No dia em que eu me for,
e a escuridão se fechar por cima de mim mesma,
o que haverá?
Será escuridão, eclipse, obliteração dos sentidos?
Impressão de afogamento, a audição em borbulhas,
impotência pelo inusitado, força maior?
Dizem que aparece uma luz,
forte, pungente.
Não creio.
Óbvio demais para passagem tão grandiosa.
Deve ser uma sensação nunca vivenciada,
ou, eventualmente, vislumbrada por alguns afortunados.
A morte, que a muitos salva da sensação de sofrimento.
Arranca os torturados dos seus algozes, gloriosa libertação.
Livra dos cânceres intermináveis,
já ceifados os prognósticos de cura.
Ela, que estende véus sobre os que envelhecem débeis,
abandonados, enfraquecidos pela vida injusta.
Ao mendigo em noite fria, tísico, tosse insistente
recrudescida pelas guimbas de cigarros recolhidas.
Quando ela nos leva, o que se segue à escuridão?
Adianta respeitá-la, ter coragem para seguir em frente?
Reconhecer a sua imprescindibilidade
quando as batidas do peito ficam tênues
e as lembranças murchas?
Só consigo imaginá-la como o atingir de uma forte onda,
o mar revolto, a rendição.
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