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Contos-->Último voo do ABS 815 -- 04/05/2018 - 11:48 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos










A turbulência se prolonga por tempo superior ao previsto pela tripulação e visíveis danos na  fuselagem são percebidos pelos passageiros. Casados que há tempos não conversavam, mantinham agora as cabeças coladas uma à outra e balbuciavam alguma coisa ininteligível. Irmã Paola tentou debulhar um terço, em voz alta, e não conseguiu. No meio do corredor, um homem ergueu a voz: Sou padre Davi! Pelo poder que me concede a Santa Madre Igreja, eu perdoo todos os vossos pecados, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Alguns responderam: Amém! Muitos  balbuciaram palavras quase inaudíveis, outros, apenas moviam os lábios.  Fernão entrou na cena de seu batismo, viu os pais e padrinhos na Igreja da Consolação. Viu também a pia batismal com água. Pessoas da comunidade acendiam velas no Círio Pascal. Com um crucifixo na mão,   o sacerdote ungia a testa e o peito  das crianças com o óleo dos catecúmenos. Viu ainda um animal asqueroso levantar-se do mar.

A Fera tinha dez chifres, sete cabeças e muito poder sobre a Terra. A fera  soprava na mente dos cristãos bombas de pensamentos infladas de ganância, vaidade e orgulho. Houve um clarão, seguido do ribombar de mil  trovões. Abriram-se livros, e ainda outro livro, que é o livro da vida. Miríades de anjos entoaram um coro diante do trono do Cordeiro. Mostrou-lhe então o anjo um rio de água viva que brotava da pia batismal. A mãe traçou uma cruz na testa do filho. Houve uma explosão que só o menino ouviu. E chorou. O animal desapareceu numa nuvem de fumaça negra. Fernão viu ainda  Moisés no monte Nebo jogar seu manto para Josué: “O que está oculto pertence ao Senhor, nosso Deus; o que foi revelado é para nós e para nossos filhos. Nada temas.”

 Passou em seguida o manto para Josué e Josué passou o manto sobre a cabeça do menino. Veio uma nuvem luminosa e o envolveu. Extático, Fernão desprendeu-se do sobrenatural e lentamente, retornava ao mundo dos mortais viventes. E agora se via em voo rasante sobre o mar.  Não muito bem desenhadas, traçou uma cruz na testa, uma na boca e outra no peito.  Objetos, poltronas e bagagens voavam em todas as direções e se chocavam, ora contra a fuselagem, ora contra os passageiros e tripulantes. Gravemente ferido, o corpo do padre estava estendido, a fio comprido, no corredor da aeronave.




—Tem algum médico a bordo? — perguntou um comissário.

 André conseguiu, com dificuldade, pegar sua maleta. Imediatamente, doutora,  Tânia Jiló também apanhou a dela. Algum metal pesado os atingiu e suas maletas foram sugadas pela janela quebrada. Também foram sugados muitos passageiros e lançados para fora da nave. Nathalie  evitou o choque com um notebook que passava voando.

Abaixou-se e sentou numa poltrona ao lado de uma velhinha morta. Arrependeu-se de ter avisado a Hemor que Fernão estava a bordo. E... se ao invés de desviar dos nimbos, o piloto resolvesse entrar em rota de colisão com eles? Fernão é ‘esquizo’, Hemor também. E se Fernão invadir a cabine de comando? E se os dois entrarem em luta corporal em pleno voo?... Nathalie  fechou os olhos e se viu dialogando com Dom Pierre Chardin. “Será que desde o primeiro momento de vida, até a morte, somos seres espirituais passando por experiências humanas, ou seres humanos passando por experiências espirituais?” Levantou-se segurando em uma poltrona sobre a qual um  corpo curvado deixava livre o encosto. Desmaiado, ou morto. Talvez. Teria Deus escolhido aquela hora para morrerem tantas pessoas ao mesmo tempo? Sobreviveria alguém ao acidente?  Talvez fosse a hora do piloto.

Os outros eram passageiros que estavam no voo errado, na hora errada.  “Brevê vencido’, argumentou a voz do eu paralelo.  “Acaso brevê vencido é causa mortis?” — Contrapôs o anjo que assiste o homem nos momentos de aflição — Ninguém confere se o brevê está vencido, e embarca numa viagem para a vida ou para a morte. Os humanos têm muita confiança no homem e pouca em  Deus — concluiu o anjo — As pessoas vivem em uma sociedade que dita regras coletivas para seres individuais, como se os humanos  fossem bens de consumo, a escorrer na esteira de produção das grandes fábricas. Ou como se a vida fosse uma ficção que se escreve em livros. “ Tens visto muita novela, Ravenala. Vire a página. Temos um avião prestes a cair.” 


