A fazenda Campo Grande era só silêncio, parecia Sexta-feira da paixão. Muitos camaradas, no entanto, quebraram o jejum de língua para conversar baixinho com Onofre: — Chegaram a ver a onça? — A onça que vimos é aquela que está amarrada na casinha de curral. — A índia? — Podia ser outra coisa? Acaso José Lino tá amarrado lá. Já deve estar no céu! — No céu da boca da onça!— disse outro. — E se José Lino fundou no grotão atrás dela e matou a bicha? O patrão disse que é pra trazer o couro. Ele deve ter feito o serviço completo! — Pode ser também que ele estava tirando o couro da pintada, e chegou o companheiro dela!... — Arrenego! Vira essa boca pra lá. — Se a onça comeu o vaqueiro, num vai ter enterro. — Sê besta, homem! — É verdade que o patrão mandou Pururuca embora? — Pururuca está com o pé na espora. Japuaçu também! — Se Japuaçu for mandado embora. Turíbio Soberbo e Amarildo vão juntos. São unha e carne. — Uma carga dupla de preguiça, você quer dizer. — Dinotério também é morto de preguiça. Até parece que é mulher do outro... Onde Turíbio está, Dinotério aparece como quem não quer nada e se mete na conversa. Falam em criar peixe-leiteiro. Quem já viu uma loucura dessas! Deve ser código, para os outros não entenderem o que falam. — Arrenego! Quem diacho é Dinotério? — Ô fi’duma quenga! Dinotério é Amarildo. Se falar o nome verdadeiro, na frente dele, dá morte. — Quem já se viu ter vergonha do nome? — Com um nome desses até porco anda de cabeça baixa. O silêncio foi quebrado por uma gargalhada coletiva. A risada ecoou contagiante como o bocejar ou o canto do galo.
*** Adalberto Lima - trecho de Estrada sem fim...(ficção) Imagem: Internet