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Contos-->A ARMADILHA -- 06/05/2009 - 20:27 (GIVALDO ZEFERINO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Nessa noite, Roque havia dormido na casa de uma tia e, logo cedo, teria de locomover-se até a sua casa que distava uns três quilômetros, a fim preparar-se para mais um dia de trabalho, cujo expediente começava às oito horas da manhã.
No meio do caminho, deparou-se com um grande prédio onde funcionava o Banheiro Público. Impulsivamente, para lá se dirigiu com certa curiosidade. Avançou na direção de um dos compartimentos, mas logo na entrada, verificou que estava completamente vazio - era apenas uma sala com alguns objetos de limpeza espalhados desordenadamente em seu interior. No compartimento seguinte, havia uma fileira de vasos sanitários, separados por divisórias de compensado, de onde exalava um cheiro forte e desagradável.
Mais adiante, a gerente interceptou-o quando ele passava por um corredor, próximo a um grupo de banhistas que aguardavam sua vez em um dos doze chuveiros disponíveis.
- Você parece estar um pouco desorientado, pois, há um bom tempo observo-o andando de um lado para o outro, sem decidir exatamente o que quer fazer neste lugar. Afinal, em que posso ajudá-lo?
- Um banho. Desejo tomar um banho, contudo, não disponho do material necessário.
- Evidentemente, se veio aqui com essa intenção, deveria estar municiado dos respectivos apetrechos de banho.
- Estou totalmente desarmado, disse Roque esboçando um sorriso.
- Nada se faz com sucesso, se não houver planejamento, finalizou a gerente.
A gerente percebeu que Roque estava de olho numas toalhas de banho empilhadas em um recanto e, imediatamente, o admoestou, fitando-o com certo interesse:
- Aquelas toalhas e aqueles sabonetes estão ali expostos, mas isto não significa que possam ser usados por qualquer um que se aproxime e queira deles tomar posse. São produtos de uso restrito, e não podem ser doados nem vendidos.
Roque afastou-se desapontado, enquanto a gerente acomodou-se em seu escritório.
Alguns minutos depois, levantou-se uma discussão no recinto dos banheiros por causa de um banhista que queria ultrapassar a fila, e todos começaram a bater boca contra o intruso que se defendia alegando pressa motivada por um compromisso inadiável, porém, não chegaram a nenhum acordo, visto que todos, igualmente, tinham a mesma pressa para sair daquele lugar; tinham, igualmente, compromissos urgentes e inadiáveis. A certa altura, reclamaram a presença da gerente que chegou exigindo ordem, e ameaçava fechar as torneiras, caso o tumulto continuasse.
Roque aproveitou a confusão e, sorrateiramente, apossou-se de uma das toalhas e também de um sabonete; em seguida, deu umas voltas pelo salão. Quando a gerente voltava para o escritório, Roque, discretamente, posicionou-se na fila sem que ninguém percebesse sua presença.

