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cronicas-->Fragmentos -- 19/02/2006 - 20:53 (Renato Rossi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
No parque, a maioria das pessoas anda no sentido anti-horário. Acho errado, ir assim contra o tempo, uma rebeldia. Parece que o querem segurar. Talvez pelos bons momentos que estas caminhadas ensejam, talvez por pretensão. Naturalmente que eu sigo no sentido dos ponteiros do relógio, não sei se pela formação ortodoxa ou na esperança de não deixá-lo me alcançar, ou simplesmente aproveitando seu embalo como se fora um vento de popa.

Ocorre que ao caminhar, além de atender às prescrições médicas, aproveito para colher material para minhas modestas cronicas. Se a visão exige dotes de cartunista que não tenho, o ouvido também colhe material.

Quando as pessoas seguem no mesmo sentido, pode-se ouvir o que dizem por mais tempo e entender melhor o significado. Já com as pessoas que seguem em sentido contrário o mesmo não se dá. As pessoas passam falando e só se ouve um ou outro fragmento da conversa. Há portanto que inferir, deduzir, supor, imaginar o que será que estão falando de forma tão determinada.

Não, não me tome por fofoqueiro ou incherido. Eu não peço para ninguém falar nada e tampouco sigo as pessoas na esperança de saber o que dizem, ainda que às vezes dê uma certa vontade. Elas falam e o vento traz as palavras, geralmente incompletas. Nestes casos, o desafio é preencher as lacunas. A favor delas, minha surdez parcial, mercê das impressoras de antigamente. Mas uma frase solta permite muitas interpretações e eu escolho a que me pareça mais de acordo com as pessoas e as expressões. Contra mim ainda, minha curta memória.

É bem verdade que às vezes dá vontade de entrar na conversa e esclarecer que talvez haja um mal entendido, contar alguma passagem que possa ilustrar a discussão, ou simplesmente perguntar o que mesmo disseram ou o que ela quis dizer com certa expressão. Em Brasília ouve-se muitos regionalismos e não é difícil entender tudo às avessas.

Há de tudo. Já assisti a briga de casais, separações amigáveis, exceto pelo destino do cachorro, reconciliações, e cantadas diversas. Muitas explicações para tudo de errado que as pessoas possam fazer. Outro dia, um jovem senhor estava explicando porque era tão importante que sempre tivesse na carteira três notas de um real e uma de dois. Quando não tem a quantia assim organizada ele fica muito incomodado. A explicação eu não entendi, ele passou muito rápido.

As pessoas vão falando, não raro sozinhas mesmo. Neste caso são mais comuns as teses de doutorado, defesas orais variadas e longas argumentações sobre a necessidade de ter seu próprio espaço, o que a presença do cunhado, da diarista ou do sobrinho do interior já não permitem. Muito comum o desejo de contar a vida. Completa, com detalhes da infància triste no campo, a vinda para a cidade, a faculdade, o trabalho e o amor. Tais relatos rendem caminhadas de mais de cinco quilómetros. Há que apertar o passo pois sempre há o risco da pessoa te chamar, iniciar a narrativa e você ali, constrangido, ficar os cinco quilómetros falando "ã hà". Cuidado.

Este negócio de falar sozinho em caminhadas é um perigo. A pessoa desata a caminhar concentrado em certo assunto e vai montando uma argumentação na cabeça que acaba resvalando pela boca, sem que o vivente se dê conta. Quando nota, pára e vê que há uma roda em volta ouvindo sua dissertação. Um perigo. Muito fácil falar o que não se deve.

Grave assim, nunca me aconteceu, mas fico aqui me perguntando se não falo quando caminho só. Ou se falo muito alto.

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