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Cronicas-->COMPARAÇÕES -- 01/02/2007 - 20:49 (Roberto Stavale) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
COMPARAÇÕES

O verbo comparar deveria estar no rol dos pecados criados pela Santa Madre Igreja. Pois as comparações, em detrimento de causa própria, ou apenas para enobrecer o ego, não passam de soberba, ou seja, um dos sete pecados capitais. Mas vamos a algumas breves comparações mundanas do nosso dia-a-dia.
Quando eu era menino, nos idos tempos dos anos 1940, o cotidiano transcorria de uma maneira simples, difícil de acreditar no dias de hoje, principalmente pelos jovens.
Lembro perfeitamente, não tinha cinco anos ainda, quando, um certo dia, ao me debruçar no parapeito da escadaria externa da casa onde eu morava, no Bixiga, sofri um tombo espetacular, de mais de três metros de altura. Caí de cabeça no cimentado do passeio e lá fiquei, desacordado.
Meus pais ouviram o barulho da queda e imediatamente me levaram, ainda desmaiado, para a farmácia do seu Simonette, na mesma rua.
O saudoso farmacêutico fez o curativo que qualquer hospital faria. Em seguida, tirou uma bala do bolso e me deu, para eu parar de chorar. A conta foi anotada em uma caderneta, pois só no final do mês meu pai pagaria a despesa, aliás, como fazia no armazém de secos e molhados.
Se fosse hoje, alguém chamaria o resgate e a criança seria levada para um pronto-socorro. Chegando lá, o policial de plantão começaria a investigar o acidente, procurando saber se alguém tinha sido responsável pela queda. O caso automaticamente seria encaminhado ao Ministério Público, e o Promotor da Infància, Juventude e Adolescência cuidaria do caso que, quiçá, fosse parar na Pastoral do Menor.
Os medicamentos indicados pelo médico do pronto-socorro seriam comprados em qualquer farmácia com a caderneta eletrónica que são, guardadas as devidas proporções, os atuais cartões de crédito, cuja fatura também é paga no final do mês, ou parcelada, conforme o bolso do pai do acidentado.
Inda hoje, ao olhar-me no espelho, vejo do lado direito da testa a cicatriz causada pelo acidente.
Mas vamos parar de voar escadarias abaixo e falar de outros vóos.
Até o final dos anos 1950, viajar de avião era um acontecimento relevante na vida de qualquer mortal. As mulheres passavam horas nos salões de beleza e colocavam as suas melhores roupas e chapéus. Os homens não entravam em um avião sem estar de terno e gravata. O carinho e a gentileza demonstrados pelas tripulações daqueles antigos DC3 e DC4 da Vasp, Real Transportes Aéreos, Aerovias Brasil, Cruzeiro do Sul, ou nos vóos domésticos e internacionais dos Constellations da Panair do Brasil simplesmente deixaram saudade! Os comandantes eram chamados de pilotos e co-pilotos. As comissárias de bordo eram as charmosas aeromoças.
Contam que a Panair do Brasil, uma subsidiária da Pan American dos Estados Unidos, foi a primeira companhia aérea que voou com rotas para outros paises com a bandeira brasileira em suas aeronaves. As atividades da Panair, cantadas em prosa e verso, foram encerradas em fevereiro de 1965, por um despacho do então ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo Gomes, que cassou o certificado de operações da empresa, alegando uma enorme dívida com a União. Dizem que a tramóia visava favorecer o crescimento da Varig. Em compensação, hoje é a Varig que está ruim das pernas, e mal consegue voar com os poucos aviões que ainda lhe restam. Comparações? Não! Apenas recordações de algumas aberrações do regime militar.
Atualmente a gente não sabe se está em uma estação rodoviária, ferroviária ou em algum aeroporto. A democratização dos transportes resolveu todos os problemas sociais.
Passageiros de bermudas e camisetas tipo regata são comuns. Os comissários de bordo, a cada dia que passa, ficam cada vez menos atenciosos. As esperas por vóos nos aeroportos refletem toda a transformação sofrida nesta caótica comparação.
Mas vamos falar um pouco de futebol.
Em minhas primeiras idas ao Estádio do Pacaembu, também nos anos 1940, testemunhei um fenómeno relativo ao espaço. Na época, um jogo entre Corinthians e Palmeiras, no domingo à tarde, levava mais de cem mil torcedores ao estádio. Hoje, apesar de mais espaço - a Concha Acústica, uma espécie de anfiteatro que existia nos fundos, foi demolida para dar lugar a mais uma arquibancada, carinhosamente apelidada de tobogã - cabe menos gente. Mesmo em decisão de campeonato, no Pacaembu, esses clubes não atraem nem sessenta mil pagantes. É sempre existem os caras-de-pau que entram por fora. Assim, fica difícil saber o número certo de pessoas que compareceram no jogo.
