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Artigos-->Análise crítica à obra "Respiração das Vértebras" -- 28/06/2003 - 08:59 (joão manuel vilela rasteiro) |
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Com epígrafes de Fiama Hasse Pais Brandão e Her-
berto Helder abre o volume. Poesia tensa e concen-
trada, oscilando entre um silêncio e um rumor, co-
mo as vértebras no acto da respiração. Respirar
como gerar palavras apagadas, que se evolam antes
da forma, e todavia o corpo permanece (...) atento
ao mínimo rumor ou gesto". Respirar para viver,
manter as vértebras vivas, o sonho alerta. João
Rasteiro não esquece nunca que "a sobrevivência
dura num gosto de ameixas maduras" e que,por isso,
se deve defender de todos os passos(que) conduzem
à inclinação do tempo.
Pelo que fica dito se poderá concluir não ser
esta uma arte de passividades e conivências: ela
rompe com esquemas e códigos e avança destemida,
e quase silênciosa, com a pressa de quem sabe que
"o corpo vai adormecendo como espigas exaustas".
João Rasteiro busca a cada passo o ritmo certo
da respiração e das vértebras que a contêm e po-
tenciam.Os sonhos cruzam-se com a decepção e o ce-
ticismo e são o impulso das vértebras a caminho da
sobrevivência, quem sabe se da imortalidade. Mas o
poeta não ignora que "nenhum sombra nos prolonga/
no sulco sagrado das aves e nada impede o silêncio
aparente da folha que vai cair/ no insípido travo
da melancolia.
Pois é de melancolia, também que aqui se trata.
De um respirar melancólico ante "o ar corrompido
no corpo da terra/entregue ao acaso das artérias
interiores, ante um mundo que as vértebras/corpo/
coração não aceitam nem podem alterar". Um impasse
onde germinam vazios os lábios Mordendo vagarosa-
mente as últimas chuvas, onde (...) o homem fiel
ao rito de só beber o silêncio/ sustém estrangu-
lado a respiração dos dias (...). E se por um lado
há sempre(...)aguardando pacientemente em vigília/
o pássaro louco que procura a infância, não deixa
de ser presente, a cada passo, a garantia segura
do nosso fim inelutável: Nos pomares cresce a mor-
talha de linho quebrado, diz o poeta - e assim fe-
cha este livro a muitos títulos assinalável. Não é
fácil a tarefa de unir extremos e conciliar opostos
com tanta subtileza; não é comum revelar tão sábia
anatomia do sonho retirado do caos, através do tão
puro silêncio que é a "Respiração das Vértebras".
Vale a pena ler poesia, ocorre ao fechar o livro
de João Rasteiro, que no final da heterodoxa rese-
nha biográfica da badana refere que Ao mesmo tempo
em que tudo isto acontece, o Anjo sibrevoa a cidade
sem pressa alguma. Confirma-se o Anjo e a sua falta
de pressa. Mudo. Olhando-se no espelho em cuja so-
lidão se vê o homem.
in; Nuno Figueiredo:Revista "entre letras - livros e escritores", nº5,Maio 2003
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