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Artigos-->A Ira feminina -- 16/01/2003 - 09:06 (Sandra Moreira Ebisawa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Sinto-me dentro de um caldeirão, sendo cozinhada através dos tempos, com os ingredientes do “pecado original” - a culpa da decadência humana é minha, a força poderosa que amedronta, a que destrói ou fortalece, sou eu. A responsabilidade de resignificar essa história, descobrindo sua essência bem dentro de mim, é minha também. Sou Mulher.

Perceber a “crueldade feminina” diante do sofrimento imposto à mulher através da história de nossa gênese enquanto seres humanos, é tarefa hercúlea. Requer ponderação, busco dentro de mim, os primórdios do meu próprio sofrimento, para entender e dar à luz a verdadeira redenção feminina, que eu tanto necessito para simplesmente ser.

Acredito ser esse o grande sofrimento da alma feminina: não conseguir simplesmente ser. Tantas mulheres morreram pela culpa, pelo veredicto que se impôs a elas na história. Mártires e sacrificadas somos nós até hoje...A civilização sempre contradisse o verdadeiro anseio feminino. O anseio de libertação, de continente para a alma feminina.

Para mim este tem sido um exercício de auto-conhecimento, de redenção, um tipo de purgatório. Sentar-me aqui e escrever sobre minha crueldade comigo mesma, não é confortável. Mas me parece fundamental que esse estado seja trazido à consciência, a fim de que eu possa utilizá-lo. É como uma cozinheira que não poderá alquimizar os alimentos sem saber como lidar com o fogo.

O que sinto tudo isso como um parto. Algo dentro de mim está se desenvolvendo, um tipo de consciência que antes não estava aqui. Esse incomodo permanente que até agora não tinha um nome, já está em mim há muito tempo. Tantos erros já foram cometidos, ciclos internos atropelados, gritos velados e mudos ecoam ainda dentro de mim. Meus homens e meus filhos já sofreram demais com esse desvario. E ainda assim, sou eu a responsável. Preciso parir, dar à luz, emergir e libertar a Lilith amaldiçoada de dentro de minhas células.

A primeira crueldade que a culpa gera, é a submissão de minha força natural às leis de dominação, de aperfeiçoamento da natureza (como se isso fosse possível).

Fui eu quem neguei à Adão a doce ilusão de sua supremacia, fui eu quem nos igualou e fui banida, me transformando num demônio. Fui a culpada pela nossa expulsão do paraíso. Como posso ser íntegra e feliz com toda essa carga sobre meus ombros?

Esse banimento me remete a Lilith, ela está aqui entre nós, dentro de nós e precisa ser rendida. Precisamos dessa redenção. Estamos banidas de nossa “Terra”, de nosso verdadeiro lugar no mundo. Fomos condenadas e até hoje, mesmo com todas as conquistas, continuamos excluídas e amaldiçoadas.

As vezes tenho a impressão de que toda essa “conquista feminina” foi orquestrada pelas forças “poderosas” que determinaram o próprio banimento da mulher. Posso até estar sofrendo de paranóia, o que seria mais do que compreensível, mas o que percebo no processo de emancipação da mulher, é uma aliança entre a mulher e o homem para fortalecer o império contra a alma feminina. Que me perdoem os entendidos, mas creio que posso devanear, já que as informações oficiais podem ser duvidosas. Me causa estranheza que o feminismo tenha surgido ao mesmo tempo em que a industria farmacêutica lança seu mais poderoso produto no mercado: a pílula anticoncepcional. As mulheres passaram a contar com o apoio da ciência para não conceber. Não precisaram mais estar atentas aos seus ciclos naturais se quisessem evitar filhos, seus homens estão eternamente desobrigados da responsabilidade com a fertilização, já que passaram a prescindir até de preservativos, não precisam mais conhecer os ciclos femininos. Um verdadeiro incentivo a negligência masculina ao que é essencialmente feminino, e isso com o apoio do movimento de “libertação da Mulher”. Que desatino! Na minha opinião este foi o maior crime contra a alma feminina. Quantas consequências desastrosas não surgiram dessa “conquista”? Ao utilizar a pílula e levantar a bandeira da liberdade sexual, gerações inteiras de mulheres passaram a enviar mensagens a seus cérebros de que não havia necessidade de produzirem determinado hormônio, para 40/50 anos depois, na menopausa, precisarem repor os mesmos hormônios artificialmente. Quanto lucro para essas indústrias! Um planejamento de negócio digno de admiração, não fosse essa a principal arma contra a mulher, representante mais significativa da alma feminina na humanidade.

Nesse momento da história, nós agimos exatamente como Lilith, nos privando da força natural feminina e utilizando essa mesma força contra nós mesmas. Hoje nos vemos distanciadas de nossos ciclos naturais, nos perdemos quando as sensações da energia feminina emergem em nosso corpo. Nos perturbamos com a menstruação, com a menopausa, com nossa potência orgástica. Não sabemos mais como parir ou amamentar sem o apoio da ciência, que passou a ser um selo de qualidade em tudo que nós fazemos e sentimos. Ciência à serviço da industria, que está a serviço da dominação da terra, do território, da alma feminina.

A ira feminina voltou-se contra nossos próprios corpos, desejávamos o sentimento de pertencer e para isso nos aliamos ao patriarcado, reproduzindo seu modelo...seu modus vivendi.

Em nossos corações sabemos que a ira feminina está presente em nossos atos e pensamentos. Sempre que nos sentimos culpadas por não conseguir estar com nossos filhos, por não conseguir entregar um trabalho no prazo ou mesmo por não corresponder aos desejos “sexuais” de nossos parceiro, estamos experimentando a ira feminina atuando em nós. Ela se manifesta através de nossas frustrações pessoais, profissionais e sociais. Ela se manifesta nos cânceres de mamas, de ovários, de útero. A ira feminina se expressa também através dos maremotos, terremotos e dilúvios, numa desesperada tentativa da Terra para proteger-se. Tantas são suas manifestações e tão grande o seu poder.



Procurando uma explicação satisfatória para o fato da mulher atual estar infartando tanto quanto os homens, encontrei o seguinte ao pesquisar a palavra infarto, num “Aurélio” da vida:



Infarto: área de necrose conseqüente à baixa de teor de oxigênio; enfarte.

Enfarte: ato ou efeito de enfartar, fartação; empanzinamento.



Isso me sugeriu a asfixia que a alma feminina experimenta atualmente. Com seu corpo pedindo socorro! Precisando ardentemente ser regido por sua própria natureza! Uma analogia à Mãe Terra e suas terríveis manifestações em resposta à negligência a seus ciclos e suas necessidades.



Um dia desses uma criança me perguntou como Adão pode ter sido a primeira criatura se não existia a mãe dele. Como ele poderia ter nascido? Foi aí que, tentando lhe responder, me lembrei de uma conversa que tive com uma amiga, chegamos a conclusão que o homem foi feito do pó, do barro, da terra, símbolo do feminino, onde Deus (céu, masculino) soprou e criou a existência humana. Do alto de seus 9 anos, ela fez uma carinha iluminada e disse: Agora sim, eu entendi mais ou menos. Pois acho que eu também estou começando a entender mais ou menos.

Porém, uma coisa eu já começo a entender com clareza: é vital que nossa essência seja resgatada e que a partilha entre as mulheres seja estimulada, se quisermos ter uma representação autêntica da Alma feminina em nosso mundo. Só assim nossos filhos não serão mais “roubados” para se tornarem os prisioneiros, guardiões do portal invisível que nos separa de nós mesmas e nos mantém banidas.



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