Usina de Letras
Usina de Letras
72 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62137 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10447)

Cronicas (22529)

Discursos (3238)

Ensaios - (10331)

Erótico (13566)

Frases (50547)

Humor (20019)

Infantil (5415)

Infanto Juvenil (4748)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140778)

Redação (3301)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1958)

Textos Religiosos/Sermões (6172)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Cartas-->UM MESTRE, UM ANJO -- 15/10/2006 - 23:07 (Ivone Carvalho) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
UM MESTRE, UM ANJO
(Ivone Carvalho)


Voltei ao Grupo Escolar João Vieira de Almeida muitos anos após ter me despedido daquela escola. O intuito era um só: descobrir o endereço residencial da professora Yolanda Ferreira de Rezende. Era de suma importância, para mim, localizá-la. E, ante a finalidade do meu pedido, consegui, da Direção do colégio, o atendimento ao meu pedido.

Eu sabia que a velha mestra já havia se afastado do magistério, pois me lembrava bem do quanto foi comentado por ela que no ano seguinte estaria, enfim, aposentada. Temia, sem dúvida, que a minha solicitação fosse negada, sob o fundamento de sigilo ou coisa que o valha. Temia, muito, receber alguma notícia desagradável e, conseqüentemente, a pior delas: de que ela já não vivesse entre nós. Mas não, para minha grande satisfação e alegria, tudo deu certo e saí de lá feliz da vida com o meu precioso endereço nas mãos.

Dias depois, numa tarde de sábado, peguei o mesmo caderno que guardo até hoje, após quase cinqüenta anos e toquei, meio sem jeito, a campainha daquele sobrado situado no bairro do Pari, em São Paulo.

Uma senhora de cabelos branquinhos, branquinhos, veio atender a porta. Minha vontade era de abraçá-la com todo amor e respeito que nunca deixaram de existir em mim, por ela. Mas, é claro, eu não poderia fazer isso. Cumprimentei-a e pedi licença para lhe mostrar o objeto que eu portava. Meio desconfiada, mas com o seu terno sorriso, como se estivesse adivinhando o que era aquilo, aceitou o envelope que eu lhe entregava.

Vi seus olhos brilharem e o início de uma emoção dominando seu rosto, quando reconheceu um caderno que, certamente, seria de uma ex-aluna, pois tinha todas as características impostas por ela: desde a cor e formato da capa, até a aparência de novo, obrigação de todos os seus alunos para conservarem todo material escolar sempre como novos.

Mas, as emoções estavam apenas começando. Ali, parada, sem conseguir falar, Dona Yolanda abriu o caderno e, ao ler o meu nome, abraçou-me chorando, dizendo não acreditar que era eu mesma quem estava diante dos seus olhos. Convidou-me para entrar, sempre com a elegância e altivez com que a conheci e logo passou a desfolhar o caderno, detendo-se em cada mensagem escrita por ela em quase todas as páginas. Elogios que me incentivaram para o resto da minha vida. A nossa admiração era mútua, tive certeza disso, mais do que nunca, naqueles momentos. Minha velha mestra do segundo ano primário, não continha as lágrimas enquanto recordava situações e fatos que eu imaginava que somente eu tinha gravado, porque ela era a minha segunda professora, mas eu, era apenas uma de centenas ou milhares de alunos que ela tivera durante toda sua vida de magistério.

Foi uma tarde encantadora! Lembranças, recordações de tantos anos passados, mas tão vivas nas nossas mentes! Eu me impressionava e a admirava mais a cada minuto, pois ela se lembrava de conversas que tivemos, só nós duas, naquele já longínquo ano de mil novecentos e sessenta.

Após o café, tão carinhosamente servido pela filha Derly, que tanto eu conhecia por nome, de tão mencionada que era durante as nossas aulas, contei-lhe como consegui seu endereço e o motivo que me levara até ela.

Sim, ela, a Dona Yolanda, a professora mais enérgica, reconhecidamente a mais brava do colégio, a mais autoritária, a mais exigente, a que menos sorria durante a aula, a que fazia qualquer aluna tremer quando seu nome era pronunciado e quando ela entrava na classe, tinha sido, também, a mestra que me ensinou tantos valores, como o comportamento, a disciplina, a organização, a ordem, a responsabilidade, a clareza, a limpeza em todo e qualquer trabalho, a perseverança, dentre tantos outros, estava ante uma ex-aluna, outrora menina, para receber o seu convite de casamento.

Após tantas alegrias naquela tarde de sábado, onde toda a família da querida mestra se mostrava orgulhosa daquela que conquistara não só a todos os parentes e amigos, mas, também, alunas como eu, que jamais a esquecera e a tinha como exemplo a ser seguido por toda vida, fui para casa com a certeza de que não errara ao decidir procurá-la e fazer-lhe o convite para que ela partilhasse comigo o momento da realização de um grande sonho. Minha alma sorria! Eu estava muito feliz!

E, mais uma vez confirmando o orgulho que sempre tive de ter sido sua aluna e, mais do que isso, de tê-la tido como alguém tão superior, tão nobre, tão mulher, tão profissional, tão amiga, tão incentivadora na etapa da vida em que o professor é o anjo que Deus nos oferece para o nosso engrandecimento e a nossa evolução, ao lado do seu marido, sua filha e seu genro, a tão querida Dona Yolanda arrancou lágrimas de muita emoção desta aluna (não mais ex, porque, mais uma vez, aprendia com ela e, desta vez, sobre sentimentos) que, vestida de noiva, sentia, dentro da igreja, que mais um dos seus sonhos se realizava naquele dia.

Ao me cumprimentar após a cerimônia, deu-me um presente de casamento. Algo de valor inestimável, que já teria se quebrado há muitos anos, não tivesse eu guardado com tanto amor para que durasse pela eternidade. Não era o presente que eu queria, mas, sim, a presença dela. E, embora o mimo esteja guardado como se fosse uma jóia preciosa, o maior presente está dentro do meu coração, tão enraizado quanto todos os ensinamentos que recebi dela no segundo ano primário.

Mais de trinta anos se passaram desde aquela data e essas cenas não saem da minha mente.

Sem menosprezar qualquer um dos tantos maravilhosos Mestres que tive ao longo destes quase cinqüenta anos, desde que, pela primeira vez, sentei nos bancos escolares, em cada Dia do Professor eu homenageio, mentalmente, a mulher e Professora Yolanda Ferreira de Rezende, a normalista que dedicou toda sua vida educando e ensinando crianças dentro de uma sala de aula, e, fora dela, dando exemplos de dignidade, força, sabedoria e amizade, a pessoas de qualquer idade.

E, através dela, presto minha homenagem a todos os educadores que, como ela, sabem exatamente o que é a arte de ensinar!

Meu preito de gratidão a todos os professores, hoje e sempre!

15/10/2006





Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui