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cronicas-->1967 - Dentes e Doutores -- 13/07/2009 - 20:56 (Jairo de A. Costa Jr.) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
E os dentes, tudo bem? Estão, menos esses dois aqui, ó. Não ligue não, use Sensodyne. Assim o Doutor Francisco seguiu e foi em frente. Deu certo a pasta, melhorou e agora só tenho mais uma sessão daqui duas semanas. Saí bem cedo de casa, voei pela Bandeirantes, frio e cerração. Sete e quinze, sentado na minha mesa, pensando alhures, chega o nosso engenheiro - oi, bom dia, pá daqui, pá dali, tenho reunião com o Alexandre, ta vindo aí. Mais um pouco ele veio - Jairão, conte tudo, não esconda nada, um abraço e um beijo, algo na mão escondido, era uma coroa, bem da frente, que descolou. Meu, olha a minha situação, fui comer um pãozinho, quase engoli, dei uma risadinha amarela e ouvi - e agora, me ajuda aí, tenho reunião. Deixei chegar onze horas e pedi socorro ao Doutor, explica aqui, apela ali, a secretária foi falar com ele, venha quinze pra uma. O Doutor Francisco vai atender. Puxa vida, que bom, tchau. Não precisava, mas fomos os três, Alexandre, Wellington e Eu, depois do conserto, iríamos almoçar. Um minuto, chegou o de branco e disse, vamos lá. Faceiro, o Alexandre entrou e sentou, barulhinho de broca, zinnn, zunnn, acertinhos e puf, tudo colado. Só sorriso, pague cinquenta, até a próxima. Fomos comer no Hermann´s.
Só que fiquei com aqueles zinnn e zunnn, pensando nos meus dentes e voltei até antanho. Meus treze anos, uma dorzinha, a mãe mandou - vá lá no Doutor Mi. Fui, fiquei olhando aquela coisa de correias e uns objetos estranhos. Nem precisava, era só um buraquinho, ele arrancou o meu dente, arrancou ou ou. Ainda levei uma injeção daquelas. Hoje, vejo ele nas escolas de sambas lá de São Miguel, toca surdo. Foi vereador, é sambista, dentista, não sei, meu dente arrancou ou ou. Fui criado na água de poço, muito doce, pouca escova, só de manhã, imaginem o estado dos dentes, meu pavor era perdê-los, ainda mais numa cidade, que era de desdentados, de pontes e anatómicas, como minha mãe chama as dentaduras. Mais tarde, já em Itapetininga, amanheci com uma dor de dente embaixo, pelo meio. Sabe, coloquei até um grão de arroz pra tapar o buraco, não adiantou nada. Aliás, eu já tinha mais buracos que o necessário, flúor não existia. Fui numa Doutora, na Campos Sales, formada em mil novecentos e vinte e nove, isso em setenta e um. Ela aplicou um remedinho ardido, a dor passou, voltei outros dias para o meu primeiro tratamento de canal e amálgama.
Tratei só aquele, por tempo e custo. Eu era bonitão e cabeludo, o que escondia os dentes já escurecendo, fui prá São Paulo fazer o Anglo. Fiz, entrei na Fatec, fui trabalhar na Eucatex, conheci a Edna, aí eu já escovava melhor e mais. Um ano depois, não dormi, que dor, era no siso. Levantei, me ajeitei, peguei o ónibus, quase chorando, no meio do caminho, nas Perdizes, vi uma placa de Doutor, desci e entrei. Fui atendido, ele furou o dente a frio mesmo, que alívio na dor e que susto na panela, colocou um algodãozinho com mais um ardido, que queimava a minha língua. Cutucou bastante e deu o orçamento, ai que dor, era um valor que não sei dizer, tão alto era. Faço em vezes, volte depois de amanhã, leve este papel. Cheguei ao trabalho aliviado, encontrei a Edna e chorei as mágoas do papel. Ela me acalmou, não ligue não, vamos lá perto de casa, tem o Doutor Flávio.
