Rua do Ouvidor
Transeuntes, tais formigas operárias nos seus ir e vir, com os olhos abaixados para o chão presente e o pensamento elevado para o céu futuro, chocam-se de quando em vez como num cumprimento forçado de quem navega numa artéria tão nervosa como és.
Vitrine natural de uma sociedade, temperas no teu leito o vistoso executivo engravatado, com o gasguito cameló que não poupa cordas vocais, para mostrar seus produtos de preços mais baixos, cujas vendas são o sustento seu e da família.
Via testemunha do viver cotidiano do nosso citadino, se algum dia fosses fechada, morreria um caminho vivo da nossa população andante, pois, és canal de comunicação de quem vai e de quem vem à procura da sobrevivência.
Verdadeira ponte entre o trabalhar e o ficar em casa, portas mil te fazem fronteira natural, dando acesso à s lojas de variedades múltiplas que te enfeitam ou enfeiam, com suas fachadas caleidoscópicas.
Nasces numa praça, morres em outra, ó logradouro alegre, aonde conversas são perdidas e os sonhos de uma melhoria de vida são comentados, enquanto não sai o resultado do jogo do bicho.
Artéria ebulitiva da minha cidade, raia por onde correm homens a buscar o incerto, rica em cenários inesquecíveis como o observador ansioso da esquina da praça, que espera passar o vento amigo rodeando saias de moçoilas distraídas.
Nobre rua pobre és fonte de vida para uns, passatempo para outros, albergando o homem que trabalha aos gritos, o aposentado que observa e sussurra, o descuidista pronto para dar o golpe, fazendo-te viva, ó imponente meretriz alameda da minha cidade.
Pessoa 1998
|