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Cartas-->Desencantada declaração de não-voto no Rio de Janeiro -- 21/10/2008 - 16:54 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
DESENCANTADA DECLARAÇÃO DE NÃO-VOTO NO RIO DE JANEIRO

Vania Leal Cintra - socióloga


Ao que tudo me indica, Fernando Gabeira vai cruzar a faixa final com um corpo de vantagem. Isso nem é uma torcida nem é uma aposta — é só um palpite que arrisco nesse páreo. E é um palpite de quem está longe da pista de corrida. A impressão que me permite dizer isso não se deu hoje. Vem de antes do resultado do primeiro turno. E se fez de repente, num estalo, na hora do recreio, jogando conversa fora em um grupo virtual.

Em seguida, passei a observar com mais cuidado as manifestações dos demais com quem tenho contato e vivem no Rio, inclusive aqueles que pertencem a setores que tudo teriam, em toda a sua trajetória, para combater a candidatura de Gabeira. Percebi, no entanto, que a engrossam. Considerando que o que elege o Prefeito do Rio não são exatamente as propostas mais adequadas às aspirações materiais atribuídas àquilo que costumamos chamar de "o povo", mas sim as que buscam acudir as reais aflições emocionais das classes médias, e considerando que classes médias são grupos unidos que jamais serão vencidos, aquela impressão, gradativamente, mais se confirmou.

Nada tenho, particularmente, contra Gabeira ou contra Paes — exceto tudo o que eles representaram, representam e continuarão representando. O cargo de Prefeito é eminentemente administrativo; a campanha que se faz, no entanto, é política, ou seja, pretende ser política, baseada em posturas e promessas políticas e atributos políticos — ou, melhor dizendo, em supostos valores pseudo-políticos, que são julgados suficientes.

Quais, afinal, seriam os méritos administrativos de Gabeira, os que poderiam credenciá-lo à Prefeitura do Rio? Poder exibir um diploma de seqüestrador no currículo? Ter abraçado a Lagoa? Ser simpático, ilustrado e fotogênico? Gostar de libélulas e borboletas? Pretender afundar um barco para deleite de alegres mergulhadores? Prometer promover o funk ao lidar com a coisa pública? A excelência e a virgindade da coligação que o indica, na qual buscará seus assessores? A potoca de que “não nomeará” em troca de apoio dos Partidos?

Enquanto isso, Paes, aquele que, quando estava no PSDB (que hoje lança Gabeira e sem o qual este não chegaria ao 2º turno), pôde acusar o Presidente da República como sendo o “chefe da quadrilha” do Mensalão, pode agora ser apoiado pelo próprio Presidente da República e aceitar de bom grado esse apoio.

A ausência de coerência e de pudor nas campanhas político-eleitorais toma, pois, o mesmo vulto que a ausência da própria Política nessas campanhas, do único fator que poderia orientar os rumos tomados pela Administração, do único meio através do qual os resultados poderiam ser cobrados, e que se vê ausente em nome de uma decantada... “ética política”...

Nem sequer a aceitação generalizada (e repentina, no que se refere a Gabeira) de seus nomes como sendo “a solução” dos problemas da cidade é um mérito dos candidatos: é fruto do esforço de uma “inteligência” colorida e festiva que vem sendo capaz de transformar Butchs Cassidys, Johns Robies e Lampiões em valentes e românticos heróis populares — e que nunca produziu e não produz isso a troco de rapadura.

O sucesso de um ou outro nas classes médias se fez como se faz o sucesso de um conjunto de música pop, de um livro, de um filme, de uma marca. Não importa se algo é bom ou ruim. Entope-se o "freguês" de propaganda, e o que era feio vira bonito, o que era dissonante passa a ser harmônico, o que era agressivo ou caduco será considerado vanguarda, o que era grosseiro transforma-se em refinado, o que era incoerência se vê como virtude. E ai daquele que ouse manifestar opinião discordante ou emitir qualquer crítica ao deus ex machina sacado da algibeira de algum terno bem talhado, nos insuspeitados subterrâneos onde se reúnem os que detêm os controles dos instrumentos capazes de “fazer opinião”. O “delator” será malhado na praça como um Judas, será considerado um inculto, seu discurso será tido como obsoleto e qualquer crítica será considerada como um insulto à própria pessoa (ou à própria mãe) do eleitor-“freguês”, convencido da qualidade do produto oferecido e, por isso, com justiça, ofendido.

