Desde aquele domingo trágico, que tento imaginar o seu sofrimento e arranjar alguma palavra que lhe sirva como consolo para perda de JOTA.
Estava almoçando quando tive a notícia. Como sempre as tragédias da família me deixam anestesiado até dez, quinze dias depois. Talvez tem herdado isso de papai, que em toda minha vida nunca o vi chorar, salvo um mês antes de falecer quando ao entrar no quarto ele abriu os olhos e verteram duas lágrimas. Não sei se por dor ou se me reconheceu. O medico que estava ao lado estranhou o aumento das batidas do coração.Aproximei-me e alisei os seus cabelos e aos poucos as batidas foram diminuindo.
Hoje depois do oitavo dia do seu falecimento, continuo sentindo como se fosse um sonho. Ainda estou anestesiado. Talvez por egoísmo ainda não me considero órfão. Diante de seu sofrimento, pedi a Deus que o levasse. Ele me atendeu e à s vezes fico com remorso pelo meu pedido.
Quando estou deprimido costumo comparar os meus problemas com os dos outros. Não sei o que é perder um filho e não sei o que é ainda o que é perder o pai. Na minha imaginação parece ser como se o sentimento tivesse fome e não tivesse nada para comer. É como se a vida fosse apenas ausência e falta. A lógica no entanto me diz que não é nada disso. Sofrimento, dor e saudade, talvez sejam a definição mais próxima. Mas, o que dizer a um tio que perde seu filho moço com toda vida pela frente? Qual a palavra certa ou a forma de ajudá-lo na conformação da perda? Minha religiosidade e minha fé não têm a dimensão da de papai nem da do senhor. Ao ver seu sofrimento procuro em toda minha imaginação encontrar algo que possa fazer para minorar a sua dor. O ano que se finda foi o pior da sua vida. Perdeu seu filho, seu irmão e também meu pai. Só perdas? Por que? Não posso reclamar a Deus, porque sou um filho rebelde e pecador. Posso, no entanto pedir a ele que encontre um meio de lhe trazer a aceitação. Posso pedir a papai e ao próprio Jota que lhe ensine como se conformar. Já pedi. O senhor também deve ter pedido. Seu semblante, no entanto nos faz crer que a resposta ainda não veio. Quando o sentimento dói, talvez só uma dor maior nos proporcione o consolo e a conformação. A dor sentimental é imaterial, não tem remédio específico, e ninguém jamais conseguirá cura-la.
Hoje quando estava remoendo para escrever algumas palavras a respeito de papai, vi seis nuvens em forma de abóbada. As duas primeiras eram grandes. A segunda e a terceira eram do mesmo tamanho. A terceira e a quarta eram iguais as duas primeiras. Lentamente vi as duas últimas se distanciarem do grupo e aos poucos se dissiparam no céu. O grupo restante foi se unindo e formou um só grupo. Pensei em nós. Jota e papai foram para imensidão do céu. Deixou um grupo unido. O senhor, Zélia, Mónica e Daniel. Como nossa família é muito unida, talvez a única coisa que possa contornar o sentimento da dor seja continuarmos unidos, sofrendo juntos, chorando juntos e sorrindo juntos, até que a última nuvem desapareça.
È tudo que eu posso falar. Feliz ano novo Tio João. Feliz ano novo Zélia. Feliz ano novo Mónica. Feliz ano novo Daniel. Feliz ano novo Jota. Feliz ano novo papai.
Mauro
29/12/2006
