CAMINHANTE
Caminhante. É isso que ele é. Nenhuma outra palavra seria apropriada. Corpo curto, barrigudo, pernas e braços desproporcionalmente longos. A cabeçorra imensa parece uma abóbora mal formada, careca e cheia de protuberàncias. Os olhos vazios de qualquer brilho ou interesse, fixados no chão à sua frente, ignoram o mundo à sua volta. Os braços soltos, caídos, quase nada acompanham o balanço do corpo. Os pés, voltados para o lado interno das pernas, seguem em passo cadenciado, martelado, seco, indiferentes e inflexíveis como os saltos do ponteiro de um relógio. O andar é mareado como o de quem pisa na terra após longo tempo no mar e, igual ao dos bêbados, perde o equilíbrio e a noção das distàncias. Mas caminha, sempre caminhante, como quem sabe o rumo; e retorna algum tempo depois, naquela chatice de ir meio sem destino e ter de voltar. Não inclina a cabeça ou dirige o olhar em cumprimento a ninguém. Outro dia, um cachorro desgostou do seu jeito e avançou sobre ele. Ele parou por instante, encarou o bicho e rosnou. O cachorro saiu ganindo, assustado.
Em seu desengonço de pinguim solitário, o caminhante é feio e esquisito. Não sei se é feio porque é esquisito ou se é esquisito porque é feio. Mas, quem é esse caminhante, afinal? Seria uma metáfora real? Ou uma realidade metafórica? Sei lá! Parece coisa de doido.
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