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Erotico-->Aloísia -- 07/09/2009 - 17:24 (Alzira Chagas Carpigiani) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Aloísia pertencia ao “reino do não pode”. Mão no ombro não carece, não. Cochicho ao pé do ouvido – “Crêm Deus Pai, Santíssima Virgem Maria!”. Bolinar nos joelhinhos – e a tremura se espalhava pelo corpo, provocando um suadouro – “Ai do desgraçado que tentar!”
Bonita, Aloísia com seus traços virginais passava ereta, sempre retesada, prisioneira de sua pureza e do vestidinho singelo e estampado. Nem de leve, sorriso nos lábios sem tinta.
- Catita! Compra maçã da minha barraca! – O riso cheio de falhas da boca do feirante afugentou Aloísia para longe, bem para lá da barraca das bijuterias e das bugigangas, que eram as últimas coisas que se podia encontrar nos confins daquela feira de meio de semana.
O sonho secreto de Aloísia era noivar. Carregar no dedo da mão direita, um anel roliço de ouro puro, símbolo de compromisso assumido e esfregá-lo nas fuças das sirigaitas todas da cidade, só para elas pararem de zombar do jeito dela. Gostava mesmo era de casar de branco que nem a avó Duília, com direito a flor de laranjeira e chuva de arroz na saída da igreja, pra ter sorte na vida a dois.
E a lua-de-mel? Inevitável não pensar e Aloísia afogueada a mais não poder, espalhava com as mãos os pensamentos quentinhos, que teimavam em querer macular sua quietude de moça honrada.
“Prefiro morrer, Deusinho. Prefiro sangrar meus joelhos nos bancos duros da igreja a deixar que essa tentação dos quintos penetre em meu coração.”
Quem pode avaliar, em espécie, o quanto vale a honra de uma moça de carne pura? Sempre existe quem esteja disposto a pagar, isso é verdade, um punhado de ouro, uma maleta de dólares americanos ou ainda a dar simplesmente um golpe. Pois certo que não é difícil conhecer história de cabra que desonra a virgem, promete muito, não cumpre nada, desaparece e nunca mais retorna nem para conhecer a cria que carrega no semblante suas mesmas marcas da existência. Aloísia temia tal tragédia, temia não sobreviver a ela.
Finório limpou os beiços na manga da camisa e pediu para que Aloísia lhe demonstrasse um quinhão de seu amor.
A tinta vermelha foi tingindo cada célula do rosto da donzela, que rompeu em choro magoado.
- Pensa que sou dessas?
- Não, não é isso, Aloísia, é que morro de paixão por você. Fico louco, um arrepio medonho rasga desde o dedão do pé e vem subindo e pára lá, você sabe onde ... Não posso continuar assim, eu preciso saber se você me ama. Eu quero uma prova do seu amor.
Não com ela. Indignada, empertigada, Aloísia calcou os pezinhos nervosos no chão e foi cheia de glória ser infeliz no escuro de seu quarto.
Quanta dor! O salário de se manter a virgindade intacta estava sendo alto demais para ela. Mas mesmo assim, resistiria. Seria a última donzela do mundo, nem que para isso precisasse contar com todas as legiões celestes, amém.
No meio da noite, os beiços grossos do mulato Finório derrubaram-na da cama. Sonhara? Evidente que sim, pois Finório – em pessoa – jamais poderia colocar os pés desajeitados na brancura imaculada daquele quarto, sem o consentimento de sua ocupante.
A virgem abriu um sorriso e abraçou os joelhos. “Imaculada como Maria, que privilégio, hein? E isso, aos vinte anos de idade!” – Sem dúvida, ela seria um belo prêmio ao homem que a merecesse. Finório? Talvez, se ele conservasse aquelas mãos a pelo menos meio metro de distância.
Finório trabalhava com caminhão, carregamento de cargas. No sol do meio-dia, lá estava ele erguendo do chão pesados engradados para depositá-los nos caminhões, que partiam carregados da cidade.
Nesse sol de meio-dia reluziam os ombros largos do rapaz. Ele era espadaúdo como dissera a menina da loja de roupas com olhinhos brilhantes de prazer mundano.
“Capivara!” – Alterada, aloísia ajustou o pensamento de vingança, deitou-se com força e virou-se para o lado da parede.
“Espadaúdo...” E um calor insuportável fez com que Aloísia atirasse para longe o cobertor. Os lábios de Finório ... que coisa! Não adiantava cobrir os olhos com o travesseiro, aqueles lábios continuavam lá, lustrosos, sugerindo uma maciez de veludo, uma umidade quente de túnel profundo.
“Que droga de dia que não nasce!” – E Aloísia, tomada por súbita irritação, abandonou a cama para buscar um copo d’água na cozinha.
Dali a algumas horas, ela estaria de novo encoberta pelo vestidinho de estampas miúdas, andando pelas ruas do bairro, retesada pelas leis morais da boa conduta, escondendo de todos – e até de si mesma – que sob as cinzas de uma vida medíocre, ocultava-se um frágil objeto da luxúria.
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