Era humanamente impossível comparecer ao local de trabalho no horário normal, pois só tinha vinte minutos disponíveis, e ainda precisava tomar banho, trocar de roupa, pegar o ônibus que o conduziria até lá. Isso duraria mais de meia hora, se tudo corresse bem. Na fila do banheiro havia cinco pessoas à sua frente. Se saísse para telefonar, seria pior porque perderia a vez e ninguém estaria disposto a dar-lhe uma colher de chá. Então pensou com seus botões: "assim que terminar tudo isso, falarei com o chefe e farei qualquer negócio para não perder meu dia de trabalho. Ele haverá de entender".
Ao sair do banheiro, a gerente o aguardava com os braços cruzados e olhar carrancudo, numa postura nada amigável, como antes aparecera.
Disse Roque estendendo-lhe as mãos calmamente:
- Devolvo-lhe a toalha e o sabonete que lhe tomei emprestado.
- Você, ou não entendeu o que lhe falei antes, a respeito desse material, ou me considera uma idiota - afirmou a gerente aborrecida sem dar atenção aos objetos que Roque lhe oferecia.
- Em nenhum momento, pensei coisa semelhante a seu respeito, ele contestou.
- Por que furtou isso aí?
- Eu não furtei. Estou lhe devolvendo.
Um segurança aproximou-se. Devia ter percebido algum sinal da gerente, porque já chegou encarando Roque com firmeza. Disse a gerente ao segurança:
- Este senhor precisa justificar um ato de infração; conduza-o ao almoxarife para que seja registrada a ocorrência.
O almoxarife, já inteirado do que acontecera, convidou Roque a sentar-se, e proferiu com uma voz pastosa:
- Você é acusado de ter subtraído duas peças de banho do nosso estoque. Tal atitude acarreta gravíssima infração contra o patrimônio desta Instituição. Por conseguinte, consideramo-lo nosso prisioneiro, condenado a dois anos de trabalhos forçados nesta Casa. Terá de executar a limpeza dos banheiros, distribuir o material higiênico, ajudar na lavagem dos vasos sanitários e outros serviços de apoio, acaso requisitados durante o seu turno, até que cumpra integralmente a pena.
Roque guiava os olhos arregalados ora para o chefe, ora para o segurança, tentando vislumbrar através de sua sisudez o lado cômico da sentença, uma brincadeira de mau gosto. Mas, o que se seguiu não foi bem isso.
- O que tem a dizer em sua defesa? inquiriu o almoxarife.
Roque contestou:
- Eu tenho um emprego. Combinei com meu chefe que chegaria atrasado hoje, devido a um imprevisto que ocorreu de manhã cedo, justamente após ingressar neste Banheiro Público, porque decidi, em má hora, tomar um banho aqui para fugir à rotina. Não é justo condenar-me só porque retirei duas peças necessárias a qualquer pessoa que resolva ir ao chuveiro, ainda mais, era minha intenção devolvê-las quando tudo acabasse. Tenho condições de pagar o que for exigido como fiança; por isso, rogo-lhe que me deixe livre a fim de que possa cumprir minha jornada de trabalho no escritório da empresa onde tenho muitas tarefas a realizar.
O almoxarife respondeu que não tinha poder de decisão sobre o caso e levou a proposta de Roque ao conhecimento da gerente que, por sua vez, convocou os membros da diretoria para discutirem a questão e decidirem o que fazer com o prisioneiro. Por fim, deliberaram que não haveria negociação direta com o envolvido, mas se o culpado tivesse emprego fixo, haveria uma exceção para o caso, sendo-lhe permitido constituir um advogado e aguardar em liberdade o dia do julgamento.
Já passava do meio-dia quando Roque foi liberado sob condição de não se afastar da cidade em nenhuma hipótese a fim de salvaguardar o bom andamento do processo. A primeira providência que Roque tomou nessa hora foi ligar para a repartição, mas seu chefe havia se ausentado para o almoço. Por conseguinte, tomou o rumo da empresa, disposto a adiantar algum serviço e explicar-se.
A princípio, o chefe não queria acreditar, mas, em face dos detalhes e da seriedade do narrador, chegou à conclusão de que só alguém de mente muito fértil poderia inventar uma história fantástica como aquela que acabava de ouvir. Pelo que sabia, Roque não fazia parte desse time.
- E agora? O que vai fazer para livrar-se desse embrulho? perguntou o chefe.
- Preciso de um advogado. Tenho de safar-me dessa gente maluca... Ou talvez não seja maluca, mas sim, um bando de exploradores que induzem os incautos a caírem nas suas armadilhas em benefício próprio.
- Em ambas as hipóteses, você se acha em maus lençóis. É bom que encontre mesmo um ótimo advogado para defendê-lo.
Indicaram-lhe o Doutor Silvano, um velho ranzinza, implacável defensor dos seus clientes, que tinha fama de não haver perdido nenhuma causa defendida, até então.
À noite, Roque passou um bom tempo sem dormir, pensando no episódio. O advogado aconselhou-o a manter a calma, e esperar a intimação judicial. Mas Roque não se conformava com a situação.
- Não havia razão para reagirem dessa forma. Eu teria pago o que eles quisessem, dizia Roque ao Doutor Silvano.
- O que queriam era uma vítima - travestida de infrator, é claro - para assim extorquirem alguma vantagem favorável aos seus intentos. Só nos resta aguardar os acontecimentos para podermos articular sua defesa, concluiu o advogado.


