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Artigos-->SOMOS TODOS SENHORES SOMOS TODOS ESCRAVOS -- 07/11/2003 - 02:26 (João Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
SOMOS TODOS SENHORES SOMOS TODOS ESCRAVOS



João Ferreira

7 de novembro de 2003





Nietzsche é um autor que nos faz refletir profundamente. Levantou problemas importantes que nenhum outro autor levantou no século XIX enquanto crítico da civilização ocidental. E conseguiu fazer isso só porque era tremendamente independente.

A maior parte dos pensadores de seu tempo preocupava-se em pensar à direita ou à esquerda. Em pensar a favor da Igreja ou contra a Igreja, em favor do socialismo ou contra o socialismo, em favor do racionalismo ou contra o racionalismo. Era no confronto de uma dicotomia que os pensadores agiam e o resultado imediato era que assim continuavam a dividir o mundo em vez de concorrerem para o unir ou aproximar. Nietzsche ao contrário teve a coragem de enfrentar as dicotomias e as polissemias da cultura alemã e europeia de seu tempo. Com o profundo conhecimento que tinha da antiguidade grega e romana, ele pôde articular a dialética de uma nova concepção de mundo para além do bem e do mal, sem ficar sujeito à defesa de valores já caducos nem a regimes ou escolas de pensamento já degradados. Se alguma coisa pode ser concedida a Nietzsche é a sua independência. Como tal é um desconstrutor corajoso e por vezes atrevido, implacável. Um desconstrutor necessário que muita influência vai ter para o pronunciamento de muitas vanguardas européias de pensamento tanto em filosofia, quanto nas letras e nas artes. Sua obra "O Crepúsculo dos deuses" é uma metáfora à decadência dos principais valores ocidentais. O "Assim falou Zaratustra" é uma pregação telúrica de sinceridade e de autenticidade que tenta criar na terra uma nova esperança no próprio homem, em oposição ao pessimismo de Schopenhauer, ao clima de tédio e de ceticismo propalado por boa parte dos filósofos do século XIX. Mas é o livro "Para além do bem e do Mal" aquele que mais frontalmente analisa a mediocridade, a fraqueza e decadência de espirito do homem européu do fim-de-século.

Nietzsche desassombradamente, mesmo com fama de louco, tentou desconstruir essa mentalidade e essa civilização decadente para tentar pregar novos valores e nova visão crítica do própçrio homem. Ele analisa aquilo que pode significar um espírito livre. Mostra a mensagem que ainda pode ser dada ao mundo pela classe dos eruditos, e parte para discussão de um novo conceito de moral que pode dar ao mundo novas virtudes humanas.

A partir daí enuncia toda uma teoria do "ser social".

Nietzsche é um dos autores modernos que melhor analisou as manias da grandeza e da loucura, da dominação, do poder imperial, da escravidão e sobretudo da "ipsissimosidade". A ipsissimosidade, um termo novo que ele inventou em alemão (=Ipsissimositaet) não é mais do que um recurso à reafirmação radical da individualidade e da singularidade e à presença de cada um no mundo. No fundo, mesmo com as manias de grandeza e de megalomania de muita gente, a realidade mostra os limites dos que mais desejam chamar a atenção "para o nada que são" e "para o nada que fazem". O poder senhorial e imperial é muito pequeno. Segundo Nietzsche há uma diferença entre proclamação de "ser" e a "realidade do ser". Todos somos senhores de alguma coisa e todos somos escravos de muitas coisas. O consenso de vivência e convivência se situa por isso num espaço que na visão nietzscheana se condensa na máxima: "libertemo-nos de todos os senhores". Libertemo-nos de todos os loucos que que têm assomos de poder e que habitam em nossas proximidades. Libertemo-nos dos neuróticos e dos megalômanos e das nulidades dos pseudo-intelectuais que tentam ocupar nossas horas. Libertemo-nos dos chatos que querem tornar-se senhores de nosso tempo e de nossa atenção. Libertemo-nos de todos os senhores, mesmo que seja por instinto de auto-defesa. Libertemo-nos dos pseudo-pensadores e dos pseudo-comunicadores, dos arrogantes e dos presunçosos que têm a mente, diz Nietzsche ainda, "cheia de infernidades", dos que se auto-glorificam e auto-proclamam como "sumidades", de certos filósofos e de certos pedagogos -"os mais presunçosos de todos os sábios"(Nietzsche), dos "especialistas" daltônicos, utilitaristas, oportunistas... dos que arrogantemente desprezam a razão social, a razão da maioria pensante, dos que ignoram as fronteiras do conhecimento. Libertemo-nos dos "filósofos mixordeiros" que se autodenominam conhecedores da realidade, mas que são apenas decadentes cintilações da palavra moribunda, candidatos a uma dominação fracassada pela palavra... Libertemo-nos dos senhores "imbuídos de inveja mesquinha", que se alimentam do "instinto da mediocridade" e tentam anular o homem de atividade normal no mundo da expressão e do pensamento. Libertemo-nos dos pavões que balbuciam letras e frases sem atingirem a finura da expressão que divulga conhecimentos e pensamentos. Libertemo-nos...Porque a libertação por si só é já um ato contra a escravidão. Libertemo-nso na vida e na Usina. Libertemo-nos num ato de confiança e de cumplicidade com a verdade e com a dignidade. Libertemo-nos, "nós os que nos julgamos "eruditos", nós os da Usina...nós os que damos pelo nome de escritores, de poetas, de pensadores...Libertemo-nos em fraternidade, em solidariedade, sem desavenças, sem ódios - exercendo o pensamento, a humanidade. Libertemo-nos sendo gente. Respeitando a opinião do outro. Mantendo a boa vizinhança. Sem soberba. Buscando o melhor que a Usina nos oferece. O espaço vitual para nossa expressão e comunicação. Numa boa. Interlocutores, dialogantes. E sempre com a consciência de que todos somos senhores e escravos, de alguma maneira. Mais escravos quando não reconhecemos nossos erros. E mais senhores quando nos damos ao respeito e à boa convivência.





João Ferreira

7 de novembro de 2003
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