Em minha rua morou Eurica. Apesar de soar meio grego, quão inapropriado para u`a mulher daquela helenicidade. Casada, com uma penca de filhos, e um marido trabalhador, de ar paternal, parecia ter todos os elementos para a completa felicidade. E vai ver que era feliz e realizada.

Vê-la à janela que dava para a rua, quase invariavelmente com o menorzinho ao colo, ou na soleira, que impressão mais podia se ter além dos desvelos de mãe? Respondia quando era saudada e pouco puxava conversa com a gente adulta vizinha ou apenas circunstante. Ficava de olho nos outros meninos, bonitos, garridos brincando no alpendre, e que raramente se aventuravam a ir à rua.

Via também os meninos outros mas sem neles fixar os olhos. Os olhos, posso arriscar que fossem claros, correspondendo aos cabelos castanhamente leves - e sempre curtos. A tez sustentava com graça aquela armação harmoniosa, quiçá combinando das maçãs, aquela suspeição de um rosa.

Volta e meia, deixava a janela, possivelmente para dar uma instrução na cozinha - e se espelho houvesse no percurso, quiçá uma olhadinha. Havia de lhe fazer bem, dar-lhe a segurança que tanto parecia, com sua presença, aos outros "roubar".

E dava gosto passar na minha rua, só para ver aquele rosto - mesmo sabendo que não haveria olhar de retorno, ou mesmo de consolo. Senão, imagino, tanta alma no maior rolo. Morar na rua, então, ao invés de paraíso, podia bem ser um suplício. Tanta espera,tanta esperança e a a vida não lhe trazia nada disso.