Um funcionário do Banheiro Público apareceu na empresa à procura de Roque.
- Enviaram-me aqui para confirmar suas declarações e relembrá-lo de que não deverá afastar-se da cidade, em hipótese nenhuma, a fim de salvaguardar o bom andamento do processo.
E retirou-se do local, dando por encerrada a entrevista. Roque deteve-o por um instante; queria saber quando seria iniciada a abertura do inquérito.
- Isso levará algum tempo... Mas não se enerve. Haveremos de nos ver mais vezes durante esse intervalo.
Na semana seguinte, ele retornou.
- A que devo a honra desta nova visita? indagou Roque.
- Rotina profissional. Ordenam-me, obedeço.
E repetiu as recomendações de não se afastar da cidade. Dessa forma, todas as semanas, Roque recebia aquela incômoda visita, mas depois da quinta semana, acharam por bem vistoriá-lo de mês em mês.
Até que, um dia, Roque exasperou-se e resolveu voltar ao Banheiro Público. No compartimento dos sanitários distinguiu um rapaz de uns dezoito anos, com um balde e uma esponja, que limpava os vasos sob a vigilância de um funcionário. Nervosamente, esfregava as peças, enquanto fitava, vez por outra, o fiscal que não o perdia de vista, e emitia ordens para apressar o serviço, vez que, precisava fiscalizar outros setores. Ainda havia a seção dos banheiros que o garoto teria de limpar. Roque afastou-se e prosseguiu observando os demais componentes do prédio. A gerente não se encontrava em seu escritório; os demais empregados, entretidos com suas tarefas, não perceberam a presença de Roque que retornou ao local onde o rapaz limpava os vasos sanitários. O fiscal havia se retirado, e ele pôde ficar a sós com o garoto.
- Quanto você ganha por esse trabalho?
- Nada.
- E por que você...
- Eles me pegaram. Passei por aqui e decidi tomar um banho. Como não tinha com que me enxugar, molhei o piso, na saída. Daí obrigaram-me a fazer esse tipo de serviço duas vezes por semana durante dois meses.
- E por que você não foge?
- Não posso. Sabem onde moro, e ameaçaram bater-me se eu não viesse.
Ao passar pelo escritório da gerente, Roque sentiu grande impacto quando percebeu uma moldura com seu retrato, dependurada na parede. Entrou e se pôs a observá-lo estarrecido.
A gerente acabava de chegar.
- Mandei meu funcionário fotografá-lo para não esquecer sua fisionomia. Você não parecia uma pessoa comum quando ingressou neste estabelecimento. Jamais imaginei estar lidando com um delinquente.
- Como supõe que eu seja um delinquente?
- Você infringiu uma norma, portanto, praticou um ato ilegal.
- E a fotografia na parede. O que isto significa?
- É para nunca mais esquecê-lo, já disse. Servirá de referência para os demais infratores. Até agora, um dos nossos visitou sua empresa para vê-lo. Conforme decidido pela diretoria, daqui por diante, enquanto não for intimado, deverá comparecer a este Posto duas vezes por mês, para termos certeza de sua permanência na cidade. Veja bem: Isto lhe servirá de atenuante no dia do veredicto.
Delicadamente, a gerente pôs a mão em seu ombro e o impeliu para fora do escritório enquanto marchava para o almoxarifado.
Roque encaminhava-se para o portão de saída, quando foi interceptado pelo fiscal que argumentou:
- Você se envolveu numa pavorosa encrenca. Tal infortúnio é lamentável, pois haverá de enfrentar muitas contrariedades até se livrar da gerente.
- Por que você fala dessa maneira?
- Ela não é normal... Não é normal.
- Eu não penso dessa forma.
- Pense do jeito que quiser. Ela não é normal.
O funcionário replicou e foi embora em rumo de um grupo de serviçais que discutiam entre si.
Roque acompanhou seus passos, e ainda pôde escutar uma parte da conversa.
- Se você não for, ela é capaz de mandar matá-lo. Raciocine: é melhor obedecer e enfrentar a megera - dizia um deles.
- Mas ela é horrorosa, insaciável, repugnante...
- Meu amigo, você não tem melhor opção. Ou vai, ou morre. Eu já me acostumei a comer merda; por isso, nem sinto mais o cheiro da bruxa.
No momento em que o funcionário se aproximou, mudaram imediatamente de assunto. Roque franziu as sobrancelhas sem entender o estranho diálogo. Despediu-se do funcionário e partiu em seguida.


