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Contos-->Um marcante ponto, que virou conto, da minha vida. -- 25/09/2010 - 11:51 (Juliana Mendes Velludo Guidi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
18/09/2010

Hoje ela faria trinta e três anos.
Menina era, cheia de vida... Tinha uma força e uma disposição invejáveis.
Éramos inseparáveis!
Lembranças fiéis me acompanharam durante esses quase onze anos. Ela era um tanto moleque, eu sempre fui feminina, mas nos respeitávamos e construíamos, a cada dia, uma amizade transparente.
Quando crianças ainda, apertávamos campainhas e saíamos correndo para não sermos flagradas. Um pouco mais tarde, cortávamos nossa cidade inteira para passar diante das casas dos nossos paquerinhas. Íamos, sem preocupações ou compromissos, ao clube todos os dias à tarde. Saíamos com meus pais para jantar todos os sábados. Vivíamos uma na casa da outra. Na minha, ela brincava com meu irmão caçula e para ele fazia gemada(mania da minha mãe) com tanta alegria que fazia ficar mais gostoso o tal fortificante.
Na casa dela fazíamos batata frita, falávamos dos meninos bonitos, por um deles, um dia, fomos surpreendidas... e ríamos da nossa meninice.
Éramos inseparáveis.
O tempo se adiantou, crescemos, começamos a namorar. Eles também eram amigos, nos conhecemos no mesmo dia e lugar. Os namoros duraram e nós continuamos inseparáveis.
Saíamos os quatro, jogávamos War até tarde da noite, fazíamos palhaçadas... e ríamos da nossa juventude.
Um pouco menos meninas começamos a trabalhar, eu onde estou até hoje, ela em uma escola da nossa cidade.
Trocávamos letras de cantigas de roda para agradar os nossos pequenos. Como ela amava seus alunos e por eles era amada!
O Rafael ela pegou para si. Até posou para o álbum de infância do garoto.
É impressionante como minha memória não me trai quando o assunto é ela!
Vi as fotos que fez com o Rafa e lembro-me de uma me chamar a atenção. Nessa ela estava sozinha, sorrindo, segurando a aba do boné que usava. Era um sorriso de sol!
Linda minha amiga!
Seu relacionamento com esse aluno era fraternal. Sempre carinhosa e moleca, fez que o Rafa a ela se apegasse. Como eles brincavam! Eram duas crianças.
Voltando ao namoro, aos namoros, nós terminamos com os dois amigos, não no mesmo dia, seria demais, não é? Mas, coincidentemente, no mesmo ano.
E nós continuamos inseparáveis.
Saíamos para as baladas, dormíamos às 06h00 da manhã e, por incrível que pareça, eu acordava com ela, ou ao telefone ou em cima de mim, às 9h00! Queria esganá-la!
Não perdia tempo, era impaciente, agitada... parece que sabia...
Novas amizades surgiram, nos distanciamos um pouco, mas sempre nos falávamos.
Na quarta-feira anterior ao acidente, eu sonhei com a ausência dela. Sonhei que percorria sua casa, onde só ouvia a voz de sua mãe dizendo: "Filha, oferece fruta para a Juliana".
Eu vi a fruteira sobre a pia da cozinha. Não sei o que isso quer dizer, mas ficou gravado em mim.
Domingo, 21/11/1999, recebi a estúpida notícia da sua morte. Notícia gigantesca que não coube em mim. Lembro ter saído caminhando tonta e lentamente, com um véu de lágrimas que me impedia enxergar. Apoiava-me nas cadeiras do clube onde eu estava e, nesse instante, ouvi um rapaz dizendo: "quem magoou o coração da morena?"
A vida.
A morte.
A morte dela na minha vida.
Eu não conseguia digerir a informação. Eu precisava de constantes confirmações.
E elas vieram impiedosas.
No carro que me levava para a nossa cidade eu ouvia o casal dizer que o corpo chegaria às 14h00.
Minha amiga, um corpo. Era verdade!
As ruas desertas, silenciosas, cinzas como o céu, diziam-me: é verdade.
Amigos chorando também confirmavam o que eu não queria aceitar.
Mas a pior e irrefutável confirmação foram suas mãos. Seu rosto estava diferente, mas as mãos... eram dela.
Fiquei desesperada diante dessa covardia. Minha amiga estava sem vida naquela sala fria! Era verdade!
As lembranças de tudo o que vivemos juntas despencavam-se sobre mim.
Como doeu ver seus alunos entrando para homenageá-la.
Ver o Rafa passar as mãos desconsoladamente na cabeça... Como doeu!
Os dias seguiram-se cinzas. Minha vida estava cinza.
Na quarta-feira posterior à sua morte, eu sonhei com ela. Caminhávamos por uma rua, que fora por nós muito caminhada na nossa meninice e juventude. Falávamos de sua partida, ela me dizia que estava perdida e pedia a minha ajuda, nos demos as mãos e eu procurei acalmá-la. Chegando ao fim dessa rua, ela entrou em uma casa, mas, antes de desaparecer, voltou o lado esquerdo do seu rosto e sorriu discretamente para mim. Nesse momento, saiu uma estranha mulher gritando: "meu Deus, eu não sei rezar, por favor me ajude".
Acordei assustada, passei o dia pensando nisso. À noite, eu resolvi assistir a um filme, Cidade dos Anjos, que ela adorava e eu nunca tinha visto, inclusive ela ouvia a música-tema desse filme na hora do acidente. Logo no início há uma mulher segurando a filha, que queima em febre, desesperada ela diz mais ou menos isto: "meu Deus, eu não sei rezar, por favor me ajude".
Não sei o que isso quer dizer, mas ficou gravado em mim.
De uma coisa eu tenho certeza: ela veio me procurar, não só nesse, como em outros sonhos que com ela eu tive durante muito tempo, com frequência. Hoje ela vem menos, mas ainda vem. Acho que por causa da nossa ligação. Éramos inseparáveis.
Um dia a mãe dela me ligou para que fôssemos juntas ver a foto que ela escolheu para o túmulo.
Era ela, sorrindo um sorriso de sol, segurando a aba do boné que usava.
Linda minha amiga Millena Cristina Kroll.

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