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Cronicas-->Cronicas americanas -- 03/05/2007 - 18:02 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Vocês conhecem as ruas de La Paz? Já foram a La Paz? Eu fui, há anos atrás e vou contar o que ví. Eu caminhava pelas ruas e ví muitas pessoas pobres, atarracadas e tristes, num frio imenso de inverno(mas para chegar lá, enfrentamos o calor úmido da floresta tropical e quente do Mato Grosso, que na época ainda era um estado só.) O ar, cristalino. Ventava e as pessoas usavam capas de mil matizes, de pelica, de lã ou mesmo de tecidos mais finos. O vento vinha dos Andes, do altiplano, porque La Paz fica dentro de uma cratera , que você tem plena noção quando entra pela cidade de ónibus, mirando o abismo lá embaixo e as casas de madeira e telhado de zinco que correm beirando as margens estreitas. La Paz me deixou vivas as lembranças de casa, da saudade que tinha do Brasil e mais de uma vez me ví jurando que se saísse desta, seria para nunca mais pisar alí, não porque não me agradasse, mas pela tristeza que permeia este ar resolutamente corrompido. O Hotel em que ficamos não tinha trinco na porta. Tivemos de improvisar um alarme feito de copos de vidro que cairiam assim que alguém forçasse a porta semi-aberta. Era um hotel alegre, simples...Cheio de estudantes e moças que andavam meio desnudas; claro está que o hotel não tinha reputação boa, mas foi o que pudemos arranjar à época. Por baixo preço...
Numa rua de La Paz, haviam estudantes protestando, eu com minha máquina fotográfica Leica. Foquei a máquina e uma mão abrutalhada cegou minha lente:
--No puedes registrar-lo!
--Por que não?
--És brasilenho?
--Si!
--Fuera de aca.
Não quis ofender a cultura local. Já soube desde esta época que teríamos problemas com os bolivianos. Mais impressionante foi uma ruela de que havíamos ouvido falar, "La Rua de las Brujas". Você caminhava pela rua inclinada, com as pedras do calçamento soltas e tinha que ouvir os feitiços que lançavam contra nossas pessoas e olhar as horríveis cabeças de bezerros mortos espetadas na porta dos cubículos que anunciavam curas de amor, feitiços de morte e até de doenças venéreas. Só não tombamos mortos porque no Brasil, se dependesse de quizumbas e feitiços, o campeonato baiano terminava empatado...De modo que tínhamos anticorpos suficientes para evitar nossa morte certa.
--Brasilenhos?
--Si.
--Donde querem ir?
--Lá para cima!
Apontávamos o monte Chacaltaya, lindo monte nevado que é um dos pontos mais altos da já alta capital boliviana. Uns cinco mil metros, se não me engano.
--Ustedes quieren morir?
--Por quê?
--Brasilenhos...
O coitado do chofer bem que tentou nos demover da idéia, mas nos levou ao sopé da montanha por um preço pequeno e não nos deixou sózinhos.
--Para el caso de necesitaren de hospital...
Nos assustou o senhorzinho de bigodes finos, que parecia um cantor de tango daqueles antigos. Subimos correndo a encosta da montanha nevada, chegamos ao alto onde havia uma base do observatório de Cesar Lattes, o pesquisador brasileiro dos mésons pi. A vista, maravilhosa: Víamos muito além do horizonte e podíamos divisar altas montanhas e os caminhos percorridos pelos incas há muito tempo assim como Santa Cruz de la Sierra, a cidade bonita da Bolívia. Lá embaixo podíamos divisar os galpões onde o cientista brasileiro perseguia as provas irrefutáveis do Universo infinito. Quase morrí de falta de ar e em nossa confusão vimos o vulto do chofer que gritava, pulava lá embaixo, desesperado! Nós estávamos em quatro e o amigo de meu irmão estava mal. Decidimos descer, meio que correndo, meio que rolando.
--Ustedes son locos! Poderian morir! Locos!
Levou-nos a uma pequena casa de chá que ficava na base da montanha, aquecemo-nos com chá de folha de coca (mesmo) e um agradável calor subiu em nossos corpos desoxigenados; nosso amigo se recompós.
--Nunca mais façam isto!
Era um brasileiro que trabalhava no hotel-hospedaria-bar que nos servia o chá.
--Correram risco de morte. Esta montanha é traiçoeira, venta muito e tem a neve fina em alguns locais. Fora que correram risco de embolia de pulmão!
Olhei para meu amigo, agora mais pálido mas de medo. Ah juventude, nos torna imunes! O chá nos deixou mais animados e fomos à capital. As ruas fervilhavam de gente. Jovens protestavam, capacetes surgiam, o verde-oliva dos uniformes dos soldados se misturava às árvores das ruas centrais.
--Brasilenhos?
--Si.
--Fuera de aca. Sin garantias!
Fugimos da Bolívia.
Nunca mais volto lá. Mas a moça linda que ví em meio à turba me enche os olhos até hoje. Se alguém a vir por aí de novo, por favor...Mas esta é outra história.
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