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Cronicas-->Lições da Maturidade -- 03/10/2005 - 17:49 (Gisela Scheinpflug) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
É interessante acompanhar o amadurecimento do ser humano. É bonito perceber as nuances da forma como cada um exerce a sua própria racionalidade e também a sua humanidade. Tenho amigos e amigas de todas as idades, e isto me faz feliz porque, conversando com eles eu esqueço da minha própria idade. As vezes tenho sessenta anos, e as vezes volto a ter vinte. É divertido também acompanhar o amadurecimento dos amigos. Tenho amigos hoje aposentados, que hoje estão curtindo a vida, e que os conheci quando tinham 40 anos, em pleno ápice das suas vidas profissionais.

É possível perceber mudanças interessantes, tanto em homens quanto em mulheres. É triste constatar, mas percebo genericamente que o amadurecimento faz mais bem aos homens do que às mulheres. Tudo o que falarei aqui são percepções pessoais e genéricas. Felizmente por vezes, e por horas infelizmente, temos exceções à praticamente todas as regras. E quem sou eu para ditar alguma regra.

O homem, chegando aos quarenta anos, descobre que não é preciso provar a sua própria masculinidade. Então aprende a dizer não, e a escolher melhor às mulheres com quem compartilha a sua vida sexual. Não é mais qualquer baranga que emplaca. Muito menos aquela gostosona que ele conheceu no bar e que que vai incomodar amanhã, mas que os amigos insistem porque não tem como deixar pra lá. O homem de quarenta deixa pra lá. Manda pra longe.

Já a mulher de quarenta anos faz o caminho inverso do que vinha trilhando desde os vinte anos. Ela chega ao dito ápice da sua vida sexual tomando atitudes que poderiam ser categorizadas com palavras pouco amenas, tais como um "furor vaginal", e um "calor na perseguida". Tudo o que ela negou até então, irá concordar nesta época da sua vida. E não apenas concordar, mas também sugerir e incentivar.

Talvez esta inversão no comportamento de homens e mulheres, que presenciamos nos humanos por volta de vinte anos de idade, com os homens experimentando de tudo e as mulheres retraindo-se, e depois, aos quarenta anos, com a retração masculina, que torna-se até mesmo uma retração física, literalmente, e a soltada de franga geral das mulheres quarentonas, explique a tendência geral do universo, que não é de hoje mas que atualmente pode ser apresentado escancaradamente à humanidade, dos casais se formarem com tamanhas diferenças de idade.

Ainda genericamente, parece que o homem se resolve com o tempo, enquanto a mulher se perde um pouco na poeira da vida. O homem se desprende dos tais valores machistas que lhe eram exigidos sob forma de comportamento fálico, e aprende a falar abertamente dos seus próprios sentimentos. Já a mulher, talvez em parte por estar falando sobre sentimentos já há tanto tempo, e em parte pela pressão geral da sociedade, e dela própria, em manter um corpo bonito e um rosto saudável e jovial, começa a remoer amarguras em quantidades maiores do que deveria. Como falei antes, isto são suposições. Pequenas divagações da minha mente inquieta. Como sou mulher, gostaria muito de pensar diferente disto, e rezo diariamente para que eu me encaixe na exceção desta possível e maldita regra.

Fiz amizade com um vizinho no meu prédio. Nossa primeira conversa tomou um rumo bastante curioso, uma profundidade estranha para pessoas que recém se conheciam e que moravam tão próximas. Falamos sobre relacionamentos, sobre a insanidade humana, e principalmente sobre as dificuldades em colocar no passado o exato momento em que estes dois assuntos se interseccionaram na formação de uma história traumatizante. Não quero ser preconceituosa aqui, mas acredito que o fato de meu vizinho já ter passado dos sessenta anos contribui para alcançarmos níveis tão bons de conversação, em um diálogo desprovido de proteções e defensivas desnecessárias.

