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Contos-->Na chuva, na rua, na cidade -- 12/09/2010 - 19:09 (Alfredo Domingos Faria da Costa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Na chuva, na rua, na cidade

Chove! Chove!
Trânsito parado. Pouca gasolina no carro. Desligo o motor. Torno a ligar em função do ar-condicionado.
O almoço não agradou. Não comi quase nada. Estou com fome!
Tinha na carteira um dinheiro que foi distribuído para pagamentos. O mensageiro não regressou com o troco. Estou liso!
Que fazer? Rezar! Rezei tantas ave-marias e tantos pais-nossos.
Bueiros entupidos. Ruas alagadas. Vento forte. Árvores curvadas.
Vontade de fazer xixi. Saia justa! Solução: abrir a porta e fazer assim mesmo, de guarda-chuva em punho. Não aguentava mais. Alívio! Não olhei para canto nenhum. Vexame!
As motos passam raspando, fazendo equilibrismo, mas avançam. Seus pilotos dão o jeito certo.
Os guardas estão na área. Conseguem muito pouco. Apitam na tentativa de controlar o incontrolável.
Vejo os ônibus bloqueando os cruzamentos. Formam barreiras intransponíveis!
Os vidros fechados ficam opacos pela diferença de temperatura. Anuviados. As pessoas estão tão próximas e tão isoladas. Não se vê quem está ao lado. Curioso! Triste!
Aparece um vendedor de biscoito. Que bom! Não tenho dinheiro, lembrei-me. Que chato!
Ando e paro. Ando e paro.
Chove! Chove!
Terei sorte se a água não invadir o carro. Isola! “Pé de pato, mangalô, três vezes”! Falta um pedaço de madeira pra bater.
O rádio é mestre em dar má notícia. Pelo que se ouve, é melhor não se mexer. Todos os caminhos estão inacessíveis. Ao sair, tomar qual direção?
Estando o ar-condicionado ligado, consumo mais gasolina. Desligo. Abro o vidro. A chuva entra. Deixo dois dedos abertos.
Penso em outras coisas pra distrair. Não adianta - agonia!
Risca a água um ciclista. Que inveja! Ele dispensou o abrigo. Todo molhado vai assoviando. Tá nem aí.
Pego um papel. É o meu refúgio e terapia. Ao menos tenho papel e lápis, ainda que com ponta rombuda. Escrever libera, dá asas. Começo a contar esta história. Sou o protagonista, fazer o quê?! Saio do trágico para tirar algum proveito.
São mais de duas horas de espera, quase sem deslocamento.
Alguém bate no vidro da porta do carona. É um outro motorista querendo um cigarro. Respondo que não tenho; não fumo. O homem está ansioso. Ele diz que me viu urinando. Pergunta se estou bem. Agradeço. Solidariedade! Indago se há algo para comer. Não, não tem.
Volto à escrita.
Toca o celular. Minha mulher quer saber onde estou. Explico o “drama”. Ela aconselha a ter calma. OK!
Outra pessoa chega. Quer trocar ideias. Falamos da situação. Lamúrias. Acabo sabendo que mora na minha rua. Coincidência. O seu carro está atrás do meu. Viu quando me aliviei. Mais um! Confabulamos sobre o melhor trajeto a tomar. Será que há?
Rezo! Lembro da oração da Santa Cruz de Jesus Cristo. Lanço mão da religiosidade de novo. Recebo conforto.
Uma ambulância anuncia a presença com a sirene desenfreada. Quem vai ali dentro está pior que eu. No rastro, conseguimos evoluir um pouco. Os “espertos” vão no vácuo. Encosto à esquerda. Ufa! Estava há muito para conseguir me posicionar melhor, tendo em vista os passos futuros.
Chove!
Desce a noite. Tá do barulho!
Toca o celular. A voz de idosa pergunta se já estou chegando. Constato o engano. A ligação não é para mim. É uma avó aflita.
Se estivesse viva, minha mãe já teria telefonado. Era hábito, bastando ameaçar chuva, preocupar-se com a família. Queria saber da segurança de cada um. Saudade!
- Estou bem, mãe! Como dá pra estar.
Começo a andar mais. Abre-se uma brecha até o viaduto. Que bom! Evoluo.
Agora, consigo entrar à esquerda. Estou me safando. Encontro um caminho mais ou menos livre. Nem acredito! Parece a história bíblica - as águas dando passagem.
Preciso de gasolina. No posto de abastecimento, que fica perto, tem lanchonete, banheiro e combustível, é claro! Tudo que eu quero no momento.
Quase nada disso eu encontro! A lanchonete faliu e o banheiro está em obras. Muito bom, né?! Ao menos, tem gasolina. Negocio colocar um valor maior no cartão de crédito, para ter uma sobra de modo a comer alguma coisa.
Estaciono o carro. O local no posto é seguro. Saio para esticar as pernas e descansar a coluna combalida.
Três horas já passaram.
A chuva começa a dar trégua. Está diminuindo.
A lente esquerda dos óculos cai no chão. Beleza! Recomponho o equipamento. Nesta altura não me abalo mais. Literalmente, estou na chuva pra me molhar.
Chega ao local, transtornado, um entregador de pizza. Relata aflito que na chuva a moto derrapou e caiu. A mercadoria ficou uma miséria. Considera-se enredado no prejuízo e resolveu oferecer aquilo que conseguiu salvar. Havia “restos” de quatro queijos e de calabresa. Não me fiz de rogado. Compareci à distribuição. Nestas horas de escassez, o que cai na rede é peixe!
Com parte da fome saciada e as ruas um pouco liberadas, arrisco-me a deixar o porto seguro e a tentar prosseguir para casa.
Estou conseguindo ultrapassar os alagamentos, os buracos, os carros enguiçados, os semáforos desligados, as árvores derrubadas e demais obstáculos. Pobre cidade!
Enfim, entro na minha garagem.
Com a cabeça organizada, depois do banho, estabeleço, pra mim mesmo, quesitos para estar preparado nas próximas situações semelhantes: completar o tanque do carro quando estiver a meio; manter uma comidinha guardada, nem que seja uma mariola; ter dinheiro reservado; deixar o celular carregado; e adotar, como filho, um guarda-chuva. Reflito: quanto ao aperto para ir ao banheiro, a prevenção é praticamente impossível, ficará por conta da criatividade, na ocasião.
Mas, uma última coisa me instiga: para completar, o nirvana seria transitar com um carro anfíbio que conseguisse, também, limpar o que viesse pela frente. Afinal, no verão carioca estamos completamente sujeitos a chuvas e trovoadas.
Alfredo Domingos Faria da Costa



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