Água de coco
Quando conheci o João Macaco, no distante ano de 1966, eu já estava morando na Rua das Palmeiras, nos fundos da casa da dona Pierina, uma italiana bravíssima que só alugava quartos para rapazes solteiros que estudassem ou trabalhassem. Na primeira vez que vi o Macaco, julguei que ele estivesse precisando de uma mãozinha. Ele acabara de descer de um ônibus da Pássaro Marrom e estava indo em direção à minha pensão arrastando um enorme armário de madeira escura, pesadíssimo. Ao me revelar que estava de mudança para a mesmo endereço que o meu, e que era o novo propagandista do Laboratório Frumtost, ajudei-o a carregar o armário e logo nos tornamos bons amigos.
Depois desse fato, e por muitos anos seguidos, carregamos em dupla a pasta de amostras-grátis, visitamos e revisitamos farmácias, atendemos a milhares de médicos e hospitais ao longo do Vale do Paraíba e Litoral Norte. Nas nossas idas e vindas eu o tinha quase sempre de carona ao meu lado. O João se tornara uma espécie de meu carona oficial, um co-piloto de todas as viagens. Na Dutra e noutras estradas sem asfalto, barganhamos histórias de nossas vidas. Contou-me ele que, quando era estudante, lá na sua terra, o Maranhão, teve uma professora muito bonita chamada Ritinha.
Pelas suas referências, deveria ser bonita de verdade aquela danada! O João Macaco cobiçava a Ritinha como mulher. Na verdade, era um amor platônico o que ele sentia por ela. Certa manhã, contou-me, chegou atrasado para a aula e entrou calado. Sorrateiramente, disfarçando e sem cumprimentar a ninguém, foi sentar-se lá no fundo da sala. A professora Ritinha, aquela que era bonita e desejada pelo João, ao percebê-lo chegando cabisbaixo, provocou-o: ”O que é isso, João?... Você chega e nem cumprimenta a sua professora... Por acaso dormiu comigo esta noite?”
O Macaco era tímido de carteirinha, mas não podia perder aquela oportunidade, chance que talvez jamais se apresentasse para ele. Conservou a cabeça baixa e resmungou num tom de voz que todos os alunos da classe pudessem ouvir. Foi um lamento cavo e triste: ”Pobre de mim, fessôra... Quem sou eu pra beber água desse coco?!...”
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