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Poesias-->As boas meninas -- 26/08/2001 - 15:53 (Francisco Libânio) |
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As boas meninas
São quatro meninas
Duas irmãs e duas primas
Criadas por um mesmo pai
Criadas por um mesmo tio
(Que ao mesmo tempo foi pai)
Os nomes são marias
Pureza
Conceição
A de Fátima
E Catarina
São quatro marias
Todas elas boas filhas
Todas elas prendadas
Todas boas de cozinha
Prontas para ser casadas
Educação, tiveram pouca,
Mas o suficiente
Sabiam ler bem
E escrever melhor ainda
Conceição é que mais tinha
Mão para a poesia
Pureza era pureza
De nome e de coração
Fátima, a brabinha
Dona de grande esperteza
Catarina era a mais linda
Tinha muitos pretendentes
Mas não queria nenhum
Eram todas boas meninas
Moças bonitas e altivas
Gentis, delicadas e finas
Que estavam sempre unidas
Pois eram grandes amigas
O pai, trabalhador simples,
Parou no primeiro ano
Do primeiro grau
Desenhava o próprio nome
Era pedreiro de mão cheia
E isso mal lhes matava a fome
A mãe, dona Sinhá,
Uma exímia lavadeira
Das damas de patamar
Lavava as roupas finas
Que nunca iria usar
Nas horas vagas era costureira
Mas o tempo estava sempre a faltar
E assim cresceram as meninas
Pureza, Conceição, Fátima e Catarina
Sendo simples marias
Com grandes e bonitos sonhos
Mas sem tempo para sonhar
Pois mais que passassem os dias
Mais estava a vida as castigar
Um dia, Dona Sinhá morreu
De forma desconhecida
O pai-tio, muito desolado
Bebia de forma incontida
E se enchia de mágoas
Que encontrava na bebida
E vinha tonto para casa
E descontava nas meninas
Ah, as lágrimas caíam como águas
De quatro cataratas cristalinas
Eram lágrimas de dor
De ter perdido a tia-mãe
Que tanto fez para cria-las
E de raiva escondida
De um monstro de loucas falas
Ah, doces meninas...
Cheias de vontades sonhadas
Mas sem chances de sonha-las
Um dia, o pai, ensandecido,
Perdeu o emprego de pedreiro
Por conta do tanto que tinha bebido
Chegou em casa tropeçando
Perdia todo o pouco dinheiro
Que à duras penas tinha conseguido
Quando viu as quatro meninas
Foi à elas gritando
- Vocês vão trabalhar! No que for!
E quando dizia isso
Seus olhos mudavam de cor
Mandou as meninas para um bar
Onde seriam aproveitadas
Cada uma custaria trintas pratas
E cinco destas elas iriam ganhar
E veio o primeiro pagante de cada
E o segundo, e o terceiro
E logos teriam a primeira dezena
Assim durante um mês inteiro
Sem direito a domingo ou dia santo
Pois o dono do bar queria ganhar tanto
Para tão pouco pagar
Conceição, a poetisa,
Via em cada homem daqueles
Uma rima para asqueroso
Cada vez que se deitava
Mais queria era vomitar
Com aquele prazer nojento
Que devia interpretar
Com cada homem horroroso
Pureza, a imaculada,
Antes pura inocência
Mais queria era chorar
Em cada vez que dava
Tinha sua boca beijada
E outras tantas que beijar
Era um pedido de clemência
Sem ninguém para escutar
Fátima, a indomável,
Foi a primeira agredida
Por se atrever a dizer não
À sua primeira pedida
Teve a cara estapeada
Teve a cara mordida
Teve o peito espancado
Maior humilhação sofrida
Por um homem execrável
Pior que o pai para a bebida
Catarina, a mais bela,
Perdeu a beleza pros homens
Que faziam pouco dela
Que lhe chamavam feia
Que lhe chamavam cadela
Seus cabelos sedosos
Viraram uma horrenda teia
Seu rosto angelical
Virou o de uma Medusa
Depois de sofrer tanto mal
Seu corpo, seus seios sinuosos
Opulentos se tornaram
De tanto que eles sofriam
De tanto que eles apanhavam
Ah, boas meninas...
Tão boas de coração
Tão doídas pela vida
Tantos sonhos a conquistar
Tantas coisas a sonhar
Tanta beleza se tem
Tantas feridas também
Tanta bondade no coração
Mas vítimas da omissão
Tantos os gritos de dor
Que tem neste poeta que escreve
Uma poesia e lhes dá que se deve
Boas doses de amor
Francisco Libânio
07/02/01
22:15 PM
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