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Contos-->O Primeiro Wittgenstein Passou a Tarde no Escritório -- 23/06/2009 - 11:47 (Luis Lagarto) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O PRIMEIRO WITTGENSTEIN PASSOU A TARDE NO ESCRITÓRIO

[Luis Lagarto]



Antero era um funcionário comum daquela renomada empresa, lotado em um departamento que, se não era de alto escalão, também não deixava de prestar serviços considerados fundamentais. Com um histórico impecável, no tocante à pontualidade e presença em momentos de grande necessidade, notório por jamais questionar as funções que lhe eram atribuídas, ele compensava com uma aparência de estabilidade e segurança qualquer falta de maior expressividade que se poderia conferir à sua performance profissional.

Seu salário era mediano, e os benefícios bastavam-lhe para a vida de homem solteiro: sua quitinete no centro da cidade era bem mobiliada e, naquela tarde mesmo, aguardava a instalação da tv a cabo. Não tinha carro por não saber dirigir.

Antero era um homem discreto, apagado, até, diria-se. Pouco ou nada se sabia de sua vida pessoal. Certa vez correu um boato de que estava para casar-se, mas que, a dois dias da cerimônia, a noiva fugiu para o interior com um primo. Dela, claro, pois Antero não tinha família: mãe já falecida, pai desconhecido, e um irmão que mudou-se para a Turquia, numa dessas voltas que dá a vida. Em seu último aniversário, quando completou quarenta e dois anos, ofereceu aos colegas um bolo de chocolate delicioso, preparado por ele mesmo, e cuja receita ele havia baixado da internet. Solícito, compartilhou-a com as colegas interessadas e até mesmo com um dos rapazes, que, espantado com a facilidade de preparo, viu ali uma excelente oportunidade de surpreender a namorada que reclamava mimos no Dia dos Namorados que se aproximava.

Ele não sorria muito. Na verdade, à boca pequena, esse era o combustível para mais de uma anedota maldosa. Quando apertava os lábios à guisa de sorrir, parecia na verdade estar fazendo uma careta de dor, e nunca Antero foi visto com os dentes à mostra. Questionavam-se, os amigos menos sinceros, quanto à existência de seus dentes da frente.

Aquela era uma tarde de segunda-feira bastante fria, eis que se iniciava um inverno como não se tinha visto nos últimos dez anos. Era um momento do ano que Antero via com bons olhos, já que as pessoas pareciam-lhe melhor vestidas, sem tantas cores a brigar por atenção, e ele sentia-se algo mais integrado.

Atrás de sua mesa velha de mogno, sobre a qual um microcomputador razoavelmente moderno era o único objeto a inscrever aquele ambiente no século XXI, sentado em uma gasta cadeira giratória de couro preto, Antero trabalhava lento e absorto no recálculo de uma série de planilhas quando alguém espirrou e quebrou sua concentração, trazendo-o de volta à si mesmo como quem acorda de um sono profundo.

Olhou intrigadíssimo para os colegas de trabalho, como quem os vê pela primeira vez. Em voz baixa, fez acompanhar sua passagem de olhos pela sala pelo murmurar do nome de cada um: Eugênia, Vera, Ricardo, Jefferson, Almeida, Ana Lúcia, Dona Glete, Epaminondas e Dr. Sevedo. Em seguida contou todos os equipamentos: doze mesas, oito microcomputadores, duas impressoras a jato de tinta, uma máquina de escrever, uma máquina de fax, um armário de aço e dois de madeira, uma estante e um tapete carcomido na recepção. Fez projeções: quatorze mil e oitocentas folhas de papel sulfite branco tamanho A4, vinte e seis réguas de plástico, cinco borrachas, quinze lápis preto número dois, dez canetas esferográficas de cada cor (vermelha, azul e preta). Por fim, olhou por longos segundos para a lâmpada queimada que deveria iluminar o canto norte do departamento.

Seu grito, se é que se pode assim definir o som alto e gutural com o qual ele implodiu o silêncio mortiço que até então imperava, sobressaltou a todos. Dona Glete sentiu palpitações, e enquanto Ricardo se pôs a abaná-la, Dr. Sevedo saiu de sua sala para ver o que acontecia e alguns foram até Antero, pensando que ele fora acometido de algum mal-estar súbito. Mas não: Almeida e Ana Lúcia mal chegaram a dois metros de sua mesa, quando o homem, com um olhar injetado e irracional, avançou sobre eles como um gorila (Antero era de porte considerável), brandindo uma régua de plástico freneticamente e balbuciando ameaças incompreensíveis. Pobres coitados, os dois funcionários atônitos julgaram tratar-se de brincadeira de mal-gosto, e, com os rostos desfigurados por sorrisos nervosos, quase esgares, tentaram contemporizar. Para sua inenarrável surpresa, foram saudados com uma saraivada de clipes de metal e receberam na cabeça, cada um, uma das duas borrachas que ele tinha em seu poder.