Roque compareceu ao escritório na data marcada. A gerente convidou-o a sentar-se, encarando-o firmemente, de um modo esquisito.
- Você gosta de mulheres? perguntou num tom provocante.
- Não entendi o motivo dessa indagação.
- Curiosidade... Nós mulheres somos muito curiosas com relação aos homens.
- Eu sou noivo. Gosto muito dela, e pretendo casar no próximo ano.
- Ah! exclamou um tanto desajeitada.
E prosseguiu:
- Pelo visto, você não se afastou da cidade. Isso demonstra que age com bom senso. Espero que, na próxima visita, possamos nos conhecer melhor. Apesar de delinquente, você me parece um cavalheiro.
Roque protestou alterando a voz:
- Eu não sou delinquente! Por favor, não repita mais essa maldita palavra diante de mim.
- Está bem. Não se zangue por isto... Está convocado para o próximo encontro; não vá esquecer, disse tocando em seu rosto com as duas mãos, dando por encerrada a entrevista.
Roque pôs-se de pé e retirou-se, percebendo que ela o comia com os olhos. Seus modos e expressões não o agradaram. Nesse momento, lhe veio à memória as palavras do funcionário: "Você se envolveu numa pavorosa encrenca. Tal infortúnio é lamentável, pois haverá de enfrentar muitas contrariedades até se livrar da gerente."
Quando saía da casa da noiva, certa vez, desconfiou que estava sendo observado por alguém. Tentou aproximar-se do espião, porém não logrou êxito, porque ele havia se misturado com os transeuntes e conseguira escapar da perseguição de Roque. A última conversa com a gerente não o afetara tanto; mas agora, uma pulga na orelha começava a incomodá-lo. Então decidiu não mais se expor, e ser mais cauteloso quando fosse visitar a namorada. Também, daí em diante, resolveu que não mais compareceria ao escritório da gerente, pois, até agora, não havia recebido nenhuma notificação judicial. Mas a gerente não haveria de deixá-lo em paz. No dia em que Roque deveria se apresentar, ela cuidou de arrumar-se com certo esmero e, de tempo a tempo, consultava o relógio com impaciência. Roque, no entanto, não apareceu.

O emissário estava à espera de Roque, no escritório da empresa, com um envelope na mão. Entregou-lhe o envelope e ficou sentado olhando firmemente para Roque que recebeu a mensagem e tratou de despedir o portador.
- Aguardo resposta - respondeu laconicamente.
- Porque tanta pressa? Ainda nem li o que aqui está escrito...
- As ordens que recebi são taxativas. Só sairei daqui após o senhor responder ao que aí está escrito.
Roque abriu o envelope e leu:

O acordo não está sendo cumprido. Você nos deve uma explicação. O portador aguarda sua resposta para que possamos analisar o motivo da sua conduta e tomarmos providências a respeito do assunto.

Ao terminar a leitura, virou-se para o mensageiro e disse-lhe que não havia resposta a dar naquele instante.
- Eu não tenho pressa. Aguardarei o tempo que for preciso.
E permaneceu sentado, indiferente ao que ocorria no escritório.
- Você é livre para ficar ou sair deste recinto na hora que quiser, disse Roque preparando-se para iniciar o expediente.
O emissário pegou e acendeu um cigarro, e ficou observando o ambiente; em seguida, tirou do bolso uma revista de palavras cruzadas e começou a jogar. Roque executava suas tarefas. Ocasionalmente, dava uma olhada de soslaio para o rapaz que parecia tranqüilo, fazendo seu jogo.
Após umas três horas de espera, Roque atendeu uma ligação do chefe que o convidava a ir até sua sala; quando se levantava para atendê-lo, foi surpreendido pela atitude do rapaz que empunhava ameaçadoramente um pequeno canivete.
- O senhor só sairá daqui quando me apresentar a carta para a gerente. É uma exigência dela, e eu tenho que obedecer. O senhor não sabe do que ela é capaz se eu lá chegar com as mãos vazias.
Roque apanhou um papel e escreveu:

Sem resposta.

Colocou o papel dentro de um envelope e entregou-o ao mensageiro que se retirou satisfeito com sua astúcia. Roque sabia que a represália estava a caminho.
O chefe, antes de conferir os negócios com Roque, quis saber sobre o andamento do seu caso com o Banheiro Público. Roque lhe contou detalhadamente tudo o que ocorrera, e se mostrava preocupado com as conseqüências que poderiam resultar.
Ponderou o chefe pensativo:
- Até agora, nenhuma citação. Este caso me parece muito estranho.
Pôs a mão sobre o ombro de Roque e continuou:
- Convido-o a jantarmos juntos hoje para conversarmos sobre o tema e tentarmos pôr um final a essa situação desagradável. Agora, vamos cuidar dos assuntos da empresa.


