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cronicas-->Já faz tempo... -- 13/11/2016 - 21:29 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

...Que eu quero dedicar-me ao meu supremo interesse; este não pode ser outro que não a literatura. Eu vejo muitos esbanjando mistérios e energia num mundo já por si só esquisito; não vejo porquê eu não posso aqui viajar sem os limites impostos pela mediocrização e pelo abafamento dos melhores talentos pela massa da cultura vaga que nos ocupa em defender nossa egolatria.

Em nome deste tempo, eu aqui começo a longa maratona de edulcorar a pílula do ano seguinte e me vejo em plena chuva, às véspera da Grande Lua e do certeiro cheiro de umidade no ar a buscar minhas aparências ocultas. Elas existem, ah, podem esperar, porque nenhum homem tem na face aquilo que ele mais oculta escrito na face. Não concordam? Eu preciso exercitar meus músculos realísticos e detonar a moça que passa numa calçada cheia de bosta de cachorro para que vocês acreditem que ela é tão bela que colocou o guarda-chuva entre seu rosto e eu? Eu, ali, do lado de lá e a chuva me batendo nos óculos, lentes molhadas de uma água que teima em cair e a mocinha do lado de lá de guarda-chuva abaixado só para ofuscar o olhar que ela chama. Não que eu não a tivesse olhado, veja bem.

Cá entre nós,que é que tem estar passando numa calçada, vendo bosta de cachorro e poças refletindo copas de árvores sofridas com vocês que passeiam por aqui, olhos grudados numa tela que preenche o vazio das almas? Eu não tenho nada, só que sinto os pingos cairem, eles batem em intervalos regulares, toc, toc, toc e enchem as lentes de meu óculos de manchas transparentes, água que escorre em borbotões de calhas de casas velhas e meios-fios de cimento sujo. As águas que em remansos se juntam e somem nos grotões das bocas-de-lobo entupidas de pernas de bonecas, tocos de cigarro e garrafas de água desprezadas pela geração que frequenta as academias do bairro.

Eles estão lá, no vidro fumê espelhado e laranja dos dois andares, esteiras rolantes com dezenas de pessoas que "odeiam conversar na academia" e que se movem ritmadamente, compassadamente, mecanicamente, com fones de ouvido enfiados nos buracos que deviam ser utilizados para a troca entre um e outro, mas não: Eu descrevo a verdade, são dezenas, centenas de jovens,moças, meninos, rapazes e velhotes observadores anotando no caderno mental as asas da suprema idiotia.

Eu só falo a verdade; não vão lá pensar que eu bebi, porque nunca bebo tanto quanto como. Eu nem sabia que havia tanta gente nas ruas! Nesta chuva, só encontro tempo para olhar e quando me dedico com afinco a isso, porque tenho dois olhos, a última bolacha do pacote põe o guarda-chuva para baixo, para deixar de ser vista ou, talvez lá na cabeça da dondoca, mostrar seu desprezo narcisista por tudo o que é saudável. Ah, em tempo, dois plugues rosa pendem de suas orelhinhas que separaram seu crânio alvo da cabeleira que cai num cacho que lhe faz aparentar-se a um poodle.

Um poodle atarracado.

Um poodle de dentezinhos de sabre, uns olhos de tubarão-martelo, uma nuca de águia dourada, a voz talvez de uma coruja acocorada num muro imaginário de vidro alaranjado, cheio de reflexos de bundas suadas.

Não sou misógino, nem misantropo, não prefiro meu cão ao ser humano, não votei em ninguém de quem me arrependesse;a comparação talvez seja mais ofensiva ao pequeno animal do que à grande guardachuvada que ela deu na velhinha que passou:

--Ô guria besta! Levanta esta merda, porra!

Tudo absolutamente verídico. Costumo carregar, mas desta vez tudo o que me saiu entrou pelos meus olhos que um dia a terra não há de comer. Imaginem: Uma velhinha levando uma guardachuvada de uma solene musa mequetrefe do outro lado da rua num dia de chuva, na calçada cheia de cocô de cachorro, entre poças d'água refletindo um céu cinzento, mal-humorado como todas a mocinhas que resolvem fazer do seu dia a dia um eterno pesar de hormônios inúteis.

Comprei pão.

Volto para casa.

Boa noite.

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