Quantos anos tem o amor?
Esse estreito "opus incertum"
Talhado a sangue na rocha
Feito cruz de sonhador,
Cuja trajetória incerta
O próprio tempo esqueceu.
Um jogral apaixonado
Invocaria, decerto
A presença do infinito
E dos olhos da amada
Para em trova singular
Dizer a idade do amor.
Já o filósofo, do amor
Provaria a inexistência
Espiritual e empírica
Para, em seguida, elevando-o
Aos recantos silogísticos,
Consagrá-lo universal.
A prostituta, embebida
Em pecadinhos da carne,
Ordenaria ao amor:
‘Tire a roupa, queridinho!
Já faz tempo eu te conheço...
Você tem a minha idade.’
Um padre da Santa Sé
Quereria ser pagão
Pra explicar seu pensamento
Sobre os invernos do amor.;
Mas, não podendo, diria
Que é a mesma a idade da fé.
Um caboclo seresteiro
Do sertão de algum brasil
Diria que o seu amor
Tem a idade da esperança
De uma nuvem passageira
Que abençoe a terra com chuva.
Um mendigo miserável
Miserável miserável
Como só há nas cidades,
Em troca de um cafezinho
Diria: ‘A idade do amor
É a da minha trajetória.’
Um bêbado, já excluído
Da alta roda social,
Precisamente diria
Que amor ou jogo ou dinheiro
Que se mata, vende ou troca
Tem a idade da cachaça.
Um índio, que não fosse outro
Senão o índio brasileiro,
Lembraria que o amor
Tem a idade de Iracema,
Cujos lábios são de mel,
No bem dizer de Alencar.
Proclamaria o poeta:
‘O amor preserva a idade
Do passado e do presente
Que o futuro não revela.
Na velhice será jovem
Enquanto for poesia.
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