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cronicas-->Candelabro -- 12/07/2016 - 16:18 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

À luz do candelabro, meio arco-íris marcava presença nos cabelos raros daquela mesa: As tias solteiras que intrigavam os visitantes com comentários maldosos sobre esta ou aquela sobrinha, ou sobre mais um casamento que não houvera, ou até sobre uma relação que naufragara. Sobrinhos corriam soltos feito fogo fátuo, as risadinhas enchendo o ar de sua presença; um ou outro primo mais velho encarava outra ou mais alguma prima mais linda, os sorrisos escusos entre olhos astutos, porque qualquer hora se desvencilhariam daquilo tudo que lhes prendia à força e...

A Reunião de família se marcara faz tempo, até porque o chefe de família seria por ali homenageado—uma vez que fazia aniversário.

A matriarca se esmerara a olhos vistos, combinando a entrega em tempo perfeito de mais acepipes e salgadinhos, doces e guloseimas: O carinho estava em cada ato e palavra, em cada gesto perfeito, em cada dobradura de guardanapos. Os doces provocavam frissons maravilhosos, mãos disfarçadamente se erguiam e tapas leves inibiam os mais afoitos...

O riso escondia os gritos, a luz escondia os raros defeitos, a graça sempre encobre a sombria relação do homem com o Homem; o disfarce fugaz dos dias que decorrem em anos e séculos sempre passa pelas mesas recheadas de sonhos de uma noite maquiavelicamente projetada...

Todos, a certa hora, receberam uma taça de vinho: fez-se silêncio absoluto, porque o patriarca iria falar, do alto de seus tantos anos.

Soou um sino.

--Queridos!

Todos os olhos se voltaram para ele. Até os olhos dos pequeninos rebrilhavam; todos o respeitavam pela sua justiça, equilíbrio e força espiritual.

--Queridos, do alto de meus setenta anos, tenho uma revelação a fazer!

O silêncio mais profundo se juntou ao maior silêncio ainda. Nem uma mosca seria ouvida ali, se fosse possível falar sobre isto.

--Eu tenho muito orgulho de dizer a vocês todos que, em minha festa de aniversário, eu posso congraçar tantos em tão pequeno espaço. Sinto-me honrado com vossa presença (e ergueu a taça que poderia ter batido no candelabro, fosse ele um pouco mais alto).

Seus cílios se moveram e suas sobrancelhas espessas e brancas pareciam donas de si mesmas quando ela falou com a voz a meio-tom, o suficiente para ser ouvido em todo o salão.

--Tenho a dizer que, nestes anos todos, tenho enganado a todos. Eu diria que, mais que a vocês todos, eu me enganei a mim mesmo. Não sou eu que vos fala do alto desta carcaça! Eu sou apenas uma voz dentre tantas vozes, não sendo maior nem menos que qualquer das outras que vocês ouviram em suas vidas pequenas e cheias de rotinas assustadoramente iguais. Eu falo de vossas rotinas, falo de vossas vidas acabrunhantes em tanto esmero, falo de vossas esquinas ventosas...De vosso medo da morte...Falo de vosso desespero infinito, recoberto de açúcar cristalizado. O amargor de vossas finitudes me espanta. Eu me espanto diante de vós!

Algumas taças caíram, tias ameaçaram desmaiar, netos sabiam que o momento era grave: Somente um bebê balbuciava as únicas palavras que talvez fossem as palavras da noite:

--Binqueedoo!!

--Etevaldo!! Quê é isto? Como pode fazer isto, Etevaldo?

--Minha querida esposa, que me acompanhou tantos anos, sou-te grato! Fizeste a mais bela festa que eu podia merecer...Mas não nos enganemos! Sou um extraterrestre! Estou entre vocês há tanto tempo que vocês mal me notam! Somente trouxe dinheiro, trabalhando como um mouro e tudo, absolutamente tudo que aqui está veio de meu suor, de minhas noites mal-dormidas, de meu bolso. Patético! Eu, o tal homem que se diz homenageado, eu mal me conheço...Mas sou uma sombra do que fui...E agora, revelo-me a esta sagrada família: Sou um extraterrestre, vindo de longe, de algures, do além-sol... Só para saber o gosto de tais genes que andei espalhando ao mundo! Eis que vejo três gerações que se iluminam pelos genes que vieram de tal distância...Que o silêncio cósmico escondeu!!!

Mais taças se partiram, lágrimas correram nos olhos dos mais sensíveis...Algumas mãos já se crispavam. Que direito tinha ele de dizer isto, a esta altura? Como assim? Um extraterrestre? Que balela é esta? Que segredo guardara este homem impoluto, cheio de segredos e manhas, cheio de manias,escusas maneiras?

--Ergo um brinde a vós, ó enganados por tantos milênios de mim!!!

--Binqueeeeeeedo!!!!

--Sofia!! Seu avô está falando!

Desanuviou-se a fronte de tal homem. Suas sobrancelhas grossas se juntaram num esgar, seus olhos se estreitaram, os lábios se contraíram em riso franco. O riso começou pela frente, espalhou-se como brisa, um vento varreu a toalha maravilhosamente cheia de doces, o vinho se filtrava nas luzes multicores dos cristais do lustre...Todos riram, todos gargalhavam, todos se abraçavam e somente Sofia sabia...Só ela sabia, antes de o saber, que o que se brincava ali era a valer.

 

--Ah, minha neta, só tu o sabes...Brincadeira!!!!!!!!!!

 
 
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