Hoje é meu aniversário. Haverá uma festa, programada para logo mais. E eu me pergunto:
- Tenho que estar contente? Hum!!! Sim... Sim! Lógico que estou. (Estou?) Minha casa estará repleta de gente, música, comida, risos... Uma festa de arrasar. Afinal já é tradição comemorar meu aniversário com muito agito.
Como o tempo é louco por velocidade, a festa já está em altíssimo grau. Olho para tudo aquilo e não vejo nada de estupendo. Nada que já não tivesse visto. (É um sentimento que parece estar se instalando em algum canto profundo do meu ser). Mas é preciso comemorar, é preciso ser anfitriã perfeita. E cá estou. Converso com um, com outro, movimento-me por todos os cantos e percebo, como sempre, que todos estão se divertindo e o tempo passando rapidamente.
De repente, vem entrando uma garotinha toda à vontade, carinha de sapeca, como se ninguém estivesse ali. Vem sorrindo para mim, eu me assusto e tento pensar:
- Filha de quem será? Mas todos os convidados sabem que esta não é uma festa onde se traz criança! Meu Deus, o que faço?
Vejo, como se fosse em càmera lenta, a garotinha com os braços abertos para mim, num encaixe certo para me enlaçar. Tenho vontade de gritar, de chamar alguém para encontrar os pais da menina para eu sair desse apuro. Sinto que minha festa vai fugir do meu controle:
- O que dirão os convidados? Com que cara enfrentarei tal imprevisto?
A cada pergunta que me faço, ela está mais próxima. Consigo ver seu sorriso a iluminar tudo. A imagem da alegria e felicidade, como se a festa fosse sua. Desespero-me de pensar que um bando de crianças possa vir atrás dela. Nesse exato instante os convidados começam a fazer um círculo ao meu redor:
- É agora que o círculo, digo, o circo vai pegar fogo e não tenho o que dizer, nem para onde correr. Vou passar a maior vergonha de todo os tempos.
As luzes se apagam e um imenso coro canta parabéns. Nesse instante a garota chega até mim e - para meu espanto - abro os braços para ela e digo que seja bem vinda. Espanto maior quando o abraço se concretiza , pois ela me olha , sorri e eu descubro que a criança SOU EU !!!
- Estou louca! A nova idade está me fazendo ver coisas. Ah, mas esse olhar é o meu!!! Tremo da cabeça aos pés.
Subo numa cadeira para apagar as muitas velinhas. As luzes se acendem e percebo que parabéns e pique-pique terminaram. Que me importa! Sou criança outra vez! Pensem o que quiserem. Passo o dedo na cobertura do bolo, escorrego e lambuzo o rosto e a roupa. Que delícia! A energia da criança do meu mundo interior é meu melhor presente. Agora, sim, estou contente.
De fato, a festa era dela! Fizemos a nossa festa, a mais real e verdadeira!
