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Contos-->O ENFERMEIRO DO PADIM -- 25/04/2009 - 18:06 (Umbelina Linhares Pimenta Frota Bastos) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O ENFERMEIRO DO PADIM


Na manhã de um dia chuvoso de abril um jovem interiorano trajando roupas simples, todo encharcado e enlameado e com uma sacola de roupas chegava num hospital de Belo Horizonte.
Na portaria apresentou uma carta e perguntou por seu pai. O rapaz tinha um belo rosto e olhos tristes. Acabava de chegar de uma cidade pequena do interior mineiro.
O seu pai havia saído de casa para procurar trabalho, mas poucos dias depois adoecera. Só teve tempo de escrever umas poucas linhas para a família comunicando a sua chegada e que estava hospitalizado.
A sua esposa ficou muito aflita com a notícia, mas não era possível uma viagem para capital porque tinha uma filhinha doente e outra que ainda mamava no peito.
Desta forma resolveu mandar o seu filho mais velho, com algum dinheiro, para fazer companhia ao pai chamado de Padim por todas as pessoas que o conhecia.
A viagem durou dois dias e na portaria o atendente leu, às pressas, a carta que o rapaz havia levado para identificar o pai. Chamou um enfermeiro e pediu-lhe que encaminhasse o jovem até o quarto onde se encontrava o doente.
Como é o nome do pai dele? Perguntou o enfermeiro. O moço bastante nervoso, tremendo muito e com receio de receber uma má notícia disse gaguejando o nome do seu pai.
O enfermeiro não se recordava do nome. Por acaso é um velho operário que veio do interior? Perguntou. O rapaz cada vez mais nervoso respondeu que se tratava realmente de um operário do interior, mas que não era muito velho.
Quando ele deu entrada no hospital? Que dia? Perguntou o enfermeiro. O jovem deu mais uma olhada na carta e respondeu: “Uns cinco dias, eu acho”.
O enfermeiro olhou para ele sem responder. Depois de alguns minutos que pareceram horas, pediu ao rapaz que o acompanhasse. Subiram alguns degraus de escada e ao final de um grande corredor, pararam em frente de um quarto grande que se encontrava com a porta aberta.
Evidentemente tratava-se de uma enfermaria, pois, havia duas fileiras de leitos. Siga-me falou o enfermeiro. O jovem enchendo-se de coragem entrou no quarto, olhando para os rostos pálidos e cadavéricos dos doentes.
Alguns pacientes gemiam como crianças. O quarto estava escuro, o ar com um cheiro forte de remédios. Duas freiras freneticamente iam e viam com vidros, injeções e materiais para curativos.
Ao chegarem ao final da fileira de leitos o enfermeiro parou e disse: “Aqui está o seu pai!... O jovem começou a chorar, deixou a sacola cair, colocou a cabeça sobre o ombro do doente, agarrando-lhe o braço estendido e imóvel sobre o lençol.
O doente não se mexeu, o jovem levantou-se sempre olhando para o pai e chorou descontroladamente. Neste exato momento o doente procurou o seu olhar com olhos extremamente tristes, mas os seus lábios não se moveram.
Pobre Padim!... Como ele estava diferente, a doença havia acabado com ele, estava bastante mudado. Seria impossível o filho reconhecê-lo naquele estado. Os cabelos estavam mais brancos, a barba crescida, o rosto estava inchado e muito vermelho, os olhos meio apagados.
Respirava com bastante dificuldade. Padim!...Padim!... O que o senhor tem? Olha! Sou eu, o seu filho Keko!... O seu pai não se mexeu e continuou a respirar com dificuldade.
Keko puxou uma cadeira para perto do pai e se perguntava a que horas viria um médico para visitar o doente. Pensou na sua mãe, nos seus irmãos.
A viagem do pai havia enchido de esperança toda a família que contava com o emprego para o sustento da família. Já imaginava a mãe chorando e o pai morto.
Divagou por algum tempo com pensamentos bons e ruins. Subitamente uma mão tocou-lhe o ombro e o fez estremecer; era uma religiosa, mais precisamente uma freira. Keko perguntou-lhe: “O que tem o meu pai”? “É teu pai? Indagou-lhe a irmã com doçura? “É sim senhora, é o meu pai, e eu... Mas o que é que ele tem? Coragem meu filho! Respondeu a irmã, logo chegará um médico, e se retirou sem dizer mais nada.
Meia hora depois entraram uma enfermeira, um médico e uma irmã de caridade. Passavam em cada leito. A demora parecia eterna, cada passo do médico uma eternidade
Finalmente se aproximaram do leito vizinho. O médico tinha os cabelos bem grisalhos, era alto e uma expressão séria. Quando o médico se aproximou Keko levantou-se da cadeira e começou a chorar. O médico olhou para ele penalizado.
Este é o filho do doente, disse a freira, chegou esta manhã do interior. O médico pousou-lhe a mão no ombro, e depois se inclinou em direção ao doente, tomou-lhe o pulso, auscultou-lhe o peito. “Refletiu por um momento e disse:” Continua com mesmo quadro. Mas o que tem meu pai, perguntou aflito o rapaz? Ânimo rapaz!... Respondeu-lhe o médico. Seu pai tem uma erisipela facial. É grave, mas as esperanças não estão perdidas. Fique junto dele, a sua presença lhe faz bem.
Mas ele não me reconhece, exclamou o rapaz amargurado! Há de vir a reconhecê-lo. Talvez amanhã! Pense sempre o melhor, disse o médico. O médico continuou com a sua visita, e deixou Keko com a sua função de enfermeiro.
Na impossibilidade de fazer mais coisas, ele arrumava a roupa de cama, tocava de vez em quando na mão do doente, e quando a irmã de caridade trazia o remédio e a água, ele tirava da mão da irmã e ele próprio colocava na boca do doente.
O primeiro dia se findou, e durante a noite o jovem dormiu em cima de duas cadeiras no canto da enfermaria. Pela manhã reinicia o seu doloroso ofício. Ele nota nos olhos do doente uma expressão diferente como se quisesse lhe revelar algo, ele inclusive esboça alguns movimentos com os lábios.
Nas outras duas vezes que o médico visitou o doente notou alguma melhora. À tarde ao colocar o remédio na boca do paciente, notou um leve sorriso.
Keko começou a alimentar alguma esperança, falava sobre a mãe, os irmãos, palavras ternas e amorosas para dar ânimo ao pai, porque percebia que o pai ouvia, mesmo que não compreendesse.
Passou-se o segundo dia, o terceiro, o quarto e o paciente ora apresentava melhora, ora piora no seu quadro.
O jovem com a preocupação com o seu pai se alimentou apenas duas vezes ao dia com um pedaço de pão com queijo, que a irmão de caridade havia levado.
Nada a sua volta lhe chamava a atenção, nem o corre-corre dos enfermeiros, médicos e visitantes. Ele estava sempre atento ao seu Padim, estremecendo a cada suspiro e a cada olhar.
No quinto dia o doente piorou repentinamente. O médico balançava a cabeça como querendo dizer que estava tudo acabado.
Keko chorava e soluçava, mas parecia que o doente melhorava lentamente apesar do prognóstico do médico. O paciente não queria beber nem tomar os remédios se não fossem ministrados por ele.
Ele dizia ao ouvido do pai: “Coragem.. Coragem Padim! Vai ficar curado, vai ficar bom, iremos abraçar a mamãe e os meninos! Ânimo!
Justamente naquele momento, quatro horas da tarde, Keko ouviu próximo da porta da enfermaria barulho de passos e logo em seguida as seguintes palavras: “Até a vista, irmã!... Keko deu um pulo e soltou um grito estrangulado, porque a voz era muito familiar.
Ao mesmo tempo entrou na enfermaria um homem com uma sacola na mão seguido por uma irmã de caridade. Keko ficou paralisado, pois o homem que acabava de entrar e agora o encarava e corria direto para os seus braços, chamando por seu nome era o seu pai. A cena foi bastante barulhenta e emocionante.
As irmãs, os enfermeiros todos acorreram para o local para saber o que estava acontecendo. Oh! Meu filho!... O que aconteceu? Perguntou o pai, após ter olhado atentamente para o doente próximo ao seu filho e sem parar de abraçá-lo e beijá-lo.
Como foi que aconteceu uma coisa desta? Levaram-te junto à cama de outro doente?! Recebi a carta de sua mãe dizendo que você viria, e como não chegava nunca já estava ficando desesperado.
Pobre do meu filho! Há quantos dias está aqui? Que confusão foi esta, meu Deus? Olhe, realmente eu escapei por pouco, mas, agora me sinto bem melhor. E sua mãe? As crianças? Como vão todos eles.
Bom, o que interessa é que tudo acabou bem e já estou saindo do hospital. Vamos embora?!
