Ontem no chat apareceu um sujeito que resolveu fazer uma brincadeira comigo sobre as músicas dos Beatles. Ele digitava três ou quatro palavras de uma música deles e eu digitava um pedaço da música, dizia o nome, o LP e detalhes eventuais da música. Mas o cara cismou de fazer isso justo comigo, que saí da infância para a adolescência ouvindo e tocando Beatles. Justo eu, que devo minha vida profissional a eles. E a minha cabeça também, os sonhos, as crenças na beleza, no amor, etc.
Isso me fez pensar sobre a minha geração. Fomos a turma de rebentos mais privilegiada deste século. Nascemos e crescemos numa época que foi como Pelé, e os próprios Beatles. Igual àquelas décadas nunca mais, pode esquecer.
Que outra geração vibrou com "I wanna hold your hand", ou dançou "If I Fell" nos bailinhos, ou viu Chico Buarque, com vinte e poucos anos, ganhar o festival da Record com "A Banda", o Vandré chutando o pau da barraca com "Pra não dizer que não falei das flores", o JK fazendo uma cidade no coração do Brasil, que era sonho do Dom Pedro I; e os lances do Garrincha e os gols do Pelé, a Mary Quant mostrando os joelhos, e um pouco mais, quando inventaram a mini-saia.
Que outra geração curtiu calça Lee importada (contrabandeada), que não se adequava ao nosso perfil latino e a gente tinha que mandar ajustar em costureiras especializadas em Lee e Levi s. E a gente lavava com tijolo para desbotar logo. E a grife, um pedacinho de couro escrito LEE, a gente arrancava de cara. Lá nós éramos de ficar fazendo propaganda na cintura? Hoje o pessoal faz questão de botar a etiqueta no meio dos chifres, ou da testa. Geração de bobões.
Enquanto a gente crescia vendo o Circo do Arrelia, com a Comedinha, o pessoal de hoje engoliu Xuxa a seco, e outros dejetos. A gente lia Monteiro Lobato, e a molecada agora se entope de Harry Potter, ou seja lá qual for o nome. Literatura de péssima qualidade. Fora os pais, que chegam ao cúmulo de assistir coisas como "No Limite" e outras idiotices. A gente curtia "Família Trappo", "O Céu é o Limite", com Aurélio Campos, via o "Show do Dia 7" todo dia 7 na Record. Fora o "Bossaudade", "O Fino da Bossa", "Jovem Guarda", etc. E bota etc nisso!
E Ruben Braga, Plínio Marcos, Drummond, Vinícius, e mais etc. Todos produzindo a pleno vapor. Até o FHC ficava filosofando lá pelos lados da Maria Antonia.
E a primeira transmissão de TV via satélite e colorida? Foi a gravação, ao vivo, dos Beatles cantando "All you need is love". E a gente aqui não viu, porque a coisa andava braba.
Foi uma geração tão adubada, que acabou gerando uma safra de talentos brasileiros como nunca mais vamos ver. Pelo menos enquanto Wall Street não afundar num terremoto e a ONU não pegar fogo. E uns certos povos, que vivem se digladiando, não se auto-exterminarem de uma vez por todas. Que vão pros quintos, sextos e sétimos do inferno!
Desculpem o desabafo, mas quem viveu vendo Brigitte Bardot tomar forma, não consegue entender o tipo de fezes que as gerações posteriores colocaram no cerebelo. Haja bimbo e bimba para agüentar! E depois dizem que o Urtigão é neurastênico.
Tempos atrás, vendo um especial da Bandeirantes, sobre os tais sertanejos, quando Tonico e Tinoco chegaram ao programa, os tais de Chitãozinho e Xororó comentaram com eles que, no tempo deles, a dupla coração do Brasil, falava-se muito de sertão, e que agora se fala de amor. Os dois caipiras responderam que também se falava de amor, só não se falava em "carcinha". Até hoje não entendo como os dois, Chitão e Xororó, não se suicidaram ao vivo, para deleite de todos nós. Radical, né?
Mas uma coisa essa modernidade trouxe, a digitalização, a enorme quantidade de informação que temos agora. A facilidade de encontrar pérolas na Internet. O que antes a gente levava dias pesquisando nas bibliotecas, agora a gente consegue em minutos. Eu fiz "download" da "Divina Comédia", em italiano, em questão de minutos. Isso é melhor que Coca-Cola!
Fora o Napster, onde estou conectado enquanto escrevo estas besteiras, que me traz as músicas que eu quero ouvir. Escrever ouvindo aquelas pérolas é até covardia. Tudo ao mesmo tempo. É a tal da multimídia.
Acho que assim que cair um asteróide, como o da era dos dinossauros, fazendo uma limpeza seletiva, este planeta voltará a viver grandes décadas!
Não que eu seja radical, mas não vejo a hora da sujeira ir para o lixo, ou pelo menos para baixo do tapete.
E, como diziam os Beatles: All you need is love. Ou como dizia o Tom: Se eu pudesse, por um dia, este amor, esta alegria, eu te juro, te daria, se eu pudesse, este amor todo dia...
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