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Artigos-->A MUNIÇÃO SUJA DE MR. BUSH -- 10/02/2003 - 10:15 (Simostral) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos




Texto de Fritz Utzeri - Jornal do Brasil 19/01/03





Caderno B - Fls. B1 e

B10





Saddam Hussein é um mau defunto pra se queimar vela, mas o seu

inimigo

George W. Bush não fica muito longe dele. É impossível comparar a

biografia

de um e de outro. Saddam é um assassino, mas é possível dizer

que, na

História e no contexto político e social dos EUA, Bush Filho é a coisa

mais

próxima de Saddam. Foi eleito num pleito discutível e desde os

atentados de

11 de setembro tem procurado rasgar liberdades civis que são a marca

e a

razão da existência da nação norte-americana.





De que é acusado Saddam? De fabricar e esconder armas de

destruição em

massa. Saddam usou esse tipo de armas não contra os americanos na

Guerra do

Golfo, mas contra os curdos ao norte do país, que foram

impiedosamente

massacrados com gás letal. Agora, os inspetores da ONU acharam

velhas

ogivas capazes de conter gases venenosos. Segundo os iraquianos, as

ogivas

foram compradas há muitos anos e estão obsoletas, esquecidas.





Verdade ou mentira, o fato é que Saddam foi armado (inclusive com

gases

letais e antrax) por americanos e soviéticos e seu programa nuclear

teve

ajuda francesa até ser detonado por Israel. Até o Brasil esteve

implicado

no desenvolvimento de seus mísseis Scud. Mais recentemente, fomos

acusados

de contrabandear material radioativo para o Iraque, mas a venda foi

feita

quando Saddam ainda era o queridinho do Ocidente, o inimigo mortal

dos

Aiatolás.





Para achar esse tipo de armamento no Iraque, armas selvagens que

deveriam

ser proibidas pela Convenção de Genebra, basta dar uma olhada no

arsenal

americano. Poder-se-ia alegar que os americanos são responsáveis, mas

isso

não é verdade. A começar pelas bombas atômicas, os EUA

têm,

consistentemente, usado todas as armas de que dispõem. Em

Hamburgo, na

Segunda Guerra Mundial, onde era fácil distinguir os mocinhos dos

bandidos,

os americanos bombardearam a cidade com bombas de fósforo. Os

civis

atingidos pegavam fogo e corriam para o rio e o mar. Dentro d água o

efeito

cessava, mas, assim que emergiam para respirar, as vítimas tornavam a

pegar

fogo, até morrer.





No Iraque a ação desse tipo de arma é mais insidiosa e ainda mais

duradoura

e devastadora. A mais sinistra e covarde arma dos americanos é o

urânio

empobrecido, ou urânio 238, resíduo da fabricação de bombas

atômicas.

Durante a Guerra do Golfo, George Bush (pai) autorizou o uso de

urânio

empobrecido contra a população civil iraquiana. Essa substância

leva ao

câncer terminal 99,5% dos atingidos por sua ação, num período entre

cinco e

40 anos. Ela foi usada também na ex-Iugoslávia, no Kossovo e na Bósnia.





Depositado nos pulmões ou nos rins, o urânio 238 e os produtos de

sua

degradação (tório 234, protactínio e outros isótopos de urânio)

emitem

radiações alfa e beta que causam, ao longo dos anos, câncer nos

indivíduos

expostos e anomalias genéticas em seus filhos e netos. Nos 110 mil

ataques

aéreos contra o Iraque, desde a Guerra do Golfo, os aviões A-10, dos

EUA,

dispararam 940 mil projéteis sujos, revestidos com urânio. Na

ofensiva

terrestre da Guerra do Golfo, os tanques americanos dispararam 4

mil

projéteis revestidos de urânio. Estima-se que na área dos bombardeios

haja

300 toneladas métricas de detritos radioativos, que já podem

ter

contaminado cerca de 250 mil iraquianos.





Além de continuar bombardeando o país durante os governos Clinton e

George

W. Bush, os americanos proibiram os países da comunidade

internacional de

ceder ou vender ao Iraque os equipamentos necessários para limpar a

água, o

solo e o ar desses contaminantes radioativos.





