Usina de Letras
Usina de Letras
155 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62219 )

Cartas ( 21334)

Contos (13262)

Cordel (10450)

Cronicas (22535)

Discursos (3238)

Ensaios - (10362)

Erótico (13569)

Frases (50612)

Humor (20031)

Infantil (5431)

Infanto Juvenil (4767)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140800)

Redação (3305)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6189)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Cartas-->O AMOR ATRAVÉS DOS SÉCULOS-III -- 11/08/2004 - 06:10 (OLYMPIA SALETE RODRIGUES - 2 (visite a página ROSAPIA)) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O AMOR ATRAVÉS DOS SÉCULOS-III

Transcrevo aqui uma carta de amor escrita há quase dois séculos. E fica provado que o amor, com suas realizações e seus conflitos, continua o mesmo no coração do homem. Esta é uma carta diferente, ou diferente é a missivista... Ela nos sugere que, mesmo quem se entrega ao amor divino, também se rende ao amor humano. Ela nos mostra a liberdade de ser.

Soror Mariana Alcoforado nasceu em 1640 e faleceu em 1723,em Beja-Portugal. Era uma religiosa que professou no Convento da Conceição, na mesma cidade, tendo sido escrivã e vigária do mesmo convento. Esta carta consta da coleção “Cartas Portuguesas”.


Terceira Carta

"Que será de mim?....e que queres tu que eu faça?...

Vejo-me bem longe de tudo o que tinha imaginado!

Esperava que me escrevesses de todos os lugares por onde passasses; que as tuas cartas seriam mui extensas; que alimentarias a minha Paixão com as esperanças de ainda ver-te; que uma inteira confiança na tua fidelidade me daria alguma espécie de repouso; e que ficaria assim em um estado suportável, sem estrema dor.

Tinha até formado alguns leves projectos de fazer esforços que me fossem possíveis para curar-me, no caso de saber com certeza que me tinhas esquecido completamente.

A tua ausência, alguns toques de devoção, o receio natural de arruinar totalmente a pouca saúde que me resta por cansadas vigílias e tantas inquietações, a escassa aparência dá tua volta, a frieza da tua afeição e doa teus últimos adeuses, a tua partida fundada em frívolos pretextos, mil outras razões mais que boas e demasiado inúteis, pareciam prometer-me um auxílio assaz certo, se me viesse a ser necessário.

Não tendo enfim a combater senão comigo, mal podia desconfiar de todas as minhas fraquezas, nem aprender tudo o que hoje sofro...

Oh! triste de mim! Quanta compaixão mereço, visto não sermos ambos participantes das penas, mas eu só a desgraçada!...

Este pensamento mata-me, e morro de susto de que jamais tenhas sido extremamente sensível a todos os nossos prazeres.

Agora sim, conheço a má fé de todos os teus afectos...

Enganavas-me todas as vezes que me dizias ter sumo gosto de estar só comigo...

Às minhas importunações devo somente os teus desvelos e transportes...

De sangue frio formaste a tenção de me abraçar, e consideraste a minha paixão como um trofeu, sem que o teu coração jamais fosse comovido entranhavelmente...

Não deves tu ser bem infeliz, e ter bem pouca delicadeza, para nunca haver sabido colher outro fruto dos meus enlevamentos?...

E como é possível que com tanto Amor eu não tenha podido fazer-te completamente venturoso?

Lamento, por Amor de ti somente, as deleitações infinitas que perdeste...

Por que fatalidade não quiseste desfrutá-las?...

Ah! se as conhecesses, acharias sem dúvida que são mais sensíveis do que a satisfação de me ter seduzido, e terias experimentado que somos mais felizes, e sentimos qualquer coisa de mais fino mimo em amar ardentemente, do que em ser amados.

Não sei nem o que sou, nem o que faço, nem o que desejo...

Mil tormentos contrários me despedaçam!...

Quem poderá imaginar um estado mais deplorável?...

Amo-te como uma perdida, e modero-me ainda assim contigo, até não ousar talvez desejar-te as mesmas tribulações, os mesmos transportes que me agitam...

Matar-me-ia, ou a não fazê-lo, morreria de dor, se estivesse certa que nunca tinhas repouso, que a tua vida era uma contínua desordem e perturbação, que não cessavas de derramar lágrimas, e que tudo aborrecias...