Mais um detalhe: naquele tempo, uma equipe de futebol era formada pelo goleiro, defesa, linha média e ataque. Atualmente, os números confundem qualquer cidadão. É um tal de 4, 4, 2. 3, 5, 2, e por aí vai a numerologia com os nomes atuais das posições, que nada têm a ver com as referências do passado. A defesa foi transformada em jogadores de contenção, volantes e laterais recuados ou avançados. E quando o técnico escala dois centroavantes para o ataque, que outrora contava com cinco elementos, os comentaristas esportivos ficam boquiabertos.
Mas a grande diferença em nossas comparações, falando de futebol, está nas torcidas, principalmente as uniformizadas.
Assistir a uma partida de futebol era um evento salutar e que tinha um ar de romantismo. Conforme o povo ia chegando, sem distinção do time para o qual torcia, acomodava-se, lado a lado, escolhendo os melhores lugares. Hoje, esses lugares pertencem às torcidas uniformizadas, verdadeiras gangues!
Antigamente saía-se do jogo alegre ou triste, dependendo do resultado. Porém, de qualquer forma, em paz! Os torcedores encontravam-se nos bondes ou nos ónibus, sem um matar o outro. Hoje, se não tomar cuidado, ou amanhece num hospital todo arrebentado ou no necrotério, esperando para ser enterrado.
E, falando em velórios, vamos tentar comparar estas horas de angústia e tristeza.
Nos bons tempos, não existiam velórios públicos. Os falecidos eram velados em suas casas ou em residências de parentes ou amigos. Naquela época, amigo era para estas coisas. Hoje, não sei!
Estas horas, apesar de tétricas, aconteciam com o maior respeito ao morto e à família. Os motoristas que não participavam do cortejo esperavam, educadamente, que ele passasse. Nas calçadas, as pessoas benziam-se, enquanto os homens, reverentemente, tiravam o chapéu.
Atualmente, coitados dos falecidos! Ficam em velórios públicos ao lado de outras dez ou vinte famílias que se acotovelam entre risos e choros, querendo saber do que morreu o infeliz da sala vizinha.
Quando chega a madrugada, muitas famílias fecham a porta do recinto onde seu ente querido espera para ser sepultado e vão dormir em suas casas, ou matar a fome em uma pizzaria, pois ninguém é de ferro.
O enterro, principalmente aqui em São Paulo, participa do caos do trànsito. A maioria se perde e muitos desistem de ir ao cemitério. Os pedestres nem percebem que está passado um cortejo fúnebre. Os motoristas, a grande maioria sem a mínima educação, buzinam para o enterro seguir mais rápido e assim xingam o infeliz, ou feliz, falecido!
É querer chover no molhado comparar o respeito que os homens tinham pelas mulheres. Vivas, é claro! Não precisava ser esposa, mãe, irmã, parenta ou vizinha. Todas eram dignas de respeito e admiração. Principalmente nos bondes, em que os cavalheiros cediam seus lugares às damas. Não importava a idade. Andando nas calçadas, namorados ou simplesmente casais de amigos nunca deixavam as mulheres caminharem do lado da rua. Elas deveriam ficar sempre do lado das paredes.
Mas veio o feminismo e acabou com este comportamento. Nos dias de hoje, salvem-se quem puder1
Até pouco tempo atrás, eu me surpreendia ao entrar num táxi em que a motorista, para o meu espanto, era uma mulher. De aeromoças tornaram-se comandantes de aviões. Diretoras de empresas. Juízas e promotoras públicas. Juízas de futebol. Governadoras e primeiras ministras. Motoristas de jamantas. E as profissionais da chamada vida fácil dividem a prostituição com garotos de programas. Quem diria?
A simples comparação destes fatos é, na certa, pecado mortal.
E se formos comparar tudo o que aconteceu nestes últimos 66 anos por mim vividos, em que participei, inclusive, da virada do século XX para o XXI, precisaríamos de umas dez mil páginas iguais a estas. Não daria certo! Os queridos leitores com certeza me comparariam a um pseudo-escritor e me achariam o mais chato do mundo!


Roberto Stavale
Janeiro de 2007
Direitos Autorais Reservados®

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