Não repita meus erros. Rompa com os golpistas de Honduras.
Elio Gaspari
Se eles não devolverem a presidência a Manuel Zelaya, chame de volta nossos 550 militares que servem na base de Soto Cano, suspenda todos os programas de ajuda. Mostre a esse palhaço do Hugo Chávez que os Estados Unidos são os verdadeiros defensores da democracia na América Latina. Só depois de ter chegado aqui é que percebi que fui eu quem disparou o ciclo de golpes latinoamericanos dos anos 60 e 70.
Acho que foram uns vinte. Acabamos invadindo a República Dominicana e quase desembarcamos no Brasil.
Se você quiser saber o dia em que acendemos o pavio, confira: 30 de julho de 1962. Tinham acabado de instalar o sistema de gravação de minhas conversas no Salão Oval e tive uma reunião de meia hora com o Lincoln Gordon, que era embaixador no Rio.
Nela, combinamos que a carta do golpe militar entraria no baralho das nossas alternativas para o Brasil.
Eu acabara de amarelar numa crise com os militares peruanos. Duas semanas antes, eles haviam deposto o presidente Manuel Prado, um aristocrata admirável, e cancelado as eleições que escolheram seu sucessor. Minha reação foi imediata. Rompi relações com os generais, chamei o embaixador a Washington. Fiquei isolado. A Europa se fez de boba e a OEA rachou. Mandei sinais de paz aos generais e eles marcaram uma eleição para junho de 1963.
Acertei? Coisa nenhuma, cinco anos depois o novo presidente foi derrubado por um general esquerdista.
Tiraram-no do palácio vestindo pijama e mandaram-no para o exílio. Um dos argumentos a favor do reconhecimento da junta peruana foi o de que desencorajaríamos os militares brasileiros.
Eu achava que o golpe no Brasil poderia vir em três meses.
Numa época em que víamos no Fidel Castro El Gran Satan, incentivamos e toleramos esses generais. Os latinoamericanos que acreditaram no compromisso dos Estados Unidos com a democracia foram iludidos.
Faça o que eu não fiz. Mostre que só há um caminho para os golpistas de Honduras: reinstalar Zelaya no palácio.
Se você não fizer isso, prepare-se para lidar com o próximo golpe e o próximo general, cada um pior que o outro.
No dia 3 de outubro de 1963, exatamente em Honduras, um coronel (Oswaldo López Arellano, consumado ladravaz) derrubou o presidente Villeda Morales e eu resolvi tentar de novo.
Suspendi as relações diplomáticas e cortei a ajuda. O coronel nem se abalou.
Previu que em seis meses nós mudaríamos de ideia. Estava certo. Até hoje meu sucessor leva a má fama de ter reconhecido o governo do coronel.
É uma injustiça, pois eu tinha planejado fazer isso logo que retornasse da minha viagem a Dallas.
Toda vez que vejo um garoto com uma camiseta do Che Guevara, me dou conta de que o sonho democrático da América Latina foi jogado fora durante o meu governo. Veja o paradoxo: como eles acreditaram numa coisa que não era verdadeira, colocaram fé em algo verdadeiramente falso, o romantismo do Che. Por aqui, só quem o acompanha é o Mao Tse Tung, que, como ele, tem horror a banho. O Ho Chi Minh vira a cara quando o vê e o Stalin diz que ele devia ter feito cinema.
Despeço-me com uma indiscrição: minha mulher calça 40 e adora a Michelle porque ela também tem pés grandes (41).