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Contos-->UM MARATONISTA CLÁSSICO -- 14/11/2015 - 04:19 (PAULO FONTENELLE DE ARAUJO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


José Aldo, tinha trinta anos e começou a sair da depressão que sofria no ano de 1993, quando escutou da tevê ligada a  frase do programa matutino: “Vida é movimento”. Na hora  imaginou: se vida é movimento, vencer aquela tristeza equivaleria a completar uma grande corrida, uma maratona. Vencer a tristeza seria correr.  Correr a “maratona  José Aldo”. Assim  batizou o evento; a corrida  liquidaria sua angústia. Uma maratona, pronto. O desânimo acabaria, a depressão ficaria no ontem. Ele pensou, desistiu, mas depois a ideia retornou com uma questão: como medir os quarenta e dois quilômetros de uma prova na  cidade de São Paulo? 


Apareceu a corrida de São Silvestre, no dia 31 de dezembro. A prova era perfeita. Tinha quinze quilômetros. Poderia ser fácil medir por ali o comprimento da maratona: duas voltas completas e uma terceira parcial até o início da subida da avenida Brigadeiro Luís Antônio.


Aldo decidiu correr a sua maratona. Começou o preparo e era um sábado. Correu.  Exercitou-se durante algumas semanas e a depressão diminuiu com o esforço diário pelas ruas do seu bairro. Depois pela avenida São João, parque do Ibirapuera. Treinou até chegar a corrida paulistana, que chamam de São Silvestre porque São Silvestre era um Papa Católico e na sua época os cristãos deixaram de ser perseguidos.


Hoje todos perseguem os cristãos corredores e muitos estão correndo. Na verdade, José Aldo estava correndo no encalço da sua maratona particular que deveria marcar o fim dos seus meses de aflição, das noites insones, do estômago pulsar uma dor que dificultava a respiração. Ele nunca entendeu a  vontade  simultânea de chorar e vomitar.


Deram a largada, José Aldo saiu com a multidão. Pensou na tevê filmando as cabeças. Havia velhos no meio, outros atletas com bonés americanos, mas os velhos usavam bonés de todos os tipos. A corrida era também um carnaval e todos queriam terminar a prova para vencer o ano de 1993 ou 1994. Ele  queria vencer a angústia. Correu os quinze quilômetros da sua primeira volta (a própria São Silvestre), depois repetiu o caminho. Levou tanto tempo e não encontrou gente na torcida.  Correu o terceiro trecho parcial e finalmente, após sete horas,  concluiu os quarenta e dois quilômetros. Perfeito. Vencera a maratona da virada e de imediato dispensara sua angústia. Tão intensa a angústia, havia sido um transe nos anos de 1993, 1992...toda a sua vida.


José Aldo,  na superação da linha final, olhou para o lado esquerdo, no início da avenida Brigadeiro Luís Antônio, viu o prédio do Serviço Funerário Municipal. O prédio sinaliza as mortes. Agora sinalizará renascimentos. Renascimentos como o do maratonista vencedor chamado "locomotiva humana"; como daquele outro etíope campeão olímpico ao correr descalço. Não eram renascimentos? Não faziam o público chorar pelo impacto?


Tudo girou até José Aldo lembrar-se quando sua mãe dizia esperar um filho sempre pequeno, sempre criança. Ele respondia:  “Mãe...Eu não sou Peter Pan” 


José Aldo terminou a maratona e riu. Desta vez  o Peter Pan era o vencedor da maratona rumo  à “Terra do Nunca”.  Aquela depressão nunca existiu. A vontade de querer se matar desapareceu também. Riu mais ainda,  subiu caminhando a avenida Brigadeiro. Tanta tristeza pregada quando na vida há tantas façanhas. Grandes maratonas percorridas sem testemunhas! Isto!  A vida é uma prova sem regras. Tudo bem. Ele continuava ali.  Pronto para outra e ao mesmo tempo no meio da   rua.     


O choro apareceu ao chegar na esquina avenida Paulista. Talvez o choro fosse felicidade. Sentiu-se depois um maratonista clássico, um corredor exemplar... um cavaleiro vivo após uma cruzada sangrenta. 


José Aldo morreu de câncer dia 19, aos cinquenta anos, mas estava bem.  Foi um câncer fulminante e encarado com tranquilidade ( quase como um idoso encara noventa anos como noventa metros) e isto porque todos os anos, após a primeira vitória, tornaram-se maratonas. Em todas, ele chegara devolvido ao mundo como um corredor.


A vida realmente era uma competição de velocidade e resistência.


José Aldo não se casou, não teve filhos. Deixou uma mãe e dois irmãos.


 


DO LIVRO: "TOUROS EM COPACABANA"





 



 




 

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