Corria pela cidade o boato de que a gerente era ninfomaníaca, e aliciava seus subalternos com promessa de algumas benesses; caso houvesse recusa, ameaçava-os e, se dessem com a língua nos dentes, poderiam até ser mortos acidentalmente por isso. As esposas dos funcionários questionaram-nos, porém, eles se negaram a implicá-la no crime, temendo as retaliações que, sem dúvida, haveriam de acontecer.
A gerente, por sua vez, cuidava dos seus interesses sem tomar conhecimento do que acontecia em volta. Sua obsessão era Roque que deixara de cumprir as recomendações de apresentar-se no estabelecimento como lhe foi estipulado, e não se conformava com tamanho descaso. Em seu escritório, escreveu outro bilhete:

Você tornou-se rebelde de uma hora para outra. Por que não segue nossas instruções? Seria melhor para ambos os lados. Poderia até ser liberado da sentença, se porventura firmasse um acordo comigo.

Após ler o bilhete, Roque tranqüilamente cortou-o em pedaços que foram parar na lixeira. Estava mais sossegado, pois, no jantar com seu chefe, tomou conhecimento de que nenhum processo tramitava contra ele, e que toda essa história não passava de uma artimanha da gerente do Banheiro Público. O chefe tinha alguns amigos no Fórum os quais se prontificaram a verificar a questão, e nada encontraram que o incriminasse em nenhuma instância. Ante tal afirmação, Roque suspirou aliviado. "Agora sou eu quem vai atacar" - determinou-se em pensamento.
Certa vez, ao chegar na empresa, alguém o abordou dizendo:
- A gerente pede encarecidamente que o senhor compareça ao seu escritório.
Roque pensou consigo: "está chegando a minha vez"; fitou o segurança:
- Você também é vítima da gerente?
Surpreso com o questionamento, ele abaixou os olhos e retrucou:
- Este é um assunto muito reservado e não vou lhe responder. Cumpro apenas o meu dever de empregado. É para isso que sou pago.
Roque entendeu o retraimento do rapaz. Sabia que todos os subordinados precisavam de seus empregos e que se submetiam constrangidos às extravagâncias da patroa. E finalizou:
- Eu compreendo sua posição... Comunique à gerente que aguarde minha visita.
- Assim será bem melhor, disse o segurança. E afastou-se logo após, dando a missão por encerrada.
Mas, nesse mesmo instante, um grupo de mulheres formado pelas mães e esposas dos funcionários do Banheiro Público promoviam um levante contra a gerente com o propósito de fazerem justiça com as próprias mãos. Para não dar na vista, foram escolhidas três mulheres que, discretamente, rumaram para o estabelecimento, contudo, ela não se encontrava no local, naquela ocasião. As mulheres regressaram dispostas a retornarem noutra oportunidade. Diziam entre si: "Ela não perde por esperar; pois a surra que haveremos de lhe aplicar servir-lhe-á de lição para o resto da vida".
Roque resolveu, por fim, defrontar-se com a gerente e encerrar em definitivo aquele impasse. A gerente aguardava com ansiedade esse momento com propósitos completamente opostos. Enquanto isso, as mulheres se mantinham à espreita de uma oportunidade para entrarem em ação.


E, quando Roque penetrou na sala, sentiu um forte abalo nervoso ao defrontar-se com a cena estarrecedora que se apresentava ante seus olhos: a gerente estava desmaiada com o corpo inteiro coberto de hematomas causados pelas pauladas que levou das mulheres. Imediatamente, após o susto, Roque falou aos empregados que se mantinham assustados e impassíveis perante aquele cenário:
- Ela precisa de socorro, urgente. Independente de sua maldade, é uma mulher doente. Por favor, chamem uma ambulância.
- Essa surra era destinada ao senhor, caso não cumprisse a promessa que fez de vir encontrar-se com ela. Foi o que me ordenou quando retornei, no dia em que fui lhe fazer o convite. Agora, ao menos por uns tempos, estarei livre dessa senhora.
Assim falou o segurança, e afastou-se indiferente. Nenhum deles estava disposto a atender ao pedido de Roque que, vendo o descaso dos empregados, ele mesmo pegou o telefone e ligou para o hospital.
A gerente estava machucada demais. Não conseguiu resistir aos golpes, e morreu a caminho do hospital.
"Não era este o desfecho que eu tencionava, mas ela mesma decretou seu próprio castigo". Considerou Roque, e partiu aliviado com o desenlace daquele terrível pesadelo.

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