Naquela tarde mesmo, tomamos o ónibus, lotado de tudo, uma beleza, sem dor de dente, o doutor encaminhado e aquele monumento na minha frente, bem abraçadinha. Cheguei, esperei um tanto, ela foi à escola. Primeira coisa que ouvi - que moço bonito, a Edna merece. Sente aí, sentei, ele sorriu e sentenciou - ta meio ruim, mas vamos consertar, primeiro esse aí do algodão, mexeu e deixou para um outro dia e com mais remedinho. Fuçou a minha boca toda e me deu um papel cheio de dentes marcadinhos a caneta. Venha na semana que vem que nóis conversa. E nóis conversou, pois tratei com ele quase vinte e três anos, de setenta e três a noventa e seis. Fiz de tudo, até flúor apliquei, só não salvou aquele da panela, não durou um mês, tive que arrancar. Amanheci na porta dele, furei a fila, sentei na cadeira e só sai arrancado, nunca tive uma dor igual aquela, um dia eu conto. Ta certo que conservei os dentes, mas ele não teve dó, cobrava mesmo, ainda mais quando mudou para a Paulista, depois cismou de me colocar ouro, tive uma Serra Pelada na boca. Fomos até sócio numa construção lá em Uberaba e depois, ele até quis aumentar a sociedade. Não deu certo não. Parei por aí.
Entre o Doutor aí acima e aqui, andei pela Doutora Denise, que me receitou uma placa antibruxismo para dormir, quem disse que não existem bruxas. Vim para Piracicaba, começou a doer um dente de novo, perguntei de um doutor, me indicaram uma. Fui, era muito dodói, ta dodói aqui, desculpa, é só uma picadinha, desisti e estava quieto, veio a Iriana me vender o banco, perguntei de novo - ela disse, tem a Líbia, anote o telefone, anotei e liguei. Fui à tarde, alem de dentes ela lidava com anjos e tinha um consultório meio assim, sabe. Detectou um morrinho na minha gengiva e me mandou para o Orocentro, da Unicamp, um setor de problemas, fui numa sexta, uns três dentistas olharam e olharam, vá comer ali no shopping e volte duas horas. Fiquei meio-meio, mas voltei, os mesmos três montaram em mim, filmaram e fotografaram, depois mandaram para exames. Fui embora atordoado, soube depois, era nada, só um granuloma benigno, já extraído. Tratei por uns sete anos, conheci, por força dos canais, o Doutor Marçal, fazia um canal de duas ou três sessões em apenas uma. Haja tensão. A Líbia mandava ir nele, confiava nele. Cansei da Líbia, ela também cansou dos dentes. Cheguei ao Moura, um doutor companheiro, fiquei por um ano, alguns dentes e umas coroas, também com dores e tratamento de canal, aí era uma Doutora bem calma e atenciosa, mas também de uma sessão só. Perguntei outra vez, me indicaram o Doutor Francisco, a mesma Iriana. Estou indo nele, para levar meus dentes aos meus setenta ou oitentas ou.... Já os trouxe até aqui, apesar das agruras. Ele é muito bom e gentil, veja o começo, a quebrada de galho. Mas não tem dó não, ainda dói, só que dói com horário rígido. Ele não se atrasa. Mais uma sessão, só volto o ano que vem e tudo começa. Meu, cada agulhada de anestesia. Ai aiai ai.
Escrevi esta crónica em treze de julho de nove e, hoje, ainda estou no Doutor Francisco, por causa do tratamento normal e por uma novidade, nessa altura do campeonato. Preciso usar aparelho, para corrigir um problema de encaixe da minha mandíbula. Ainda bem que é aparelho móvel, mas, eu até babo, quando coloco o tal. Bem que agora só uso durante a noite e quando viajo. Pode uma coisa dessa. Eita viu. Olhando a chuva e sorrindo para a vida, beijão à esses doutores, que ainda posso morder uma bisteca. Doze de três de onze.
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