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Contos-->Um japonês, o Joãozinho -- 01/11/2010 - 19:00 (josé paulo pereira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Um japonês, o Joãozinho

Às vezes paro para me lembrar do pessoal do vestibular. Vestibular era uma comunidade de jovens interessados em entrar numa Universidade.Gente de todos os lugares, com sonhos, naturalmente, mas um sonho irresponsável, pois pareciam estar felizes naquela comunidade não demonstrando haver uma preocupação do tamanho que a situação merecia. Ou, talvez, cada um achando que seu lugar era garantido.
Eu, um pouco mais pretensioso, achava que o meu grupo estaria garantido, porque tínhamos um bom preparo e éramos tidos pelos demais como os sabichões. Sabíamos resolver todos os problemas de física do Instituto Eletrotécnico de Itajubá.
Eu não estava muito errado, pois muitos de nosso grupo tiveram sucesso e hoje estão em suas cidades, provocando em mim essa saudade danada. Embora saiba onde estão, pouca chance tenho de visitá-los.
Do Joãozinho nunca mais tive notícias. Era um japonês de Mogi das Cruzes e se chamava Isamo Nogima.Por qualquer razão um colega do grupo o chamou de Joãozinho e assim ficou batizado. Duvido que os outros colegas se lembrem de seu nome, mas o apelido traz boas recordações a todos.
Sempre risonho. Ria mesmo sem ouvir piada. Ria de tudo.
Seu porte físico era engraçado: bem baixinho, magro, com pernas curtas e a cabeça grande. Cabelo de japonês: abundante, bem liso caído na testa, embora sempre engomado com Gumex.
Carregava uma mala grande, nova e bonita, de couro, o fecho com segredo. Era pesada, pois trazia sempre muitos livros. Às vezes o Joãozinho a carregava grudada no peito, principalmente ao atravessar a ruas, o que fazia apressado, olhando seguidas vezes para ambos os lados.Atravessava correndo, não se importando se se adiantasse do grupo, ficando pacientemente esperando na outra margem.
É que o Joãozinho já tinha sido atropelado muitas vezes. Não só atropelado, mas já tinha se acidentado com carroça, bicicleta, carro de boi, a cavalo...Uma vez um trem descarrilou quando ele viajava de Mogi das Cruzes a São Paulo.Não havia um acidente de rua no qual o Joãozinho não tivesse participado. E ele repetia suas histórias com um sorriso nos lábios, sempre iniciando com a expressão:- Sabe como éééé...(um é comprido, ondulante, melodioso). Afirmava tomar cuidado para evitar novas ocorrências.
Uma vez, no Largo do Machado, num sábado à noite, tínhamos que atravessar a rua. Um bonde, vindo da zona sul parou no ponto para a descida dos passageiros e o Joãozinho iniciou sua manobra de atravessamento de rua, postando-se atrás para olhar atentamente para os lados.A manobra de olhar para os lados foi demorada e o condutor engrenou marcha-a -ré com o intuito de entrar na garagem que era ali, ao lado do cine São Luiz.Claro que o atropelou, caindo, esbaforido, pálido, com o cuidado de não deixar cair a bolsa dos braços. Por ser o bonde um veículo lento, não houve maiores conseqüências.Mas, só faltava ter sido atropelado por um bonde!
Nas semanas seguintes era aquela gozação que o Joãozinho recebia com paciência, sempre tentando explicar com aquele:- Sabe como eéé?
Como tudo lhe acontecia, se houvesse um fato inusitado seria ele o escolhido: presenciou um suicídio.Passando em frente ao Edifício Serrador, na Senador Dantas, calmo e tranqüilo, carregando sua mala de couro, ouviu um grito horroroso. Olhando para cima, viu um corpo caindo e estatelando-se na marquise do prédio. O Joãozinho ia ao curso Gallotti para a aula de inglês que era ministrada no sábado pela manhã. Chegou branco, trêmulo, assustado, inquieto, tendo sido acalmado pelos colegas com um copo de água.
Acho que aquele grito está zunindo até hoje no ouvido do Joãozinho.
Decidiu não assistir aula naquele dia. Preferiu relaxar um pouco, divertir-se para apagar aquela cena assustadora.No dia seguinte, um domingo, faria um programa diferente. Iria a um circo, divertir-se com os palhaços.
O leitor dessa crônica já deve estar imaginando o que aconteceu. Sim, foi naquele circo que pegou fogo, em Niterói, o Gran Circo Americano, com muitos mortos, uma verdadeira tragédia, de onde saiu um personagem conhecido no Rio de Janeiro, o Gentileza, que perdera toda a família no incêndio. Por muitos anos o Gentileza andava pela Presidente Vargas, vestido de profeta, com os cabelos compridos e uma tábua nas mãos, ensinando boas maneiras.
Nunca mais soube do Joãozinho. Ele não passou naquele vestibular.Tenho perguntado por ele a todo cidadão de Mogi das Cruzes que eu encontro.
Espero que pelo seu Know-How de escapar de acidentes, ainda esteja vivo.
Com certeza está vivo na memória daquele grupo, pois foi uma figura adorável e inesquecível.



Paulo Pereira
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