TEMPOS MODERNOS
(Por Domingos Oliveira Medeiros)

Tempos modernos. Tempos de avanços tecnológicos. Dos paradoxos entre os prós e os contras das tecnologias. À cada invenção, novos instrumentos que servem tanto ao bem como ao mal. O avião, que encantou Paris e o mundo, não demorou para servir a dois senhores: da paz e da guerra. Avanço que tanto se presta para o transporte de cargas e de passageiros, encurtando distâncias, aproximando as pessoas e realizando sonhos, como também, paradoxalmente, tem servido para transportar a dor e a morte, quando utilizada como instrumento de guerra, bombardeando, indiscriminadamente, crianças, jovens e idosos, sob a ótica da intolerância e do desapego à vida.

A energia atômica, a energia limpa, é outro exemplo de paradoxo. Energia utilizada pelos senhores da guerra, que explodiu em forma de cogumelo, destruindo o meio ambiente, mutilando e matando pessoas. E para que os exemplos não se tornem fastidiosos, fiquemos no avanço tecnológico mais recente: a rede mundial de comunicações, a INTERNET. A outra face da realidade. A realidade virtual, aparentemente verdadeira, que também, a exemplo da aviação, encurta caminhos, diverte, instrui, aproxima pessoas e idéias.Todavia, ao mesmo tempo, agride e separa pessoas, causando-lhes prejuízos de toda ordem, sofrimento e também a morte. Tecnologia que facilita a prática de numerosos crimes, sob o manto do anonimato, patrocinado pela era da mentira eletrônica.

A telefonia móvel, que ultimamente tomou assento permanente nas páginas dos jornais, em razão de sua utilização junto ao crime organizado. Tecnologia da comunicação que, infelizmente, tem dado sinal constante de ocupado, em relação aos nossos governantes, toda vez que são convocados para que apresentem soluções que se fazem urgentes e necessárias em favor e no dever de prestar segurança a todos os cidadãos brasileiros.

Somos forçados, por todos as razões expostas, a concluir que, apesar dos avanços das gigantes ondas de comunicação, que atingem todos os cantos, recantos e rincões do planeta, estamos cada vez mais próximos uns dos outros e, paradoxalmente, cada vez mais distantes, solitários e indiferentes uns para com os outros. Submersos pelas ondas dos paradoxos eletrônicos.

Empresas de todos os ramos, organizações públicas e privadas, apressaram-se em substituir pessoas por máquinas. A era da globalização, do apego ao dinheiro, ao lucro rápido e fácil. A concentração de renda. A manipulação de informações. A ganância do sistema financeiro. A Economia sobrepondo-se à Administração. Os meios justificando os fins. O homem deixou de ser prioridade. O “ tudo pelo dinheiro” passou a ser a moda. O poder, a qualquer preço. A vaidade e o individualismo passaram a ser as molas propulsoras dos novos e equivocados sistemas de crenças e valores. A bem da verdade, a fuga do nada para o nada. Sem razão de ser, sem lógica, desesperada. Vazios rumo à última parada:a estação da angústia e do arrependimento intempestivos e, quiçá, tardios.

Mas é preciso viver, como diz a canção. Preferencialmente, com boa dosagem de humor. Humor bem ao estilo do brasileiro. Nós que temos a capacidade (ou a mania) de rir de nossa própria desgraça. Para não sucumbirmos diante da desastrosa realidade. Mantendo, por assim dizer, nossa capacidade de indignação e de resistência.

Por tudo isso, e em razão dos últimos escândalos da República, resolvi trazer â tona, de forma analógica, algumas considerações sobre os prós e os contras dos avanços tecnológicos, a partir da experiência vivenciada junto ao Congresso Nacional. Instituição que perdeu o diálogo com o povo, por razões diversas e, especialmente, a partir do momento em que passou a utilizar secretárias eletrônicas. Foi assim que o discurso do “olho no olho”ficou cego; perdeu em vigor, calor humano e em transparência na frieza de seu equipamento moderno e na escuridão do voto secreto. Não se incomodam, nossos representantes, com o clamor da população que os elegeram e que, por ironia do destino, pagam seus salários, regalias e demais despesas; inclusive as “não contabilizadas”. E as despesas dos sanguessugas, realizadas em cavernas obscuras, sob o manto da impunidade, patrocinadas por ratos e morcegos travestidos de servidores públicos, ex-membros do Parlamento, corruptos, corruptores e ladrões afins.

Recentemente, liguei para a Câmara dos Deputados, para solicitar algumas informações. A secretária que me atendeu, apesar da voz suave, passou-me a impressão de que não tinha alma. Mostrou-se tão fria e reticente como os caixas-eletrônicos de bancos. Semelhante às secretárias da famosa turminha dos 0800 da vida. O diálogo (?) se deu mais ou menos nesses termos:

– Você ligou para o número 0800 da Câmara dos Deputados, a Casa do Povo, a sua casa. Se você não possui título de eleitor, desligue e ligue mais tarde, pois esta parte do sistema estará fora do ar por algumas horas. Se você é eleitor.TECLE 1. Se deseja encomendar alguma pizza, TECLE 2. Para falar com algum pizzaiolo, TECLE 3. Para tratar sobre mensalão, TECLE 4. Para CPI dos Correios, TECLE 5. Para CPI dos Bingos, TECLE 6. Para CPI do Banestado, TECLE 7 e volte ao menu inicial ou desligue, pois o assunto encontra-se devidamente arquivado por tempo indeterminado. Para CPI do Contrabando de Armas, TECLE 8 e aguarde autorização para falar com algum servidor terceirizado. TECLE 9 para obter cópias de reuniões públicas ou privadas. Para saber de novas CPIs. TECLE 10. Para sugerir abertura de novas Comissões, TRECLE 11. Informações sobre deputados que aderiram ao voto secreto, desligue, pois o sistema está congestionado, sem previsão para retorno. Todos os nossos atendentes, no momento, estão ocupados, preparando novos pratos e novas sobremesas. Para fraudes em processos licitatórios, superfaturamentos na compra de ambulâncias, TECLE 12 e aguarde que algum médico hematologista da equipe de sanguessugas de plantão irá atendê-lo. Para participar do “bolão do acordão”, sobre os próximos deputados a serem absolvidos, TECLE 13 e reserve sua cota de participação. Para extratos bancários de caseiros, jardineiros ou de motoristas, TECLE 14 e aguarde na linha que a quebra do sigilo é automática. Para inscrição em cursos de danças e rebolados em plenário, TECLE 15 e fale diretamente com a professora de dança. Para obter hábeas corpus junto ao STF, TECLE 16 e aguarde na linha pois este procedimento também é rapidinho. Se convocado ou convidado por alguma CPI, TECLE 17 a fim de receber orientações dos professores De Lúbio. Dudu e Silvinho, sobre como mentir e se portar durante o interrogatório, sem correr o risco de ser preso ou de comprometer seus companheiros de partido. Por fim, TECLE 18, para voltar ao menu inicial ou desligue e aguarde, em silêncio, o resultado das eleições de outubro próximo, que poderá surpreender a quem só acredita que o pleito será decidido apenas entre dois partidos: o de antes e o de agora.