Ainda sentado, Fernão acredita  que a qualquer momento a aeronave se espatifaria nos ares. Cairia contra o solo, ou em violento choque com o paredão das águas. Nathalie  assentou-se juntinho dele e estendeu-lhe a mão. Agora ou nunca — Pensou Fernão e, entregou a ela o bilhete guardado há anos, com anotação  recente. “Leia o verso.”
Leu em silêncio e ouviu os gritos do coração.
— Vai dar certo, disse Nathalie. 
Colocou o bilhete no bolso do uniforme e voltou à cabine do avião, reconstruindo  na mente as lembranças de sua história, quando trabalhava na casa de Raquel, mãe de Fernão.
***
Adalberto Lima, fragmento de "Estrela que o vento soprou." (ficção)





Imagem real Google




Enviado por Adalberto Lima em 07/04/2018

Leia também:

 


...E aquela blusa que você usava 
Num canto qualquer tranquila esperava.
—Roberto Carlos—


 

Era dezenove de abril.
Champanhes estouraram. Balões  subiram decorando o teto com diversas cores. “À saúde dos noivos!”  Tilintaram as taças em sintonia com um coro de vozes.  “Viva os noooivos...” 

O jantar foi servido, sem que houvesse tempo para muita conversa.

— Os nubentes estão cansados — disse alguém em tom zombeteiro.
— Cansados de quê?
— De esperar que os convivas se retirem.

Houve uma explosão de riso, seguido de pisadas de vultos que se retiravam. 

Os noivos ficaram  sós e o que se passou entre quatro paredes, nem as paredes devem saber.

 No dia seguinte...


— Larga essa vassoura, Morgana... Morgan... Morguinha...
— Comerás o pão com o suor do teu próprio rosto.
— Posso te ajudar?
— Só temos uma vassoura. Recolha as bexigas e as garrafas. Ponha os cristais na pia...
— Deixa que eu arraste os móveis. São pesados demais.
— Lá em casa, sempre carreguei o piano.

Robert  lembrou-se do piano de cauda da casa dos Castros. Mas com certeza, Morgana falava mesmo era do trabalho difícil, principalmente, depois da morte dos pais dela.

— Dê cá essa vassoura!  Posso não ter me casado com uma bruxa, mas me acho enfeitiçado por ela.
— Para Bob! Não me faça rir. Se eu perder o controle, acabo fazendo xixi nos lenções.

Robert riu contagiando a companheira, ela tanto riu e chorou. E o riso trouxe uma torrente de água salgada a escorrer no rosto... (e nas pernas).

— Eu avisei. Agora, com licença. Preciso trocar os lenções de cama.

Morgana assumiu um semblante sério.

— Prometeste não narrar no livro nossa  lua-de-mel. Vai manter a palavra, não vai?
— Claro. Vou falar só da lua de xixi.

O quarto explodiu em gargalhada e os lenções tiveram, novamente, que serem  trocados.

Abriu as janelas
 A brisa  suave da noite veio acariciar  a pele macia da semideusa deitada a fio comprido sobre lençóis macios. Lá fora,  as águas batiam  forte nas pedras artificialmente colocadas, para conter a ressaca do mar. E a lua empenhava-se em mostrar a brancura das ondas desfeitas quebradas nas pedras.

Era  noite do segundo dia.
— Este jornal que lês é de ontem. Penso que podemos fazer algo melhor, disse Morgana, com ar de riso.

 Robert   estendeu a mão para desligar o abajur.

— Oh, não!... Tenho medo do escuro.
— Logo virá a aurora dissipar teus medos.
—  Será Por que os medos se ocultam à luz do dia, e nos atormentam, assustadores na escuridão?
— Para explicar os medos noturnos é preciso que estabeleçamos um paralelo entre sonho e pesadelo. 

Morgana ficou curiosa.

— Podes explicar isso, sem tomar valioso tempo de nosso sono?

Pesadelo é a explosão de problemas reprimidos, que se manifestam em sonhos aflitivos. Quem nasceu no campo, sonha com boi querendo chifrá-lo. Quem mora na cidade, sonha com assalto. Isto é reflexo de seus medos que  se transformam em pesadelo. Já o sonho tem um leque muito vasto de significados. Existem até vendedores de sonhos.

— Falavas sério. Agora, gracejas. Que estória é esta de vender sonhos?
— Quem escreve livros. Vende sonhos.

Robert   quebrou a concentração de Morgana, com uma gargalhada. 

— Por que riste?
— Lembrei-me de um verbete de Machado.
— Qual? 
— ‘O sonho coincidiu com a realidade, e as mesmas bocas uniram-se na imaginação e fora dela. ’

Morgana que estava muito interessada em desvendar os mistérios do sonho e do pesadelo. Levou um susto. E assim que pôde falar, disse carinhosamente: “ Safadinho! Quase me sufocou com teus beijos.”

 — Gostei do ‘safadinho’! Na variante linguística carioca, safadinho pode  significar menino travesso. E fazer travessuras é muito bom!
— Não me fale em Rio de Janeiro, me dá medo de bala perdida!
— Durmamos de mãos dadas, a aurora não tarda chegar.
 

***
Adalbeto Lima, fragmento de "Estrela que o vento soprou."
Imagem: olhares.sapo.pt.

Leia também:


 O Primeiro Beijo

 III Ilha do Amor

Arco do cupido


 Nuvens passageiras 

 
 Um sorriso e uma lágrima   

 - ILHA DO MEDO      

 PEGADAS NA AREIA
     




 



Adalberto Lima


Enviado por Adalberto Lima em 10/05/2018







Adalberto Lima




Enviado por Adalberto Lima em 04/05/2018

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