Constatação
maria da graça almeida
Amei demais, muito mais do que o amor merecia.
Entreguei-me sem temor. Desmedida,
perdi a noção do tempo, da vida e de mim.
Doei-me com a força do moinho em movimento;
com a validade da crença pela crença;
com a urgência do remédio na doença.
Ao desvendar meu enredo, fiz-me livro aberto.
Sem sigilo, sem mistério, mostrei-me sem segredo,
sem desvios, sem medo.
Não impus condições, não ditei regras,
não editei normas. Aceitei os desmandos,
suave, e da melhor forma.
No espelho desbotei a minha imagem
ao ressaltar a incerteza dos sonhos;
a insensatez da entrega; a efemeridade do prazer.
Meus cabelos empalideceram à medida
que os anos e a lida alardeavam
a mágoa e o desencanto pela vida.
Pouco eu soube de afagos. Desconheci facilidades.
Os dias passaram-se em branco. Não me diplomei
em felicidade, não me doutorei em realizações.
Hoje, meu pranto escorre e em silêncio morre
sobre a fragilidade e a alvura dos papéis
onde conservo melancólicos sentimentos.
Um dia, ainda mudarei de rumo, reverterei meus temas
para amenizar a insistente nostalgia que inda exibo
nos versos arcaicos de um novo poema.
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