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Cronicas-->DO QUARTO ESCURO AO FEIO VíCIO -- 17/01/2007 - 00:22 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

DO QUARTO ESCURO AO FEIO VíCIO



O feio vício não é o onanismo como o leitor pode estar pensando. Esse, só é possível no despontar da adolescência. O feio vício do menino é outro.
Hoje, sim, tem certeza de sua segunda recordação da infància: o quarto escuro. Escuridão que apavora a criança, especialmente quando já vai rompendo a barreira do inconsciente, entra de mansinho para o conhecimento prático e já desenvolve leves tintas da razão. Antes não vê com olhos abertos, só olha para dentro de si, agarrando-se aos sonhos e fantasias. Vive ainda a escuridão. Mas, lentamente o espírito vai se apossando dele através de finíssimas réstias de luz.
Naquela noite, algo novo lhe fazia susto. Lembrança curta, não pode arrancar da cabeça se já havia nascido sua irmã Mariinha. Não consegue. Eram dois: ele e Teresinha, sua primeira irmã. Os pais conferenciavam durante o dia sobre vários assuntos. Aquele, não. A irmã dormiu. Ele estava apreensivo, preocupado, nervoso, prevendo que algo de inusitado ia acontecer. E não fechou os olhos.
Aonde o pai e a mãe iam? Por que não os levavam?
À novena do Coração de Maria, no Alto, distante uma légua ou mais. Tudo em redor da casa era mato ralo: capoeira, porém mato. Catingueiras, marmeleiros, urtiga, cansanção, favela, palmatória, macambira e alguns pés de pau-ferro. Em outubro, cinzento de calor e de coivaras, a folhagem toda caíra, virando estrume para os canteiros do plantio de alho e cebola do ano vindouro. O caminho estreito se afunilava, mesmo durante o dia. À noite era breu.
Quando julgavam que os filhos estivessem dormindo - porque Teresa já estava - fecharam a porta do quarto à chave e levaram-na consigo. Quando Chico sentiu a derrota porque ouvira a zoadinha da chave saindo da fechadura, abriu o berreiro.
- Cale a boca menino! Se acordar sua irmã, vai levar uma surra.
Passou a chorar baixinho, mas correndo lágrimas de verdade, de medo.
- Não me faça eu voltar e abrir esta porta, não é Zefa?
Em muitas ocasiões ela não se metia. E quando o fazia, era pra confirmar: um "sim" inaudível, nada convincente.
Desta vez, que facada sentiu:
- «Obedeça a seu pai, fique quietinho que daqui a pouco o sono chega.»
De foram ouviam morrendo de soluços.
Medo não mata menino, logo esquece o motivo. Criança é forte, está crescendo, tem como se defender. Chorou -tadinho! - até chegarem de volta. Dormiu e sonhou chorando. Vários pesadelos.
Daí nunca mais o medo o deixou. Pior ainda: levou-o ao vício maldito, que a mãe arrenegava e o pai, que não era de xingamente, termina levando ao exagero. Surras de chibata quando o pegava com a mão na massa.
Que vício?
Sim, ao vício de comer barro molhado. Barro da parede. Ele ia, aos pouquinhos, comendo a própria casa, que já era tão pequena.
Da primeira vez, pegado pela mãe - «é um vício feio, meu filho, Deus não quer», - prometeu-lhe que nunca mais faria aquela besteira.
Fez muitas vezes. E pegou sovas de chinela e chibata que ardiam como fogo. Além da desobediência, o vício: - dois pecados enormes.
Dois pesadelos.
Apesar de tudo, ia crescendo. E aqui já separava os sonhos dormindo dos sonhos acordados. Mas, um dia, eis que lhe aparece o diabo.
O primo que tinha o mesmo nome seu, filho da tia Rosa, adaptou à sua cabeça uns chifres velhos tirados de um boi morto. E, sem ninguém esperar, apareceu por trás da cerca do quintal da casa, no Curral Novo, fez-lhe umas mungangas e disse com voz mudada:
- Eu sou o diabo, vim te buscar.
Tomou um susto. Quase cai da cadeira. Mas abre bem os olhos e termina por reconhecer a roupa e os chinelos do maldito. Ficou bem quietinho no alpendre - que também servia de sala-de-estar - rindo por dentro de sua maluquice. Só não ria alto porque ele era maior e, na realidade, tinha medo que lhe batesse.
Fosse porque o pai lhe trouxera um remedinho da botica, num vidro, fosse porque a mãe rezava nas novenas, ou por causa da brincadeira de seu primo, o Chico de tia Rosa, o certo é que dentro de pouco tempo, deixa o vício para nunca mais.
Enjoara dos castigos e de cagar tanta lombriga.












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