Talvez a isso aí eu me esteja arriscando agora.

Mas é uma eleição muito estranha, convenhamos, a que está em curso — apesar do fenômeno ser, em si e por si, reincidente, inclusive no âmbito das eleições à Presidência de nossa República. Estranha, para dizer o mínimo: Gabeira poderá levar a Prefeitura não só porque se apresenta como a “oposição” local e nacional, tendo-se em vista o apoio Federal dado ao seu oponente, como também porque, infelizmente, como sempre em nosso País, porque jamais são discutidas, as coisas da Política, ao se verem sufocadas pela política eleitoral, colocam-se em termos de "entre os males, o menor".

Estranho, mesmo, portanto, não é votar em Gabeira ou em Paes ou em outro qualquer — estranho é ver a população endossar as ladainhas impressas nos "santinhos" distribuídos principalmente via web, e entoá-las com contrição, como se todos fossem devotos de Antonio Conselheiro. O carioca bate no peito e vai em frente, colhendo e reciclando, emocionalmente, o lixo das ruas, perpetuando, em diferentes instâncias, o odor dessa cambada de zumbis que nos assombra, de dia e de noite, e que, de um jeito ou de outro, de nosso País viu-se dona, nada trazendo de novo ou que já não tenha sido repudiado por inoportuno, inconseqüente, contraproducente ou inequivocamente danoso, e como tal já não se tenha demonstrado.

Se todos têm, afinal, o direito de manter em silêncio ou declarar em alto e bom som o nome de sua escolha, levando-o ao conhecimento de todos e tentando influenciá-los no sentido de eleger o candidato que será, segundo sua fé, “a salvação”, poderei aqui declarar o meu não-voto no Rio.

Declaro-o porque o Rio está sempre comigo — continua sendo a minha cidade, onde vive parte de minha família e de meus grandes amigos — e o acompanho de perto, apesar de hoje residir tão longe dele; e, por aqui onde vivo e devo votar, graças à eficiência da máquina municipal e ao asfalto ralo derramado nas ruas de meu bairro chique e outros tantos, já estou livre do castigo de ter que voltar às urnas num 2º turno. Mas declaro, ao mesmo tempo, que tenho o resultado das eleições no Rio na conta do muito importante, pois o que no Rio ocorre ainda é capaz de ressoar politicamente pelo País inteiro e se reflete diretamente na estrutura do poder nacional.

Declaro ainda, porém, meu não-voto no Rio por duas razões mais: uma — porque considero o voto “útil” como sendo o avesso, se não o massacre e a agonia da Política; a outra — porque, ao projetar o resultado do entusiasmo manifestado em todos (TODOS!) os setores de classe média com a campanha de Gabeira — campanha essa que vem crescendo em oposição à do candidato de Lula da Silva (em quem o voto poderia ser negado já por princípio e pelos fins) e que faz do candidato um modelo exemplar de virtudes morais e cívicas, com direito a fã clube, fanfarra e altar-mor — duvido muito e faço pouco de se, de fato, é dada, ao eleitor carioca, a possibilidade de fazer a escolha por qualquer mal que venha a ser realmente menor que outro mal qualquer... da mesma forma como duvido se haveria, nessas eleições, algum mal menor ao acesso do paulistano, do belo-horizontino, do porto-alegrense, do...

Em suma: se já não havia qualquer opção no primeiro turno, muito menos há agora. Que tristeza. E, assim, o carioca apenas se incorpora à fritada geral em que todos nós, brasileiros, nos incluímos. A cada eleição nos dizemos fartos da mesmice, mas, se pularmos do fogo, cairemos direto na frigideira. De um jeito ou de outro, estamos fritos.

Essa minha declaração de não-voto pretende influenciar alguém? Decorreria de uma indiferença ou de uma aversão à Política? Da minha simpatia particular pelos devaneios de alguma facção radical? Não, nada disso. Eu apenas observo, analiso e aponto a absoluta inexistência de qualquer movimento em sentido alternativo àquele que nos leva ao absoluto vazio político nacional e o confirma.

E la nave va...


Obs.: Eu ecoaria a última frase: "E la rave và"... (F.M.)


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