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cronicas-->A comadre do meu tio -- 24/08/2006 - 08:17 (Jader Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A comadre do meu tio

Meu tio Benê sempre foi um cara legal. À sua maneira trabalhava bem, porém devagar, no cartório da Vila de Água Doce. Nos fins de semana quentes do interior, meu tio Benê nos levava para tomar banho de rio. O Juca, meu pai, não gostava muito daqueles banhos, achava que um banho por semana tomado na quarta feira já era o suficiente. Mas a boa lábia do tio Benê convencia a ele de que o banho era saudável e necessário. E lá íamos nós em bando na direção do Rio Preto pra tomar banho pelado. Era uma festa a vigência daqueles banhos. A fundura e a largura do rio eram ideais e seguras, não corríamos nenhum perigo naquelas águas sem correnteza, ainda mais que estávamos sob a proteção segura do tio. À sombra ondulante dos ingazeiros, ora flutuávamos ora mergulhávamos na água fria, deliciosa e fugitiva. Detalhes desta história contarei depois.
Certa manhã a tia Conceição chegou na minha casa apavorada e, com olhos esbugalhados, veio dizer que o tio Benê estava falando coisas sem nexo. Segundo a descrição dela, o homem parecia estar "tomado por algum espírito", gesticulava e emitia um som parecido com "gró, gró, gró, gró". Resumindo, o tio Benê tinha sofrido um derrame e foi levado ao hospital de Mantena, onde passou vários dias. Depois de um tempo foi devolvido semiparalítico à sua velha casa da Vila de Água Doce. Adeus banho de rio. Por ser a casa do tio Benê estreita e comprida, acharam que seria melhor para ele ficar no quarto dos fundos, que era mais silencioso. E lá ficou jogado e esquecido por todos. De vez em quando dava um grito solicitando algum tipo de ajuda, algum medicamento, água, ou outra coisa qualquer da sua precisão.
Uma comadre do tio Benê, a quem os amigos chamavam de Poisé, só ficou sabendo da doença dele vários meses depois e decidiu vir de surpresa fazer-lhe uma visita. Chegou e foi entrando. Até então ninguém sabia que o tio Benê gostava tanto da comadre Poisé.
Foi só ela botar os pés dentro da sala que ele começou a berrar lá do seu quarto: "Comadre!... Comadre!... Tragam a comadre para mim!..." O pessoal se apressou em levar a comadre Poisé até ao quarto. Ali, tio Benê continuava berrando sem parar: "Comadre!...Comadre!... Tragam a minha comadre!..."
A comadre Poisé entrou no quarto sorrindo, toda feliz, mas logo precisou recolher o sorriso. Tio Benê estava nervoso, furioso mesmo. O que ele queria com urgência era outra coisa: "Não é esta porcaria de comadre que eu quero... eu quero é a comadre de mijar!..."


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