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Contos-->Perto demais do coração selvagem -- 23/04/2018 - 17:36 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A fazenda Campo Grande, toma ares de festa. 

Apareceu uma cabeça na janela. Depois, cada janela tinha duas ou três cabeças curiosas. Coronel Generoso  chega    fumando um cigarro de palha.

— Onofre, faça o combinado!
— O boi, patrão?
— Sim! O boi da matutagem. Primeiro, toque o berrante. Prenda no curral os bois  mais gordos. Eu mesmo quero fazer a escolha.
— Vai ter  missa? 
— Não dá tempo de chamar o padre. 
— Com licença, patrão. Preciso tomar providências.
— Espere... Passe no curral e confira se a índia está bem amarrada. Não quero acidente na festa. Vá até a oficina e mande Zé Coco guardar as ferramentas. Quero ouvir ‘Saudade de Mirabela’, ver a alma de Corina saltar  na janela dos olhos.  Aquela mulher nunca se esqueceu  da terra em que  nascida.
— Tô indo, patrão.

O  juízo de Onofre ferveu. 

Catou quatro pedrinhas e pôs na algibeira. Cada uma representava uma ordem recebida. À medida que fosse cumprido, retirava uma pedra e jogava fora. No fim se sobrasse pedra, faltava cumprir alguma obrigação.  Mas Generoso dera três ordens. E Onofre pôs quatro  pedrinhas na algibeira!...Bem,  a outra era pra se lembrar de  ir no Juramento, comprar extrato Dirce. Ficar com o corpo cheiroso... 

Teve vontade de soltar a índia capturada para que ela  se acostumasse logo com o pasto. Estava presa por uma corda ao  coração do vaqueiro. Ninguém podia se aproximar da índia. Mas Onofre chegou perto. Perto demais daquele coração selvagem e ofereceu  à índia água numa cuité. Apinajé aceitou. Bebeu, e seu espírito ouviu a voz do  Deus de homem branco, saindo do coração do vaqueiro. 
A torre de Babel desmoronou-se.
 Índia e vaqueiro falaram  a mesma língua.

— Chegue aqui!...
— Posso não! O homem branco é  inimigo. Mata  mãe natureza, e nossa gente.

Nenhuma palavra humana é capaz de descrever o que Onofre viu e sentiu. Se a água servida numa cuia, abriu a mente da índia  e lhe trouxe recordações de sua tribo, Onofre não sabe. Nem sabe se também ele, tinha sido levado a conhecer a um céu rendado de estrelas ou se bebeu do mel que a lua derrama na noite orvalhada. Sabe que sentiu fogo correr em seu corpo, como água a  escorrer  na ribeira. E seus ouvidos se abriram à voz da alma:

— Vaqueiro ter cheiro bom — disse Apinajé.
— Índia ser bonita. Ter cheiro de mata orvalhada, ovelha molhada,  leite fresquinho e tupixaba. Cheiro de vassourinha que varre  forno de biscoito caseiro. 
— Índia gostar de vaqueiro. Vaqueiro  gostar de índia. 
E Apinajé tocou cangoeira na festa de homem branco. 
 
  
Auá cuiarana-araruana, araruana–araruê
Dom dom jacutingalá, piscatinga ararumbê
 Piscatinga tingá...
 
A notícia que uma índia tinha sido capturada nas imediações da fazenda Campo Grande espalhou-se, rapidamente. Gente da circunvizinhança veio conhecer aquele vivente estranho. Até o padre que celebrava na capela da Catarina, também apareceu por lá.

— Não pude faltar a seu chamado,  coronel Generoso. Obrigado por mandar o vaqueiro me avisar. Estava mesmo curioso para saber a verdade sobre a notícia que corre em Juramento e já alcança Montes Claros. 
— A notícia deve ter viajado léguas. Acrescentou Generoso.
— Creio que o senhor foi prevenido, ao mandar abater um boi para a festa. Vai chegar muita gente na fazenda. Isso é bom. Muita gente só não é bom, quando a comida é pouca.

***
Adalberto Lima, trecho de "Estela que o vento soprou."
Imagem: Google

 
Adalberto Lima
Enviado por Adalberto Lima em 23/04/2018
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