Este mesmo vizinho me apresentou o Id. Não sei se este tal Id era mesmo a pessoa certa, mas pelo menos travamos um primeiro contato. Faço terapia há cinco anos, mas nunca me preocupei muito em distinguir egos, super-egos e ids. Mas quanto mais aprendo a este respeito, mais me interesso.

Parece que o tal Id seria o nosso desejo mais interno, do nosso eu mais profundo. Meu vizinho contou que, havendo passado por três relacionamentos com as mesmas características, com a traição da mulher ao final do relacionamento e a devida constatação de que ele não as amava mais, resolveu analisar o que estava acontecendo. E descobriu que estava mentindo para si mesmo, dizendo que não amava mais a mulher, como uma forma de resolver suas questões masculinas relativas à infidelidade, podendo desta forma continuar com o relacionamento. Isto porque o id, o "eu mais profundo", jamais aceitaria uma traição.

Diante de conversas tão interessantes e complexas, resolvi perguntar ao meu vizinho se ele já havia feito terapia. Ele disse que havia tentado uma vez, e que a terapeuta lhe deu alta para que eles começassem a namorar. E parece que esta tal namorada, das três mulheres que lhe traíram, foi a que mais o ajudou a enganar o seu próprio id.

Depois de ouvir as histórias de meu vizinho talvez você concorde comigo que é preciso um certo grau de maturidade, geralmente alcançada com a idade, para discorrer livremente sobre assuntos tão polêmicos, e de forma tão leve e bem humorada.

Certa feita assisti no GNT à uma entrevista interessantíssima com Fernanda Montenegro. Na época acredito que ela estivesse com 83 anos. Ao final da entrevista, ela retirou de sua bolsa um chumaço de algodão e um demaquilante. Tirou o lenço do pescoço, e começou a limpar a maquilagem em frente às càmeras. Foi um susto e tanto. E então, para todos os expectadores que, àquelas alturas já voltavam a ouvir, recuperado do choque, aquela senhora respeitosa, diva do cinema brasileiro, falou que jamais conseguiria novos trabalhos se insistisse em aparecer no seu estado físico "natural". Bati palmas como uma louca frente à televisão. Paralelo a isto pensei no quanto os vizinhos se divertem comigo. Ou não. Mas as palmas batidas para a Fernanda Montenegro aconteceram porque não é qualquer artista que enfrenta o mundo de frente daquela forma.

A atitude da Fernanda Montenegro me fez lembrar as velhinhas sábias da minha família. Eram quatro, mas aos poucos elas estão trocando de morada. São minhas tias-avós. Todas já passaram dos oitenta anos, e algumas já chegaram aos noventa. A forma como elas encaram a vida é uma bênção, principalmente se eu pensar que elas fazem parte da minha família.

Uma delas, a mais delicada e doce de todas, me chamou de cantinho em uma das reuniões de família. Disse que eu deveria aproveitar mais a minha vida, e que isto incluía me maquilar mais. Ela disse que, com a idade, a pela enruga de tal forma ao redor dos olhos, que "empapuça" na hora de maquilar. Fica feio. Então ela disse para eu me maquilar, em todos os momentos possíveis, enquanto ainda houvesse tempo.

Elas são de tal forma agregadoras, que é comum as noites de Natal serem compartilhadas não apenas com os filhos, netos e bisnetos, mas também com os ex-maridos das filhas, suas atuais esposas, novos filhos e simpatizantes. E elas contam posteriormente as histórias engraçadas que surgem nestas ocasiões, com tamanha naturalidade, que você passa a sentir-se velho e antiquado ao conversar com elas.

Nas separações que acontecem dentro da família, elas aconselham sempre a todos ficarem bem com todos. Elas dizem que, no longo prazo, quando ficamos velhinhos, as rusgas se dissolvem e deixam de ter toda a importància que parecem ter no momento. Fica apenas presente aquela tristeza de ter perdido a convivência com uma pessoa que jamais deixaremos de amar. E foi ouvindo os conselhos das minhas sábias velhinhas, que retomei algumas amizades muito especiais, que haviam se rompido por uma que outra das tais besteiras às quais as minhas tias-avós se referiram.
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