Keko fez um relato sobre a situação em que se encontrava a família, sobre os dias horríveis que passou no hospital e do medo terrível de perder o pai. O relato era sempre entrecortado pelos abraços e beijos que não se cansava de dar no amado Padim.
Bom, mas chega de papo furado. Vamos embora que logo estaremos em casa, disse o pai. Mas Keko voltou o olhar para onde se encontrava o doente. Então? Não vens? Repetiu o pai.
Keko novamente voltou o olhar para o enfermo que naquele momento abria os olhos e o olhava fixamente. O rapaz sentiu uma torrente de sentimentos contraditórios. A imensa vontade de ir embora, mas, ao mesmo tempo uma grande compaixão pelo pobre doente desamparado a quem estava dedicando-se de corpo e alma por cinco dias.
O fato do enfermo não parar de olhar para ele fez com que tomasse uma decisão.
Ouça pai, este homem está muito mal e sou eu que lhe dou os remédios por isso peço-lhe que tenha paciência, não tenho coragem de abandoná-lo. Voltarei para casa amanhã... Por favor, consinta que eu fique aqui mais um pouco, não posso abandoná-lo. Veja!... Veja! Come ele está me olhando!
Eu não sei quem é ele, mas sinto que precisa de mim. Tenho certeza que morreria se deixá-lo agora. Deixe-me ficar querido Padim?!
Bravo!...Bravo! Meu jovem exclamou um dos assistentes. Parabéns pela generosidade. O pai também ficou perplexo, mas, ao mesmo tempo comovido pelo comportamento altruísta do filho.
Mas... Quem é ele? Perguntou o pai. É um trabalhador do campo, um sertanejo que veio de uma cidade próxima e deu entrada no mesmo dia que o senhor, respondeu a enfermeira. O trouxeram para cá sem sentidos e não pode dizer nada até agora, continuou a enfermeira.
O pai naturalmente concordou dando-lhe a permissão para ficar. Nisso um dos assistentes murmurou que a permanência do filho não seria por muito tempo.
Então fique com Deus meu filho eu vou direto para casa para despreocupar a sua mãe e seus irmãos, fique com este dinheiro para as tuas despesas. Abraçaram-se calorosamente.
O jovem após a partida do pai voltou junto ao leito do enfermo que pareceu mais consolado. Continuou a servir-lhe de enfermeiro com a mesma paciência, dedicada antes, ao pensar tratar-se do próprio pai.
Continuou a dar-lhe água, os remédios, arrumando a roupas de cama e principalmente a afagar-lhe as mãos e falar com carinho para animá-lo. A tarde terminou, seguiu-se a noite e ele sempre ao lado do doente.
No dia seguinte a piora do velho era visível a cada hora que se passava. A respiração ficava mais curta e a infecção mais violenta. O médico, a enfermeira e a irmã de caridade olhavam o paciente e saiam com evidente preocupação.
Tarde da noite o médico retornou acompanhado de um enfermeiro com uma lanterna. Observou o paciente e disse que ainda estava respirando. Keko colocou a sua mão sobre a mão do pobre velho, que neste momento abriu os olhos fixando-os nos seus e logo tornou a fechá-los.
O jovem teve a impressão de um aperto de mão e exclamou em voz alta: “Apertou-me a mão!” O médico examinou atentamente o paciente e balançou a cabeça. A irmã de caridade tirou um crucifixo da parede e colocou junto ao leito.
Morreu? Perguntou o jovem. Sim, respondeu o médico, a missão dele na Terra terminou. Agora terá a eternidade para descansar. Ele bem que merece, depois de tanto sofrimento. Deus com certeza irá acolhê-lo.
A irmã afastou-se por um momento e voltou com umas violetas retiradas de um vaso e entregou ao rapaz. Guarde-as como lembrança da sua permanência no hospital.
Obrigado, agradeceu o jovem, segurando com uma mão as flores e a outra enxugando as lágrimas dos olhos.
A minha viagem de retorno será muito longa e cansativa, estas flores não resistiriam por tanto tempo por isso as deixarei com o pobre morto como prova da minha estima e dos meus sentimentos.
Obrigado irmã! E muito agradecido ao senhor também, doutor!...E voltando-se para o morto. Adeus!...E enquanto procurava algum nome com o qual chamá-lo, veio diretamente do coração para os lábios o nome que lhe dera durante cinco dias extenuantes... Adeus! Adeus! Pobre Padim!
Pegou a sacola com os poucos pertences, e com passos indecisos se dirigiu para a rua onde acabava de despontar os primeiros raios de sol.


( Umbelina Frota, 21/08/2002 )


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