A essas alturas a comoção já era generalizada. Jefferson, único na sala a rivalizar em altura e envergadura com Antero, e tendo a vantagem de vinte anos a menos, tentou imobilizá-lo prendendo-lhe os braços por trás. As conseqüências sobraram para a mesa da frente, que foi ao chão ao receber todo o peso do garoto, jogado por sobre ela no que parecia ser um golpe de judô inconcebivelmente ágil para o quarentão.

Dr. Sevedo, com o rosto afogueado de indignação, vociferava a altos brados para que a ordem se restabelecesse no recinto. Dona Glete, ao ouvi-lo gritar, achou por bem passar para o estágio seguinte do chilique e desmaiou nos braços de Ricardo, caindo em posição tal que dois botões de sua blusa se desfizeram e lançaram o rapaz num dilema amaríssimo, pois cabia a ele, e somente a ele, o esforço de desviar os olhos dos fartos seios da mulher que ele sabia (na verdade, todos sabiam) ser a amante de seu chefe. Ele optou por não olhar e no instante seguinte viu seus esforços morais irem por água abaixo, pois o incômodo da posição fez com que a mulher escorregasse e suas mãos se posicionassem inequivocamente onde seus olhos haviam se recusado a repousar, e isso no exato momento em que Dr. Sevedo voltava sua atenção para os dois. O homem redobrou sua indignação, agora focada naquilo que ele entendeu como uma invasão de propriedade. Esquecendo-se de anos de esforços no sentido de manter discrição, partiu para as vias de fato com o funcionário, pouco se importando, em sua investida, se a mulher desmaiada ia ao chão. Vera e Eugênia tentaram resgatá-la, mas esta última recebeu um soco perdido, e desmaiou também. A outra desesperou-se e viu-se presa de uma crise de choro convulsivo.

Do outro lado da sala, enquanto Jefferson enfrentava dores agudas para pôr-se de pé, Almeida havia decidido abandonar suas noções de ridículo e empreendia uma renhida luta de réguas, como um Errol Flynn redivivo lutando contra um mouro ensandecido. Antero revelava-se assustadoramente flexível e bem-coordenado, como se houvesse feito aquilo a vida inteira. Era impossível acertá-lo. Seus golpes, contudo, eram certeiros, e mais de um vermelhão Almeida apresentava no rosto, no pescoço e no dorso das mãos. Ana Lúcia torcia as mãos angustiada, tomada pelos mais contraditórios sentimentos, já que há tempos nutria por ambos os lutadores uma paixão platônica inconfessa, e a seus olhos era como se os dois esgrimissem pela posse definitiva de seu coração.

O único observador impassível de toda aquele espetáculo era Epaminondas, que preferiu não mover nenhum dos seus cento e trinta e oito quilos em defesa de nenhum dos contendores, ainda mais porque não entendia nada do que seus olhos estavam trazendo ao seu cérebro pouco acostumado a análises mais profundas do que quer que seja. Preocupava-lhe mais a barra de chocolate que voou da mesa destruída involuntariamente por Jefferson, já que, para pegá-la, precisaria atravessar o campo de guerra em que Dr. Sevedo e Ricardo se digladiavam. Para seu infortúnio, teve a infeliz idéia de chamar a atenção de Vera, que ainda chorava baixinho em um canto, e, por meio de gestos, pedir a ela que pegasse o doce abandonado. A mulher, tão logo lhe interpretou as prioridades, descontou nele toda a sua frustração por não poder socorrer as amigas, e voou cegamente sobre o corpanzil do colega com todos os dentes e unhas que possuía.

A metros dali, Almeida era finalmente derrotado, posto fora de combate por um ardil envolvendo uma chuva de canetas e lápis a título de distração e duas reguadas bem dadas em regiões de extrema sensibilidade de sua fisiologia. O sofrimento de Almeida foi tão grande que expulsou inapelavelmente a dúvida do coração de Ana Lúcia, que prostrou-se ao lado do amado definitivo em solidariedade e esperança de que quaisquer danos à integridade do moço (que ainda tinha, afinal, apenas vinte e oito anos) fossem somente temporários, uma vez que esperava muitos filhos daquele que ela a partir de então escolhera para ser seu marido.

Dois sons, contudo, em meio à balbúrdia generalizada, monopolizaram as atenções de todos. O primeiro foi o urro vitorioso do Dr. Sevedo, que, com uma direita bem aplicada, pôs a nocaute, de uma só vez, o rival e sua reputação, passando por cima da massa inerte do funcionário para tomar em seus braços Dona Glete, cuja consciência acabava de retornar. Vera, amiga íntima da mulher do chefe, não suportando a ofensa indireta, tentou usar nele suas unhas e dentes, mas um tapa apenas bastou para que seu corpo se somasse à confusão de braços e pernas que jazia no assoalho.

