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Cronicas-->AS DUAS FLORES UNIDAS -- 11/01/2007 - 17:20 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AS DUAS FLORES UNIDAS

Francisco Miguel de Moura*

Eram as "duas flores unidas" do verso de Castro Alves.
O dia amanhecera bom, sem chuva, um solzinho gostoso que trazia claridade à beleza do jardim: a delícia da vida das abelhas, das borboletas e de outros insetos mais humildes. As duas moças, já refeitas, bem vestidas como naquele tempo as damas ainda se vestiam, acabavam de completar o jardim. Ou elas seriam a parte principal deles? Não tinha como desejar-lhes o que ficara de fora: um pouco de perna, um pouco de braços. Porém as mãos e o rosto enfeitado pelos longos cabelos, sobre os quais pousava linda flor, faceiramente, não havia como comparar o que mais agradava.
Nem por longe do menino passara qualquer traço de sexualidade, diante de tanto aroma, E que dizer da visão? Edênica! Sua fase dos oito a nove anos. A mamãe viera visitar a família, matar a solidão da ausência o velho. A amizade da família de Socorro e Lurdinha era nova e correspondia às expectativas, embora não se visitassem constantemente. Mas esta era a primeira vez, a do deslumbramento do menino. Simpatizou mais com a morena, Socorro, mas seria desagradável pensar nisto, naquela hora. A ambas, em gestos e olhares, ele demonstrava agrado, ainda sem saber o que fazer. Os beijos da chegada não foram correspondidos, talvez levemente apenas na saída. Já os abraços, bem os abraços são a melhor prova de amizade, é quando os corpos se encontram e juntam as batidas do coração.
A lembrança é distante e não pode nem garantir que os nomes das meninas eram aqueles. Mas logo ao avistar a casa onde moravam, elas aguando as flores, distraídas, cantando, ficou tonto, abismado. Flores no jardim a encherem a vista, flor nos cabelos das duas flores, flores na janela, nas mesas da sala de visita, no altar dos santos...
A casa era em cima de um alto, tempo de inverno, tudo verde.
De ponta a ponta estendeu o olhar ao vale que acompanhava o rio e gostou, e guardou na memória como paisagem que lhe volta em sonhos, de vez em quando, para alimentar-se.
Encantadoras, duas princesas! - disse o primeiro olhar.
Viveu um outro céu que não conhecia. Lembrava de há poucos dias, subindo o morro com Francelina, sozinhos, conversando, em segredo, coisas de crianças que já tentavam alcançar o horizonte do amor. Tão bom! E revivia.
Por pior que tenha sido, não se deve reclamar da infància, é sempre gostoso recordar mesmo das lembranças ruins. O tempo se encarrega de adoçá-las no coração de quem tem um mínimo de sentimento e poesia. O menino era um grande romàntico, sentimental e lírico, tolo no sentir, acanhado no falar, medroso no agir.
Quase tudo de antes eram nuvens. O mundo começava a existir.
Bem poderia ter lançado sobre elas, um punhado de flores, de beijos e abraços na saída, mesmo que em palavras. Que pena, não o fez!
Recebido com festa, filho de quem era - D. Zefinha e Mestre Miguel - o menino não ouviu uma só vez palavras de desagrado como as da tia Rosa:
- Zefa, tire este menino feio de minha vista.
Durante aquele encantamento não podia estar feio nem ouvir tal palavra. Falaram que era loirinho como o pai. Justo, porque a mãe era morena, mais do que Socorro, despachada no falar e no rir. Lurdinha, contida, parecia estar contente, e estava, a seu modo.
Quanto ao resto do dia, só me lembra que já tinha passado a hora do café. Foram convidados a esperar pelo almoço. Pobre almoço em espécies, mas rico em amabilidades: "Sente, aqui." "Gosta de ovos fritos?" Um picadinho de carne seca?"Depois, até o fim da tarde, foi assentar nas redes, balançar, conversar assuntos que ao menino não interessavam. O que não queria era sair.
Levaram flores. Que mais poderiam, se nada tinham?
A mãe, chegando a casa, enfeitou tudo: oratório, janelas, santos e ainda sobrou para as vizinhas. O nome das flores? Não o apertem. Sabe de poucas: rosa, margarida, bogari, jasmim, boa-noite, bom-dia... Bogari: cheiro tão forte ainda lhe entra pelas narinas quando visita um jardim. Rosas: vermelhas, brancas, amarelas, róseas...
Nada sabe o menino. Apenas indaga: Porque não voltaram muitas vezes àquela casa. Não lembra sequer se voltaram. Quando se viram novamente, foi noutro lugar e noutra casa onde moravam os pais de Lurdinha e Socorro e lhe pareceu que a mais branca, Lurdinha, estava triste. Alguma doença? O menino sentiu pena da sua conversa com a mamãe, porém teve vergonha de perguntar. Socorro era a mesma em sorrisos, porém não tão largos como antes.
Que pena, meu Deus! Por que nada foi como no primeiro dia? Flores com flores, flores como flores, no tapete do chão, no tapete do ar, abertas, cheirando e abrasando. Algo estava errado.
E o menino chorou como na primeira vez, na despedida. Com sentimentos bem diferentes: contentamento, emoção, antes. Agora, pena, um peso danado por não saber perguntar. Nem ajudar.
¬- "Só esta crónica de lembranças não vale quero sonhar como se estivesse vivendo aquele" - o menino disse a si mesmo.
E muitas vezes depois sonhou de verdade, acordando em soluços porque sua infància tinha ido embora, para nunca mais.
_____________________
*Francisco Miguel de Moura é escritor, mora no Brasil (Teresina-PI) e tem e-mail: franciscomigueldemoura@superig.com.br
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