Os homens estão cheios de calos.
E calam-se, mesmo assim.
Esses calos provêm do uso de sapatos de aço.
E dos chapéus de aço,
camisas de força,
fios que apertam o pescoço,
dedais de metal
e de tudo o mais que amordaça
não só os pés,
como também as mãos,
o estômago
e a alma:
alma de ferro.
Calos amigos da modernidade,
da indústria
e da mesquinhez de cobre.
Encobrem o sonho de algodão
para enobrecer o que dói,
o que machuca,
o que rasga a sensibilidade.
Os homens estão cheios de calos na alma
porque usam sapatos de aço,
cadarços de bronze,
luvas de alumínio.
O abraço foi reprimido, sob tortura.
Sobraram os frios apertos de mãos calejadas e metálicas.
Não deviam calar-se os homens.
Se falassem muito e cantassem e clamassem
– mesmo se o som saísse seco, pesado –,
Deus adoçaria essa humana máquina.
Desmancharia seus calos como bolhas de sabão.
Sem dor, sem maçarico.
E os chapéus de aço,
camisas de força,
fios e dedais
só fariam cócegas nos homens livres,
trariam música aos homens livres,
confortariam as nádegas dos homens livres.
Então, todos os artistas pintariam apenas sonhos, em vez de aço.
E buscariam cores claras, em vez de sangue morno.
Pintariam em suas telas a textura quente de um forte abraço.
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