O outro som, que gelou a alma de todos os presentes despertos, com uma única exceção, foi um grito de horror, pois Almeida havia se acocorado em cima da barra de chocolate, tornando-a imprópria para consumo com o vai-e-vem de seus sapatos sociais de couro de antílope. Epaminondas foi o emissor do aterrorizante fenômeno acústico, diante da visão de seu objeto de desejo, em defesa do qual ostentava agora tantos arranhões e marcas de dentes, perdendo-se para todo sempre. Sobrecarregado de pesar, desfaleceu também e caiu da cadeira com um estrondo.

Antero saboreava cada segundo que se desenrolava à suas vistas como um predador que observa a caça já abatida e esvaindo-se em sangue, líquido que só faz aumentar sua expectativa pelo momento de saborear a carne ainda quente e pulsante. E o momento para ele havia chegado, embora não lhe fosse esta uma percepção consciente. Assim como fizera antes de seu rompante inicial, ele olhou seus colegas de trabalho um a um: Eugênia, desmaiada e com um olho roxo, assim como Vera, que jazia próxima a Ricardo. Jefferson ainda gemia a cada movimento, assim como Almeida, que, de cócoras ao lado de Ana Lúcia, deixava-se receber as atenções da colega que subitamente o tratava por diminutivos e não fazia mais questão de baixar a saia que insistia em galgar-lhe coxa acima. Dona Glete fazia o corpo de Epaminondas de apoio, enquanto se recompunha e fazia mil questões com os olhos para seu amante de tantos anos, o ofegante Dr. Sevedo, que depois de vencer a primeira briga corporal de sua vida, se havia reduzido a pouco mais que um homem de Neandertal, todo instinto, batendo no próprio peito como quem acaba de conquistar um território disputadíssimo.

Mais do que os sons que o antecederam, este olhar calculista e vingativo calou fundo em todos os presentes, trazendo até mesmo à consciência os que até então se encontravam em decúbito. Eram nove pares de olhos confusos, ultrajados, envergonhados, semi-cerrados, furiosos, esperançosos, inseguros, desapontados e inebriados a fitarem outro par que lhes devolvia todas estas emoções multiplicadas, distorcidas, elevadas à mais caótica potência.

Eram nove pares de mãos que aguardavam em um silêncio de morte a próxima ação daquelas duas que ainda portavam uma régua e um punhado de lápis, e subiam e desciam conforme Antero resfolegava.

Tão fixa era a atenção naqueles olhos e mãos que houve quem se assustasse quando o pé direito de Antero bateu com força no chão, e depois o esquerdo, e depois o direito de novo, numa batida que aos poucos foi se revelando ritmada, quase como uma dança.

E era mesmo uma dança, tribal, pré-histórica, mas intrincadamente coreografada, como se ele fosse uma Britney Spears das cavernas e aqueles, seu palco e platéia paleolíticos. Palma, palma, pé, braços ao ar e mãos desenhando com régua e lápis no espaço aquilo que um espírito romântico chamaria de “ancestrais símbolos que ele resgatava das profundezas de abismos milenares”. Seus olhos mesmo se poderia dizer perdidos nesses abismos, pois a impressão que se tinha era de que ele estava alheio a tudo e a todos, completamente devotado à delicada tarefa de fazer ponte entre extremos tão distantes temporalmente.

Súbito, estancou. Deixou cair régua e lápis (ao som, Dona Glete principiou a afetar nova palpitação, mas diante da indiferença dos demais, não se deu ao trabalho), dirigiu-se à sua mesa e silenciosamente organizou todos os seus pertences, como quem encerra o mais cotidiano dos expedientes. Ajeitou as roupas e o cabelo olhando-se no pequeno espelho que guardava na primeira gaveta, desligou o computador e saiu calmamente, dizendo “boa tarde e até amanhã, se D-us quiser” aos nove colegas estupefatos que mal ousavam respirar.

Foi Dr. Sevedo quem quebrou o silêncio:

-- Glete?, chamou ele, deixando de lado o “Dona”, que seria preciosismo demais para a situação.

-- Sim, Dr. Sevedo?

-- Eu quero que a Sra. redija imediatamente a carta de demissão do Sr. Antero.

