ligado ao número de gostosas pseudo intelectuais que você poderá comer. Portanto, se você já calejou as mão tocando banjo em bares chinelos e cansou de ter que aparar os cabelos da mão, apresse-se e leia nosso manual, antes que a moda passe e você fique com o pé na lama, de onde, aliás, seu bimbo não sai a horas...
Então, o que fazer para ser mais um olimpiano da cultura? O primeiro passo é saber o que é olimpiano. Como não poderia deixar se ser, olimpiano é quem vive no Olimpo, aquele lá das mitologias gregas. Fácil né?
Viver no Olimpo é cool. Só no néctar, trabalho nécas. Aparecer na mídia, seja ela que mídia for também é muito bom. O olimpiano de hoje é o ser mais cool e mais cult da face da terra. E ser um olimpiano muderno está cada vez mais fácil. A sociedade tem contribuído para que todos sejamos olimpianos por quinze minutos, seja o olimpiano trash do programa do Ratinho ou o olimpiano clean do webblog.
Mas a ascenção social do olimpiano pode sofrer um upgrade se ele souber ser uma pessoa aparentemente cult. Então, após o "Manual de aplicação diária das máximas do Humberto Gessinger" (edição 37 do Argumento - http://www.argumento.net/arquivos/pg_argumento37.shtml#992141292), apresentamos aqui o MANUAL MUDERNO DO OLIMPIANO DO MUNDO CULTURAL. Com ele você fará sucesso em rodas intelectuais e certamente terá seu nome limpo da lista negra do SPC, Serviço de Proteção à Cultura.
Como regra geral, monte um site e elogie sem critérios as bandas do circuito pop, inclusive recomende a todos a compra dos cds. Esse será seu primeiro passo em rumo ao mundo pop e, com certeza, você receberá muitos emails indie de outras pessoas do mundo pop te elogiando. Nunca esqueça: elogiar é a regra: elogie bandas, livros, cds, filmes, mesmo que você não saiba o que está falando. A maioria também não saberá o que está lendo. Só estarão ali matando os minutos que se intercalam entre os outros minutos de fama.
Para que o sucesso seja pleno, copie o design de um grande portal e organize seu site de um modo que se pareça mais com um catálogo de compras do que com uma publicação cultural. Ah, quando for falar dos ícones da cultura pop, não esqueça de caprichar em adjetivos como "sensacional, cool, ótimo, grande, excelente". Só use "supimpa" se seu público leitor for da idade do m2b prá cima.
Segundo: tudo o que você fizer vai ter que estar ligado à TEORIA DO MITO DA IDENTIFICAÇÃO MUDERNA. Essa será a base de sua retórica, e explicará o porque de a literatura pop se alicerçar quase sempre em relatos pessoais e historinhas diárias de seus interlocutores. Sim, isso mesmo: Identificação. As pessoas vão ler sua intimidade e vão ver nela que, assim como elas, você é uma pessoa comum. Fale no que você comeu, e como o cheiro de brócolis queimado lembrou daquela banda indie que só lançou 3 singles (vendeu 1 milhão de cópias cada um, pois a distribuição era feita por uma major) e que doou metade da renda do disco para uma campanha ecológica que ninguém nunca ouviu falar.
Porém, não esqueça: seja sempre o mais comum possível. Somente através do método ZNAS (Zé Ninguém de Ascenção Social) você será pop-olimpiano-midiático. Quem imaginou que sendo você mesmo, um zé ninguém, um dia você ia ser tão zé ninguém a ponto de deixar de ser comum! Cool, hein?
Mas o que seria do mundo pop se a gente não pudesse comer as gostosas que fazem parte da fila do gargarejo nos shows? Pois investindo na IDENTIFICAÇÃO você poderá traçar (ou ser traçada) por quase todos que não forem passivos nessa imensa suruba que é o universo animal do ser humano pop. Você lembra de quando um cachorro passa pelo outro na rua? Pois é, via de regra, um dá uma cheiradinha no traseiro do outro. Pesquisas apontam que esse é o princípio que rege a identificação.
"Snif!, snif! Esse cachorro deve ser da outra rua, o fiofó dele tá com cheiro de grama da dona Célia que mora ali na outra quadra. Baeh, isso me lembra daquela vez que fui lá no quintal dela chorar a dor pela cadela que me abandonou."
Entenderam? É a identificação, certamente. No inconsciente todo mundo quer se comer. Por isso, seja pop enquanto é tempo: cheire ainda hoje o traseiro daquela sua colega gostosa da faculdade que adora papos cabeça e frequenta bares cult. Daqui a uns tempos a moda passa e você não comeu ninguém. Zé ninguém!
