O documentário "Paulinho da Viola -- Meu tempo é hoje" está passando nos cinemas do país.
O filme é altamente recomendável.
Várias análises foram feitas sobre o filme e a obra de Paulinho da Viola. Nenhuma daquelas que li fala de dois pontos importantes. O primeiro é que Paulinho da Viola é um nobre no sentido preciso da palavra, de pessoa com vida e sentimentos nobres, não naquele de pertencer a uma hierarquia -- mais sobre isso em outro texto.
Outro ponto importante sobre o filme é que Paulinho da Viola é um clássico. Claro que esta palavra designa jogos de futebol tradicionais ou apenas melhores do que a média. Claro também que clássico pode designar músicas populares tradicionais e consagradas -- o que os americanos chamam "standards".
Talvez o último sentido se aplique a Paulinho da Viola como autor e intérprete de vários clássicos da MPB.
Contudo, existe um sentido da palavra clássico que se aplica à forma como Paulinho da Viola vê os sambas antigos. É o fato de que muitas obras literárias parecem não envelhecer: a tecnologia, a religião, a cultura e até a língua na qual foram escritas podem ter morrido, mas cada geração que as lê encontra sempre algo de importante e emocionante nessas obras que não morrem.
Mais do que não morrer, elas vivem e respiram.
Como dizia Ezra Pound, o conhecido crítico literário e poeta, sobre alguns clássicos pode-se construir todo um império, uma civilização.
Clássicos: Lusíadas, Ilíadas, a famosa tradução da Bíblia para o inglês conhecida como Bíblia do Rei James.
É assim que Paulinho da Viola interpreta -- ou lê -- os clássicos do samba: apesar da data antiga deles, Paulinho nos mostra que alguns dos sambas do passado podem ser compartilhados com ouvintes do presente e até do futuro.
Por isso o subtítulo do filme: Meu tempo é hoje. Paulinho da Viola não sente saudades de uma época já transcorrida que ele não viveu. Paulinho consegue trazer para a sensibilidade de hoje o melhor de cada samba clássico.
Como diria Pound, Paulinho da Viola criou o paideuma do samba: um conjunto apenas com autores essenciais para nossa compreensão da história e evolução da arte do samba.
Na verdade, Paulinho não fala explicitamente isso ou algo próximo, mesmo que sem as mesmas palavras: é preciso rever o filme.
Contudo, de fato de ele reconstitui autores quase esquecidos e mostra por eles um respeito semelhante ao de Ezra Pound por seus clássicos literários.
Sobre a nobreza de Paulinho da Viola, aguardem a próxima crônica desta série.