Ela assim fez, mas o documento não chegou a ser utilizado. Antero nunca mais apareceu naquela empresa, não voltando nem mesmo para receber suas contas, das quais se tentou avisá-lo por telegrama, já que seu celular havia sido desativado. Retornando a comunicação por insucesso na busca do destinatário, aqueles que, dias depois, tomaram coragem para ir ao seu apartamento, o fizeram tarde demais, talvez: encontraram apenas uma placa de “vende-se” na portaria, e informação nenhuma com o porteiro, que era novo e não sabia de quem eles estavam falando. Na imobiliária descobriu-se que ele era apenas locatário, não tendo deixado qualquer pista quanto ao seu paradeiro depois de encerrado o vínculo contratual

Foram longos dias até que os colegas de trabalho conseguissem trocar curtas palavras de cunho não profissional entre si, e semanas até que o ambiente se tornasse minimamente suportável. Logicamente, nada nunca mais foi como antes. Em poucos meses Dr. Sevedo aposentou-se, antecipando-se ao inescapável efeito dos escândalos feitos públicos (amante, briga, funcionário descontrolado) e de outro que, apesar de só ter sido descoberto algum tempo depois de sua morte, ele havia passado a temer. Viajou com esposa e filha mais velha para Miami e foi substituído por ninguém menos que Epaminondas, agora sessenta quilos mais magro e totalmente pró-ativo, fadado a uma carreira verdadeiramente meteórica.

Dona Glete, sentiu-se abandonada a princípio, mas viu sua feminilidade renascer quando enfrentou e venceu Ana Lúcia na batalha pelo amor de Almeida. Sua idade mais avançada acabou sendo fator preponderante na afeição do homem que, depois de fragorosamente derrotado em tão peculiar luta de esgrima, perdeu a auto-confiança e passou a precisar de uma segunda mãe, mais do que de uma mulher atenciosa, mas excessivamente lasciva, como demonstrou ser Ana Lúcia. A mais jovem teve que contentar-se com as atenções do porteiro do prédio onde Antero morava, confirmadas desde a primeira troca de olhares. Casaram-se em questão de meses, e muitos se surpreenderam por ela ter sido conservada na empresa até o fim de sua oitava gravidez bem-sucedida.

Jefferson teve dores nas costas por algumas semanas. Levaria ainda sete anos para chegar à faixa preta do judô, arte marcial pela qual tomou súbito interesse depois do incidente ocorrido. Notabilizou-se como esportista, participando de alguns eventos onde pregava o uso da violência somente como forma de defesa. Morreu num domingo à tarde, ao escorregar no box de seu banheiro enquanto tomava banho.

Ricardo pediu demissão semanas após Dr. Sevedo, e os boatos de que tinha ido também a Miami só foram confirmados quase uma década e meia depois, por ocasião da publicação de seu terceiro livro, uma autobiografia em que assumia ter tido um caso com seu antigo chefe, àquela altura falecido há pouco mais de um ano. Vera bem que havia desconfiado do estranho ímpeto de Dr. Sevedo enquanto se atracava com Ricardo, mas, em prantos como estava naquele momento, e depois com o choque de ter confirmada a traição de sua amiga, não teve frieza o suficiente para aperceber-se da estranha proximidade que se firmou entre os recém-combatentes. Na verdade, decepcionada com as pessoas em geral, deprimiu-se, e terminou por encontrar todos os quilos que Epaminondas perdeu. Depois de chegar à beira da morte, recuperou-se, voltou à boa forma e depois deixou-se engordar de novo, após descobrir que aquela situação lhe era mais propícia ao assédio masculino. Casou-se em Foz do Iguaçu, com um descendente de árabe injustamente acusado de pertencer a uma organização terrorista.

Eugênia sumiu depois que foi descoberta sua participação, em sua juventude, em ensaios pornográficos, notícia impactante a ponto de fazer sua permanência na cidade insustentável. Rumores dão conta de que ela resolveu seguir carreira na área, primeiro gerenciando sites, e depois tornando-se diretora de filmes de entretenimento adulto, sob o pseudônimo de Eudora Storr.

Quanto a Antero... com o correr dos anos muitos passaram a nutrir dúvidas quanto à possibilidade dele ter realmente existido. Histórias fantásticas passaram a tê-lo como protagonista, e se por um lado alguns usavam seu personagem para inculcar medo em crianças mal-criadas, por outro começaram a atribuir à sua invocação curas e milagres de diversos tipos. A igreja oficial, secundada por outras, investiu pesadamente no combate a tais práticas, mas uma novela televisiva de grande sucesso baseada em um sem-número de boatos cristalizou uma pretensa biografia do ex-funcionário, desencadeando intensos debates quanto à guarda, imutabilidade e mesmo propriedade das fronteiras entre realidade e ficção.

Volta e meia questionados, os envolvidos naquela tarde fatídica guardaram pelo restante de suas vidas insondável silêncio quanto aos eventos transcorridos, tornando-se, à menor menção daquele nome que antes tão pouco significava para eles, repentinamente pensativos, distantes, como se visitados pelos destinos possíveis descartados por aquele breve instante de suspensão de julgamento – um instante em que a queda das máscaras pôs a nu suas essências e os impediu de continuar sendo humanos, no sentido hipócrita do termo.


[LL]
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