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cronicas-->A bicicleta e o caixão -- 13/01/2001 - 20:23 (Cláudia Azevedo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Chiquinho pegou o seu cofre, colocou mais uma moeda, aproximou-o dos seus ouvidos e o sacudiu como de costume. O barulho das moedas batendo na madeira crua era como uma música aos ouvidos do garoto.

Todos os dias ele trabalhava no bar do seu pai. Era um trabalho árduo e cansativo. Seis horas da manhã, lá estava o garoto abrindo as quatro portas de aço do comércio. Era encarregado de comprar periodicamente um pacote de açúcar no Mercado do outro lado do morro. Percorria todo o caminho de volta com o pacote sobre a sua cabeça, ou alternando os dez quilos de açúcar de um a outro ombro. Também fazia entrega de gás a domicílio com o seu carrinho de mão. A tarde ia para a escola e, depois da aula, voltava ao trabalho. Eram dez horas de jornada por dia.

Como todo garoto de doze anos, Chiquinho tinha as suas brincadeiras de criança. Colecionava Bolinhas de gude, era leitor assíduo de estórias em quadrinhos e estava sempre jogando futebol no campo do "seu Roque", apesar de quase nunca finalizar uma partida, pois seu pai sempre requisitava seus serviços.

A origem de sua família era humilde. Ele nascera em Morrinhos, no Ceará. Aos seis anos, mudou-se para a capital cearense e aos dez, para a Baixada Fluminense no Rio de Janeiro com a sua família, onde seu pai buscava uma vida melhor.

Aqueles primeiros anos estavam sendo muito difíceis. Mas as coisas prometiam melhorar.

E Chiquinho, balançando aquele cofre, sentia que poderia ter o que desejasse... era como se o mundo todo estivesse ao alcance das suas mãos. Como estava feliz por isso! Escondeu seu tesouro atrás do refrigerador do bar, e retornou para casa. Naquela noite mal conseguia dormir. O garoto vinha economizando por todo um ano. Em pouco tempo, as suas economias seriam suficientes para realizar o seu grande sonho: comprar a tão desejada bicicleta amarela!

Os dias se passaram e notícias não muito agradáveis chegaram do Ceará. A sua avó por parte de mãe, havia falecido. Chiquinho chorou muito. Estava muito triste pela perda da sua avó, mas muito mais abalado pela tristeza da sua mãe, que parecia inconsolável. A sua avó estava prestes a ser enterrada como indigente, pois da empobrecida e esburacada rua Jorge Dumar, onde residia a família, não poderiam sair os recursos para o enterro.

Chiquinho, condoído pela situação, correu até o bar, pegou o seu cofre de madeira atrás do velho refrigerador revestido de um compensado azul desbotado, e balançou-o como de costume. Sabia que aquela seria a última vez que ouviria o barulho das moedas batendo lá dentro. Agora a música era diferente... soava triste, fúnebre.

Chegou em casa, abriu a porta e dirigiu-se para a cozinha onde todos estavam reunidos. Colocou o velho cofre sobre a mesa e permaneceu em silêncio. Todos fitaram o menino, perplexos. Não era necessário que ele dissesse nada naquele momento.

Chiquinho absorvia os detalhes da reação de sua mãe. No rosto dela estava estampada uma mistura de surpresa, alívio e orgulho pela atitude do menino, e isso os tornava cúmplices naquela hora de angústia.


Chiquinho descobriu que a sua bicicleta já não possuía mais o mesmo valor de antes. Proporcionar um enterro digno para a sua avó era muito mais importante para ele agora. De alguma forma ele compreendia que não estava abrindo mão do seu sonho, ele apenas abria mão da alegria de uma realização imediata, para amenizar a tristeza de muitos... e isso era o que realmente importava naquele momento.

JAN/2001






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