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Artigos-->Quando eu acreditava -- 07/07/2003 - 15:37 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


A Mudança de Inquilino

(por Domingos Oliveira Medeiros)







Ele conseguiu o que tanto almejava. Morar na casa mais importante e famosa do país. Cumprira todas as exigências previstas em lei. Assumira compromissos com deveres e direitos. Fez várias promessas. Mostrou-se agradecido. Conseguiu milhares de fiadores que nele depositaram extrema confiança. E dessa maneira assinou um contrato de locação por quatro anos.



Foram quatro anos que se passaram sem que a vizinhança pudesse ter contato mais íntimo com o inquilino. Ele era discreto, apesar de bem falante. Diziam que era professor. Quase não andava em torno de sua residência. E viajava muito. Vivia a maior parte do tempo no exterior. De lá, pela televisão, é que podíamos vê-lo com freqüência, fazendo o que mais gostava: discursar.



Enquanto aqui, seus amigos aprontavam. Escândalos, fuxicos e mexericos, sempre tomavam assento diário nas cadeiras da imprensa. Mas ele não dava a menor bola para isso. Confiava demais nos amigos. Botava a mão no fogo, como dizem, por eles. Não sei se alguma vez teria queimado sua mão. Provavelmente, sim.



Mas ele acabou se apegando à residência. E começou uma luta ferrenha para renovar o contrato. Outras pessoas queriam alugar a casa. Mas ele não cedeu. Tanto fez que acabou aprovando uma lei que o favorecia. A lei que permitia ao locatário ficar no imóvel por mais quatro anos. E novamente, ele conseguiu um número de fiadores suficientes para que o aluguel fosse renovado. E foi o que aconteceu. O contrato foi renovado. E renovada foram as promessas de ajudar a vizinhança. Não houve necessidade nem de mudar os móveis de lugar. E lá ficou o locatário por mais quatro anos. Que continuou com a sua rotina. Viajar para o exterior. Mantendo-se discreto. Evitando envolvimento com fuxicos e mexericos. Lavando sempre às mãos, ao estilo de Barrabás.



Até que chegou o momento de entregar a casa. Não havia mais possibilidades legais de lá permanecer. E ele até tentou indicar um amigo para ficar com a casa. Mas esse amigo não conseguiu fiador. E a casa foi alugada para outra pessoa. Com estilo mais popular. Mais falante. Bem mais simpático. Que conseguiu um número maior de fiadores. E assim começou a fase de transição. De mudança.



Primeiro, o locatário anterior mostrou-se disposto a ajudar o novo inquilino. Organizou até um local para mostrar todas as dependências da casa. Deixou o novo locatário à vontade. E assim as coisas foram caminhando às mil maravilhas. Num clima de cordialidade. Até que, recentemente, depois de alguns dias de visitação aos cômodos da casa, o novo inquilino e sua família de assessores começaram a descobrir alguns defeitos no imóvel que, até então , não tinham percebido.



A casa estava cheia de infiltrações e rachaduras. Problemas de toda ordem. Nos quartos, não havia iluminação. Faltavam lâmpadas, que foram retiradas - depois souberam - para economizar energia. Energia que o antigo inquilino não soube poupar. Não soube investir.



Nos armários da cozinha, mais surpresas: não haviam estoques de alimentos. Disseram que era por causa do desabastecimento. Que os produtores agrícolas não teriam recebido dinheiro nem apoio para o plantio. E que a reforma agrária fora deixada de lado. Por conta disso, nem sinal do feijão e do arroz nosso de cada dia. E tinha até outra versão para história. A de que a falta de chuvas teria sido a principal responsável pelo desabastecimento. E pela falta de energia, também. Até hoje ninguém sabe da verdade.



Ao entrar no banheiro, outra desagradável surpresa: falta total de remédios. Até os mais corriqueiros. De uso continuado. Muita gente, com doenças crônicas, já havia morrido por falta desses remédios. Alguns conseguiam comprar do seu próprio bolso, diretamente junto às farmácias. E sobreviviam. Remédios, aliás, pela hora da morte. Cada vez mais caros.



Tudo por conta de uma tal de variação cambial. Sempre que a moeda americana aumentava, os aumentos eram repassados com o conhecimento do inquilino. Assim acontecia com os subprodutos da soja e outros produtos e serviços como a gasolina, o pãozinho de cada dia, transportes, conta de luz, de água, bujão de gás, impostos e assim por diante.



E a vizinhança já não agüentava mais. Porque seus salários eram os únicos que não sofriam reajustes. E o desemprego já era grande. E aumentava o número de mendigos em torno da casa. Sujos, maltrapilhos, desempregados e sem assistência médica e previdenciária.



Mas o pior ainda estava por ser descoberto. Uma verdadeira bomba para o novo inquilino. Primeiro, ficaram cientes de que não haviam escolas públicas de qualidade. Só algumas do setor privado. Desse modo, o ingresso nas universidades públicas ficava restrito aos filhos das classes melhor favorecidas.



Depois, o desagrado com a documentação referente a parte financeira. Outro susto. Não havia um tostão em caixa. Nem para aumentar o salário mínimo. Procurou-se em todas as dependências da casa e não foram encontrados os recursos advindos da venda de todas as empresas estatais, que foram privatizadas. Não se viu o dinheiro da venda das companhias distribuidoras de energia, de comunicações, bancos oficiais, siderúrgicas e tantas outras. E esses serviços, ao invés da promessa de melhoria de qualidade, pioraram bastante. Apesar dos aumentos das tarifas.



Resolveram, então, abri o cofre maior. O cofre onde o grosso do dinheiro deveria estar guardado. Mais a surpresa: o cofre estava vazio. Apenas, no seu interior, a cópia de um contrato com o FMI, dando conta de uma dívida que chegava próximo de R$900 bilhões de reais. Que, no primeiro aluguel, era de cerca de R$ 100 bilhões, apenas.



Diante de tanta sujeira, o novo inquilino chegou a perder um pouco o fôlego. Por instantes, o seu largo sorriso abandonara seu rosto. Mas não o suficiente para desistir da nova moradia.



Sendo ele um homem acostumado ao trabalho pesado, resolveu arregaçar as mangas e arrumar a casa. Claro que, por tudo isto, a arrumação irá demorar mais um pouco. Não será como se gostaria. Mas fazer o quê? Se até a cozinha está com uma pilha de pratos por lavar? Se nos banheiros da casa respira-se o mau cheiro exalado por todos cantos ? Se as paredes que separam as prioridades sociais estão sujas e precisando de pintura.?



Só mesmo um mutirão, reunindo toda a vizinhança, poderá ajudar ao novo inquilino no seu firme propósito de retomar o curso normal daquela casa, de modo a que ela volte a ser um local de boas notícias, irradiando idéias e planos que recoloquem a vizinhança de todo o país nos trilhos do desenvolvimento econômico e social.



Seja bem vindo Lula. E pode contar com a gente.



Domingos Oliveira Medeiros

27 de novembro de 2002

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