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Contos-->PROFUNDAS CICATRIZES -- 28/08/2009 - 14:49 (Maria de Lurdes Mattos Dantas Barbosa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Elas andavam pelas ruas, de forma provocante, roupas de cores berrantes, lábios vermelhos sensuais...Eu as via passar e observava o desprezo de todos os que com elas cruzavam, mesmo os homens casados que as usavam na zona chamada corrente, pois segundo boatos, era lá que elas acorrentavam os homens. Ali eles as despiam, comiam suas carnes, se lambuzavam, gastavam dinheiro, riam, arrotavam, peidavam... Elas eram simplesmente objetos do prazer carnal, bestial,
putas, personas non gratas na sociedade local.
O lugar era uma cidadezinha do interior, produtora de café, milho e feijão. O dinheiro corria à solta e os grandes fazendeiros faziam festas no cabaré de Santinha, a cafetina mais bonita e cruel daquelas bandas, na Chapada Diamantina, estado da Bahia.
Carla havia chegado ali com os peitos ainda pequenos. Não sabia direito o que estava fazendo naquele lugar. Fora levada pelo seu padrinho de batismo, após ter sido estuprada pelo padrasto, cabra safado, que jurara matá-la caso revelasse o hediondo ato! O padrinho, ao tomar conhecimento do fato, arranjou uma desculpa para vender a menina para o cabaré de Santinha, alegando não ter para onde levá-la, pois sua mulher era muito ciumenta; com certeza não iria aceitá-la. Pobre menina! Triste destino! Nesta nova vida, durante o dia era obrigada a fazer os serviços domésticos, mas, com o passar do tempo, os fregueses começaram a assediar a menina de apenas treze anos. Pagavam uma boa grana pelo prazer quase único de saborear aquele corpo ainda em formação e pleno frescor da juventude. Sua carne jovem parecia dilacerada... Dolorida!... Ardida!...E enquanto tomava o banho de pedra-ume e ervas (banho de assento) para manter as partes íntimas bem apertadas, relembrava com dor no peito, os banhos de cachoeira, as brincadeiras de bonecas. Onde estaria agora a sua boneca de pano?

Dormia sempre com ela! E a mãe, o que estaria pensando? Será que iria procurá-la? Acabou chegando a conclusão de que a mãe jamais abandonaria o conforto a que estava habituada, o status de mulher casada, embora dependente financeira e afetivamente do marido, para sair em busca da filha já não mais querida pelo padrasto e, além disto, encontrava-se em segurança na casa do padrinho. Lembrava da brincadeira de esconde - esconde, do circo, da escolinha onde havia terminado o curso primário; dos colegas e missa aos domingos. Agora era uma perdida. Nada mais teria, a não ser o dinheiro, fruto da difícil e penosa vida de prostituta-mirim, embora os hipócritas daquela sociedade a julgassem de vida fácil. Devaneava enquanto se banhava...E as lágrimas tórridas escorriam-lhe pelo rosto. Os soluços sufocados pelo branco lençol revelavam a pureza dos seus sonhos de menina-moça, rudemente quebrados pelas circunstâncias tão comuns à vida de tantas garotas que, como ela, vivem sob o jugo de um padrasto pernicioso.
Os gemidos e ais vindos dos quartos vizinhos (Ela se safara naquela noite por estar com suspeita de infecção urinária) eram terríveis para os seus ouvidos, às vezes achava que as colegas exageravam nas preliminares e, durante o ato sexual, faziam um verdadeiro carnaval!
Chorara muito naquela noite. Certamente seria castigada no dia seguinte, pois seus olhos intumescidos a impossibilitariam de exercer a função, causando prejuízo à suposta Madrinha.
Pelas ruas ninguém jamais poderia imaginar tamanho sofrimento! O andar; o vestir; o olhar; tudo era calculado, ensaiado para atrair cada vez mais clientes. Até completar a maioridade, Carla era tida como afilhada da dona do cabaré, por isso seus fregueses eram pessoas privilegiadas, geralmente autoridades que faziam vista grossa à prostituição de menores, fato muito comum nos cabarés do interior. Em troca do silêncio, Santinha oferecia-lhes as carnes mais tenras.
O que sabia da vida? Indagava-se. Não conhecia nenhuma outra cidade, era ignorante, só tinha o curso primário, o que faria? Não mais ia à escola; agora freqüentava a escola da vida, a qual ensinava-lhe tudo sobre excitar os homens e fazê-los gastar dinheiro todo dia!
Ensinaram-lhe a fumar e a beber, mas geralmente fingia, assim como encenava o momento do êxtase de tal forma que o freguês, lisonjeado, sempre voltava, para esse fim possuía mestria. Era o oficio que lhe exigia tamanho sacrifício e diplomacia.
Iniciou adolescentes com sabedoria, com eles se divertia, mas teve também de agüentar velhos, bêbados de hálitos podres e carnes fétidas, obcecados por desejos bestiais, parecendo querer arrancar-lhe a alma.
Já não mais era uma criança...Mas sim, uma Mulher experiente, com o coração cheio de esperanças de um dia poder mudar de vida; aliás, esse era o seu grande sonho secreto, com ninguém dividia, pois não confiava naquela gente que, embora a tratasse bem, aquele lugar não era verdadeiramente o seu ambiente, a sua definitiva moradia.
Finalmente conseguiu fugir para a cidade de Salvador. Juntara dinheiro o bastante. Agora sim, seria uma mulher decente. Mas trabalhar em quê? Nada sabia! Então pensou que na capital o trabalho de prostituta teria mais Status, mais dinheiro, não era como brega de interior cujos homens, em sua maioria, eram sujos de poeira e calor do sertão. Mandou para longe esse pensamento. Não cederia à tentação! Alugara um pequeno apartamento bem no centro da cidade, queria conhecer o movimento, sentir a sensação de liberdade, independência e de fazer o que bem entendesse, experimentar o doce sabor da liberdade! Que alegria!... Depois de tantos anos!...
Fez compras, andou por restaurantes e cinemas e, principalmente riu, riu muito. Riu dela mesma, ria da vida, da Santinha, do padrasto, do padrinho, da mãinha! Agora não mais cabaré, não mais banhos forçados para apertar o tiché (ditado popular); só o puro desejo de ser mulher livre, dona
do seu corpo. Só o daria doravante a quem a merecesse. Esse era seu primeiro pensamento na capital da Bahia. Andando sozinha, um certo dia, pela praia de Itapoan, conheceu uma bela jovem de nome Camila, de classe média, universitária à procura de companhia. Conversaram bastante, mas Carla nada revelou sobre seu passado. Camila, no entanto, muito naturalmente segredou-lhe, mostrando-lhe um cartão, que procurava jovens bonitas para programas com amigos e turistas, principalmente do exterior. Embora vislumbrasse neste convite a possibilidade de ganhar bastante dinheiro, não só recusou o convite, a priori, com fez-se ofendida.
Com o passar do tempo as coisas foram ficando difíceis, pois não encontrara emprego. Lembrou-se do cartão de Camila e acabou fazendo programas. Ficaram muito amigas. O sonho de Carla, porém, de ter uma vida decente, continuava, pois algo, no âmago do seu ser, clamava por transformação. Perguntava-se desesperadamente: mudar?... Como?...Vivia em conflito consigo mesma; um lado percebendo esta vida de prostituta como única possibilidade de sobrevivência; o outro, todavia, alfinetando sua consciência, cobrando-lhe coragem para romper com os laços do passado. Embora desejasse ardentemente, não era fácil para quem não tinha aprendido outra profissão na vida. Chovia torrencialmente aquela noite, e num ímpeto de loucura, após muitas reflexões e lembranças da infância, adolescência e o tormento que as lembranças lhe infligiam, saiu à rua em meio a trovões e relâmpagos, como se quisesse lavar o corpo e a alma, através dos pingos da chuva. A claridade dos raios fazia sua silhueta parecer sinistra, e a roupa preta colada ao corpo esguio e branco parecia de fato alma do outro mundo! Correu sem rumo. Exaurida pelo cansaço, caiu desmaiada, vindo a ser atropelada por um carro.

Acordou totalmente atordoada e confusa em um hospital. Dois belos olhos a fitavam.
- Sente-se bem senhorita? Respondeu com a cabeça, num gesto afirmativo.
Meu nome é Lancellote, sou inglês, e o responsável pelo acidente que a vitimou.
Mas não se preocupe, farei tudo o que for necessário para reparar o mal que lhe causei.
Carla ainda não entendia direito o ocorrido. Fosse como fosse, aquele homem era diferente, bonito, educado, ficou a olhá-lo e a dizer em seu íntimo: Bendito acidente!
Camila a procurava por todos os lugares, tinha mil planos para os dias de festa que antecedem o carnaval, quando muitos turistas endinheirados vêm para a Bahia. Precisaria encontrar a parceira de programas, continuaria a procurá-la; talvez tivesse viajado com algum ricaço em algum cruzeiro...Não tardaria a voltar, certamente. Lancellote ficara impressionado com a beleza da jovem acidentada e, embora percebesse a linguagem simples, algo lhe dizia que aquela moça era especial. Carla permaneceu um mês no hospital, pois havia quebrado algumas costelas e fraturado o pé. Passou por cirurgias e a convalescença era lenta, o que ela achou ótimo, pois assim poderia desfrutar da companhia do inglês, cujos cuidados e visitas diários, com flores, bombons, livros e uma boa conversa sobre os costumes dos ingleses e dos brasileiros, proporcionava uma deliciosa aproximação. Muitas diferenças encontraram! Riram muito das histórias que ambos contavam e, nem de longe, Lance, como ela passou a chamá-lo, desconfiava do triste passado da tão afável senhorita...
A convivência diária tornou inevitável o envolvimento amoroso. Foram momentos de grande ternura, gentilezas e por que não dizer de amor?Ao obter alta, Carla resolveu ir para o hotel desfrutar o pouco tempo que restava antes da partida de Lance para o seu país.
Foram noites inesquecíveis! Finalmente Carla conhecera o amor e a face prazerosa do sexo feito com desejo, com verdade, com sentimento...
Ele percebia a sua pouca instrução, mas admirava o seu jeito simples e compreendia a ingenuidade daquela jovem vinda do interior à procura de emprego na capital. Afugentou os pensamentos e procurou viver os momentos sem muita especulação.
Certa noite, Lancelotte resolveu contar-lhe que seus negócios no Brasil tinham se concretizado. Era hora, portanto, de voltar. Carla ficou em silêncio, afinal não o conhecia profundamente nem se deu a conhecer. Quiseram sim, viver o presente de todas as formas possíveis, aproveitando todo o tempo disponível. Não haveria, portanto, adeus convencional. Quando chegasse a hora ele iria embora de mansinho e só restariam as lembranças dos momentos vividos, estranhamente proporcionados pelo destino.
Carla fitou bem os seus olhos, acariciou-lhe o cabelo, beijou-lhe a boca e o conduziu ao leito. Fizeram um ritual de amor. Cada palmo do corpo foi, tocado, sentido, beijado e acariciado numa linguagem muda dos amantes que simboliza um adeus silencioso. Estava doendo muito para ambos, mas os seus mundos eram diferentes, eles tinham plena consciência disso. Ele se foi silenciosamente. Dela? Só sabia o nome. Dele? Só lhe bastara o amor.
Os anos se passaram.Carla foi embora para Lençóis, cidade turística do interior. Fez o curso supletivo, conseguindo assim, terminar o segundo grau. Arrumou um emprego de recepcionista no melhor hotel da cidade, fez um cursinho básico de inglês, francês e espanhol para poder recepcionar os hóspedes. Morava num pequeno apartamento no próprio hotel onde trabalhava. No momento era tudo o que realmente precisava para recomeçar a vida. Mudara de nome e pintara o cabelo, agora se chamava Lisa. Um nome que sempre quisera ter. Sua vida transcorria sem novidades, mas estava em paz.
A cidade de Lençóis, situada na Chapada Diamantina, á 410 km de Salvador da capital baiana, é o principal pólo turístico da região. O lugar ideal para quem quer viver uma vida cheia de novidades, curtir a natureza e desfrutar de suas belezas naturais. Carla ficara extasiada com a beleza do lugar e, com a ajuda de um antigo freguês, o qual tornara-se seu amigo e confidente, decidiu mudar-se para a afrodisíaca e histórica cidade dos diamantes, buscando, pudesse através de um emprego decente e de um novo nome, ser. de fato. uma nova mulher. As cicatrizes embora ainda abertas, doíam muito menos agora. Pensava ela.
Lancellote, no entanto, durante todos aqueles anos não conseguira esquecer a brasileira. A lembrança dos momentos vividos, os beijos quentes, os passeios de mãos dadas pela praia,
a paradinha na barraca da baiana nos finais de tarde, para o deguste do gostoso acarajé, causava-lhe saudades. Deu risada ao se lembrar da dor de barriga que sentira a primeira vez que comera acarajé, mas depois de acostumado com o azeite, ficou adepto da iguaria. Recordava-se do aconchego em baixo dos lençóis, do dengo, do chamego...Coisas que não estava acostumado a vivenciar com Jennifer, sua companheira de dez anos de convivência!
Após longa e profunda reflexão, decidira romper com aquela desgastada relação. Resolvera voltar ao Brasil em férias e, desta vez, sem compromissos de trabalho. Teria, portanto, mais tempo para procurar Carla. Como encontrá-la? Afinal, não tinham combinado nada para o futuro e dela quase nada sabia. Voltou ao hotel onde os dois haviam se hospedado, mas não sabiam dela. Passou dias freqüentando os lugares conhecidos pelos dois amantes na tentativa de repentinamente encontra-la. Infelizmente não obteve sucesso.
Ao ler, distraidamente um jornal num restaurante de comida natural, no bairro da Pituba, um cartaz chamou-lhe a atenção: A propaganda de um Festival de Inverno, na cidade de Lençóis. O que realmente o intrigou, foi a foto de uma moça ruiva ao lado de um belo rapaz. A jovem parecia-se com a sua Carla, embora ela não fosse ruiva, e sim loira de olhos verdes. Olhou aquela foto demoradamente, tentando encontrar semelhanças entre as duas moças, a da foto e a sua amada.
Ao chegar ao hotel, procurou informar-se melhor sobre a cidade de Lençóis e o referido Festival de Inverno. Na internet, encontrou informações mais completas. Interessou-se pela História da cidade e, ao tomar conhecimento de que a esta era tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, decidiu conhecê-la. Seria esta uma oportunidade de conferir a impressão que a garota do cartaz lhe causara. De certo a viagem valeria à pena!
Encantou-se com a paisagem da Chapada Diamantina e a cidade pareceu-lhe ainda mais simpática. Hospedou-se no melhor hotel. Com muita excitação ficou a pensar na ruivinha do cartaz e como faria para encontrá-la. Qual não foi sua surpresa ao deparar-se com a recepcionista! Incrível! Era ela, a garota do cartaz! Ficou perplexo, não conseguia articular sequer uma palavra.
- Está tudo bem, senhor? - Não podia ser ela! Não o havia reconhecido! Será que estava tão velho assim? E aquela voz tão educada e aqueles gestos tão comedidos? Carla era meio espalhafatosa e tinha uma voz meio estridente...
Resolveu então investigar e passou a sondá-la de longe. Será que tinha alguém, algum namorado, família?
Naquela noite saiu para conhecer melhor a cidade. Observou as ruas, os traçados arquitetônicos e os calçamentos feitos com pedras da própria região. O movimento de pessoas era enorme.Turistas de várias partes do Brasil e de outros países; música por todos os lados; gente de todas as cores; de vários idiomas; muita alegria; muita luz! O cenário era perfeito para um reencontro de amor! Mas onde encontrá-la?
Ao retornar ao hotel, teve enfim a certeza de que aquela moça, embora meio transformada, mais bela, era sim, a Carla; o olhar mais cuidadoso e perscrutador, fê-lo perceber naquele delicado pescoço, a correntinha com suas iniciais, presente que havia lhe dado, pouco antes da sua partida. Mas... porque o nome de Liza então? E porque não o reconhecera?
Lancellote resolveu usar uma estratégia. Durante uma semana, mandou-lhe flores anonimamente e observava seu comportamento buscando sinais de perturbação. Entretanto apenas percebeu que estava mais ansiosa, nada mais, além disso. No final da semana escreveu-lhe marcando um encontro dizendo ser seu admirador, prometendo-lhe uma surpresa. Junto com as flores enviou uma correntinha com suas iniciais, igual a que ela usava no pescoço. O choque foi tamanho! Alguém estava tentando brincar com ela, sim só podia ser aquilo, algum cliente certamente que a havia reconhecido e queria desmascará-la! Tremeu muito. E se fosse realmente o Lancellote? E se, por acaso, o destino tivesse lhe armando mais uma das suas armadilhas? Quantas perguntas sem respostas...
Resolveu não comparecer ao encontro. Não poderia se arriscar, logo agora que tinha conseguido realizar o sonho de sua vida, aparecia um fantasma querendo tudo estragar. Lance, após longa espera, resolveu ligar. Carla andava agitadamente de um lado para outro. Tomara duas doses de wisque e estava extremamente nervosa: quem seria o homem que estava a esperá-la? O telefone tocou insistentemente, até que ela resolveu atender e muito timidamente...
-Alô?
- Como vai senhorita?
Como por um milagre, Carla reconheceu aquela voz e todo o passado veio à tona. Sim, era ele, Lance! Sentiu o mundo girar à sua volta, caindo pesadamente.
-Alô? Alô?...
Pressentindo algo errado, Lancellote dirigiu como louco para o hotel, e correu para o pequeno apartamento com a cumplicidade de um funcionário, encontrou-a caída, inerte... o telefone pendurado. Após ser atendida pelo médico e ainda meio atordoada, viu aqueles belos olhos a fitar-lhe e dizer-lhe:
- Tudo bem senhorita? Ou devo dizer senhora? - Mas... Era o senhor do hotel! O mesmo que lhe fixou profundamente o olhar, dias antes.
- Sim. Estou bem! - falou entrecortando a fala.
-Eu sei que mudei um pouco a aparência, afinal, muito tempo se passou e ainda tenho oito anos a mais que você. Mas... Não me reconhecer!?!...
- Na verdade, evito qualquer contato mais íntimo com os hóspedes. É política do hotel. Também mudei, mais ainda sou senhorita.
Fez-se um profundo silêncio. Os olhares se encontraram; as mãos se buscaram; as bocas se encontraram; os corpos se aproximaram trocando milhares de afagos, beijos... Permitiram, em fim, que a paixão, há muito silenciada, explodisse numa erupção erótica de prazer, dominando suas reservas, possibilitando uma entrega total!
-Voltei para buscá-la, não consegui esquecê-la! Você, mulher brasileira, é muitos especial, despertam-nos um calor diferente, jamais experimentado, difícil esquecer. Além disso, eu te amo Carla, ou devo dizer, Liza?
-Lance muitas coisas aconteceram, tenho um passado que não me deixa ser tão verdadeira como gostaria...
-Psiu! – disse ele tocando-lhe os lábios com os dedos - Não quero saber. Encontrei você e não vou perdê-la novamente. Você é senhorita, e eu, um senhor solteiro. Quer casar comigo?
Os dias que se seguiram em Lençóis foram maravilhosos, muitos passeios, banhos de rio,
caminhadas, shows, festas e muito, muito amor!
Lancellote ficara impressionado com a voz da cantora brasileira Elza Soares e dançou para valer durante a sua apresentação!
Carla pediu demissão do emprego e, de volta a Salvador, preparou os papéis para o casamento. Apos a cerimônia muito simples, foram para a Inglaterra onde recomeçaria a vida, como a mulher de um empresário inglês. Também lá se casaram.
Carla, vez por outra, lembrava-se ainda do padrinho, da madrinha, do padrasto, daquela vidinha de menina -meretriz no sertão da Bahia, e dos banhos de pedra-ume... Obrigatórios!
Cicatrizes que mesmo o tempo não permitiam apagar. Certos fatos são inesquecíveis, marcas na alma que nos fazem valorizar o presente, sonhar com o futuro, através das lições do passado. Concluiu, desse modo, que é preciso correr atrás de um sonho e por ele viver! A felicidade é uma conquista! Não sabia o que aconteceria se e no dia em que seu marido descobrisse a verdade.
Para que perder tempo com tais preocupações? Somente o futuro interessa, o amor nos aproximou, não será um passado morto que irá nos separar.
- Carla amor, breve voltaremos ao Brasil, iremos a negócios, aproveitaremos para irmos a Lençóis, o nosso paradisíaco lugar... Ela era agora o braço direito do marido, trabalhava muito e gostava de viajar. Sabia que teria, no entanto, de viver sempre com receio de ser reconhecida. Alguém poderia jogar-lhe na cara a sua origem de pobre menina de cabaré!
-Sim querido, voltar a Lençóis será como retornar às minhas raízes, e reviver o nosso reencontro.
Que o fantasma do passado seja exorcizado. Oxalá!







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