Os norte-americanos vêm usando urânio para revestir sua

munição

convencional na artilharia, em tanques, mísseis e aviões desde

1977. O

urânio é altamente radioativo e deveria ser guardado em depósitos

seguros

para evitar a contaminação. A vida média desse urânio é de 4.500

anos. Ou

seja, ele permanecerá ativo, matando e aleijando até o ano 6.500, em

pleno

século 25! O uso desses materiais em armamentos foi recomendado para

cortar

custos. Os depósitos americanos estão cheios de urânio empobrecido

e os

departamentos de Defesa e de Energia cedem esse material a

fabricantes de

armas dos EUA, Reino Unido, França, Canadá, Israel, Taiwan, Coréia do

Sul,

Paquistão e Japão, que produzem munição com esse material.





Quando uma bala ou bomba suja atinge o seu alvo, 70% de seu

revestimento de

urânio queima e se volatiliza em partículas altamente radioativas.

Essas

partículas podem ficar depositadas no solo, ser carregadas pelo

vento e

contaminar gente, mananciais e se integrar na cadeia alimentar,

causando

estragos imensos durante milênios.





Só para dar uma idéia, a Organização das Nações Unidas para a

Infância

(Unicef) calcula que na década de 90, como conseqüência da Guerra do

Golfo,

a incidência de câncer em crianças quintuplicou no Iraque.

Sinistramente,

ao mesmo tempo em que denuncia o problema, a ONU impede o

Iraque de

importar medicamentos, no caso radioisótopos, material nuclear usado

para

as radioterapias no tratamento de certos tumores, sob o pretexto de

que

Saddam poderá fabricar armas a partir dos remédios! Assim, em

conseqüência

dessa política cruel, a guerra e o embargo já mataram pelo menos 500

mil

crianças. Ainda hoje morrem entre 4 e 5 mil crianças todos os meses

devido

a males causados pelo conflito, incluindo o urânio 238.





Segundo a Anistia Internacional, morrem 12 crianças por hora no Iraque.

Até

hoje os hospitais estão cheios de pacientes e não têm condição

sequer de

estocar vacinas, pois a geração e a distribuição de eletricidade é

precária

e o embargo não permite a importação de equipamento para

normalizar o

fornecimento de energia elétrica e água, com o argumento de que o

Iraque

poderá usar essa energia para fabricar armas.





Mas não são apenas os iraquianos que sofrem. Os americanos

veteranos da

guerra vêm sendo vítimas de doenças de diagnóstico difícil, tais

como

imunodeficiências semelhantes à Aids. Tanto entre os iraquianos como

entre

os veteranos americanos e ingleses, registram-se sintomas de um

mal

conhecido como Síndrome da Guerra do Golfo. O câncer e o

nascimento de

crianças com deformações físicas são cada vez mais numerosos. Os

mesmos

sintomas afetam mais de mil crianças na antiga Iugoslávia, onde os

aviões

da OTAN jogaram bombas sujas com urânio.





Convém lembrar que a Iugoslávia fica na Europa. Imaginem os armamentos

que

Bush Filho vai usar na guerra que vem aí. Ele precisa:





1) modernizar seus arsenais;





2) renovar as encomendas à indústria bélica dos EUA, da

qual

depende grande parte de sua economia e;





3) testar novos armamentos.





A guerra será ganha rapidamente, o petróleo será controlado e os

americanos

dizem que vão democratizar o país em 18 meses.





Seria bom, nesses momentos, pensar como um árabe e islâmico antes de

agir.

Eles estão se vendo invadidos pelos infiéis em outra cruzada (Bush

Filho já

escorregou ao usar o termo). O ódio dos árabes ao Ocidente tornará o

mundo

cada vez mais inseguro, até que o terrorismo não oficial comece a

usar as

mesmas bombas e balas sujas que os terroristas americanos usam

contra os

civis iraquianos em nome do combate ao terrorismo. Só quando as

crianças

afetadas forem americanas ou inglesas, ou seja, brancas, o mundo

acordará

em comoção e lágrimas e falará em selvageria, pois, como já está

provado,

nem todos os seres humanos são iguais.



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