Eu não me sinto com forças para os meus males, como poderia suportar a dor que me causariam os teus, mil vezes mais penetrantes?...

Contudo não posso do mesmo modo resolver-me a desejar que não me tragas no pensamento, e para falar-te sinceramente, sinto com furor ciúmes de tudo quanto possa causar-te alegria; comover ä teu coração, e dar-te gosto em França.

Ignoro por que motivo te escrevo...

Vejo que apenas terás dó de mim, e eu rejeito a tua compaixão, e nada quero dela;

Enfado-me contra mim mesma, quando faço reflexão sobre tudo o que te sacrifiquei...

Perdi a minha reputação; expus-me aos furores de meus pais e parentes, às severas leis deste Reino contra as religiosas... e à tua ingratidão, que me parece a maior de todas as desgraças...

Ainda assim eu sinto que os meus remorsos não são verdadeiros, e que do íntimo do meu coração quisera ter corrido muito maiores perigos por Amor de ti, e provo um funesto prazer de ter arriscado por ti vida e honra.

Tudo o que me é mais precioso não devia eu entregá-lo à tua disposição?...

E não devo eu ter muita satisfação de o ter empregado como fiz?...

Parece-me até não estar contente, nem dás minhas mágoas, nem do excesso de meu Amor, ainda que, ai de mim! não possa, mal pecado, lisonjear-me de estar contente de ti...

Vivo, e como desleal, faço tanto por conservar a vida, quanto perdê-la!...

Morro de vergonha... acaso a minha desesperação existe somente nas minhas?...

Se eu te amasse com aquele extremo que milhares de vezes te disse, não teria eu já de longo tempo cessado de viver?...

Enganei-te... tens toda a razão de queixar-te de mim... Ah ! por que não te queixas?...

Vi-te partir; nenhumas esperanças posso ter de mais ver-te. e ainda respiro!... É uma traição...

Peço-te dela perdão.

Mas não mo concedas...

Trata-me rigorosamente.

Não julgues os meus sentimentos veementes...

Sê mais difícil de contentar...

Ordena-me nas tuas cartas que morra de Amor por ti...

Oh! conjuro-te de me dares esse auxílio para poder vencer a fraqueza do meu sexo, e pôr termo às minhas irresoluções, por um golpe de verdadeira desesperação.

Um fim trágico obrigar-te-ia, sem dúvida, a pensar muitas vezes em mim...

A minha memória te seria cara, e quiçá esta morte extraordinária te causaria uma sensível comoção.

E a morte não é porventura preferível ao estado a que me abaixaste?...

Adeus!

Muito quisera nunca haver posto os olhos em ti.

Ah! sinto vivamente a falsidade deste senti- mento, e conheço neste mesmo instante em que te escrevo, quanto prefiro e prezo mais ser infeliz amando-te, do que não te haver jamais visto.

Cedo sem murmurar à minha malfadada sorte, já que tu não quiseste torná-la melhor. Adeus.

Promete-me de conservar uma terna e maviosa saudade de mim, se eu falecer de dor; e assim possa ao menos a violência da minha paixão, inspirar-te desgosto e afastar-te de tudo!

Esta consolação me será suficiente, e, se é força que te abandone para sempre, desejara muito não deixar-te a outra.

Dize, não seria nímia crueldade a tua, se te servisses da minha desesperação para, pareceres mais amável, mostrando que acendeste a maior paixão que houve no mundo?

Adeus outra vez...

Escrevo-te cartas excessivamente longas, o que é uma falta de consideração para ti: peço-te mil perdões, e atrevo-me a esperar que terás alguma indulgência para com uma pobre insensata, que o não era, como tu bem sabes, antes de amar-te.

Adeus.

Parece-me que demasiadas vezes me dilato em falar do estado insuportável em que estou.

Contudo agradeço-te, do íntimo do meu coração, a desesperação que me causas, e aborreço o sossego em que vivi antes de conhecer-te...

Adeus.

A minha paixão cresce a cada momento.

Ah! quantas cousas tinha ainda para dizer-te!..."
______

FONTE: http://www.npd.ufes.br/textos/texto22.htm

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui