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Cronicas-->O Último Choro de Noel -- 18/12/2005 - 19:02 (Carlos Eduardo Canhameiro) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O Último Choro de Noel

Carlos Canhameiro

As unhas cravadas na terra vermelha [ele não queria ir]. O pai puxava as pernas com força, os dedos feridos, sangue, terra e dor [ele queria ajudar]. Os olhos explodiram em lágrimas, a garganta desfez em grito e o corpo seguiu a direção contrária [ele se rendeu à força do pai].
- Eu só quero ajudar...
- Ninguém aqui pediu sua ajuda, moleque.
O rosto, o chão, as lágrimas, o pó, a baba, todos juntos, a prova pictórica do sofrimento.
- Por favor, pai.
- Ninguém vai te ajudar quando você precisar. Ninguém, Noel. [O pai não precisou dizer "guarde minhas palavras" porque ele já havia feito].

Hoje ele olha através da janela do chalé [tudo o que quis sempre foi ajudar]. A neve cai lacrimosa pelo lado de fora. Olha a antiga fábrica de ilusões, desativada, há tempos. Seu pai em sua cabeça, mais uma vez martelando suas convicções, renascendo a cada visita da solidão. Memória inoportuna. [Noel está velho].
Sonhou em transformar o Natal, um [re]nascer da alegria perdida. Foi caridoso, construiu [enquanto pode] todos os brinquedos com as próprias mãos. Tudo deu certo, cresceu, prosperou, outros se juntaram a ele, o mundo fazia o bem pelo menos uma vez por ano [O mundo sempre quer mais]. Noel estava certo, o pai fracassara.

Há duas horas mamãe Noel atravessara a porta prometendo nunca mais voltar. E nunca mais voltaria, a mamãe que nunca tivera filhos. Estava exausta da bondade do velhinho. Da boa vontade com todos menos com eles mesmos [Noel esquecerá de si, pecado imperdoável]. Através da janela... Ele ainda olha através da janela. A fábrica mantém-se inoperante [Brinquedos artesanais: OUT]. Mamãe Noel já está longe, com remorso mas certa da sua decisão. Ela tinha o direito de ser feliz, todos tinham [Noel sabia disso e sofria]. Ela seria feliz [E Noel?].

No mundo, Noel já era outro. Estava em todos os cantos, para todos os gostos, desejos, cores e sabores. Em cada esquina um jovem-adulto-velho trajava vermelho, bota preta, saco e gorro [Ho-ho-ho]. O mundo se sabia sem Noel, mas estava cheio dele[s]. As pessoas sabiam da ausência de Noel, mas se conformavam com as múltiplas possibilidades [O avanço, senhoras e senhores]. O mundo nunca se preocupou com as ausências porque sempre criou novos vazios. Noel era a idéia, o mundo a execução.

Todos sabiam o que pedir ao bom velhinho, e o bom velhinho, sabe o que pedir? A quem pediria? Noel está sozinho [Indivíduo único]. Mamãe Noel preferira deixá-lo agora do que mais tarde [Mais tarde seria pior]. O que poderia ser pior para Noel? Todos podem seguir os seus desejos, somos livres [Noel é livre]. A janela, ele parado, remoendo seus erros, suas omissões, um desejo infantil de voltar no tempo, corrigir o passado. Uma espera angustiante pelo bater da porta, mamãe aos prantos sentindo falta dele [Noel só queria ser amado]. Ela não volta. O pai estava certo, Noel fracassara.

"Ninguém, Noel."

- Sim, pai. Eu só queria ajudar...
- Esqueceu de você mesmo.
- Ela se foi.
- Você sabia.
[Noel sabia?]
- Eles se foram.
- Eles nunca estiveram aqui.
- O senhor me ama?
- Eu já estou morto, Noel.

A janela, a neve, Noel em pé. Lágrimas nos olhos, visão turva, dor no peito, solidão [Pena de si mesmo]. Ele só queria ajudar, esqueceu de si mesmo, esqueceu de ser feliz, esqueceu de fazer mamãe Noel feliz, esqueceu o que era felicidade, esqueceu dos dias, esqueceu dos vivos, esqueceu dos mortos, esqueceu que a dor existe, esqueceu que seria esquecido, que não seria lembrado, que o amor termina, que as pessoas mudam, que o mundo muda, que a vida é curta, perene, revolta, simples, complexa e que tudo acaba [rápido demais].

Noel está sozinho. Ninguém precisa dele e ele precisa de todos. O mundo esqueceu Noel. Noel chora, única coisa que já fez por si. Dizem:

- Este foi o último choro de Papai Noel.
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