Usina de Letras
Usina de Letras
146 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62213 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10450)

Cronicas (22535)

Discursos (3238)

Ensaios - (10356)

Erótico (13568)

Frases (50606)

Humor (20029)

Infantil (5429)

Infanto Juvenil (4764)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140798)

Redação (3303)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6185)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
cronicas-->OLHOS DE MAR E DOR -- 01/09/2005 - 09:40 (Cheila Fernanda Rodrigues) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
OLHOS DE MAR E DOR

Você que gosta de animais, de gato em particular, pode me entender, letra por letra.
Em minha casa, não moram apenas pessoas, moram também três gatos. Três, digamos, com o perdão da palavra, vira-latas. Mas são lindos porque são muito amados e a luz do amor embeleza tudo. São verdadeiros companheiros de jornada. Trocamos aquilo que é necessidade de todo ser vivo: afeto e respeito.
Semana passada, porém, um chorinho novo quebrou o silêncio da noite. Um choro que era respondido por outros três. Olhei pela janela e percebi os três observando algo que eu não enxergava de longe. Seria um possível novo morador? Como não me pareceu nada grave, achei que era coisa de gato, provavelmente uma briguinha para sair da rotina. Não dei muita atenção, pois nesse quesito eles se defendem bem. Dormi.
Ao clarear do dia, fui verificar se tudo estava bem e tive uma surpresa imensa. No hidrómetro, havia uma coisinha encolhida ao máximo. Uma coisinha linda. Uma espécie siamesa. Chegando perto, um miado muito dolorido. Parecia um tatu-bola de tanto que se encolhia. Embora eu seja louca por essa espécie, não sou louca a ponto de ir pondo a mão num animalzinho choroso e acuado. Liguei ao veterinário.
Segui tudo o que ele me falou. Primeiramente passei a mão na cabeça. Não houve reação de ataque. Continuei o afago e ficou nítida a acolhida. Tentei tatear e descobri algum machucado. Percebi que havia sangue em algum lugar da parte traseira e não quis mais ir em frente. Apenas coloquei-a numa caixa e trouxe o choroso pacote para dentro. Mesmo não tendo checado, minha intuição dizia que era fêmea. Quando o veterinário chegou, confirmou minha intuição,também detectou que havia hemorragia e foi logo medicando. Disse-me que lhe desse um banho de água quentinha e arrumasse um bom local para ela. Mais que depressa providenciei tudo.
Que criatura mansa! Durante o banho, uns miadinhos frouxos que eu pensava ser de medo, mas percebi que era dor, pois todo o corpo estava machucado. O que seria? Apenas deduções: atropelamento? Maldade em forma de chute ou mesmo surra? Algo mais terrível?
Tentei oferecer ração e água, mas não foram aceitas. Assim também o leite morno foi recusado. A dor deveria ser colossal, mas a manifestação era só o silêncio, a aceitação.
Nos dois dias seguintes, ela acabou tomando leite, mas gotinhas apenas. Devia estar toda machucada por dentro, inclusive os pulmões, segundo o diagnóstico do veterinário. Pobre criatura! Os olhos azuis, daqueles de mar, me olhavam firmemente como a me dizer algo. E eu a acariciava, falava com ela, rezava para que ficasse bem. Enfim, fazia tudo que meu coração mandava.
Ela continuava com hemorragia e foi se definhando, mas entre nós se estabeleceu uma ligação forte. Pena que nem colo ela quisesse! Na verdade, descobri que não era questão de querer. A dor não deixava ficar numa posição confortável no colo, além de estar sempre sangrando um pouquinho.
No sétimo dia, nem com todo o tratamento, não havia melhora. Minguava devagarinho... E eu chorava muito, muito mesmo. Nem consegui entender o tanto que as lágrimas caíam. Eram como minúsculas bolinhas transparentes que caíam sem que eu tivesse qualquer controle sobre elas. Despencavam... Inconscientemente, eu pranteava outras perdas... Às 21h30, senti muito claramente que chegava a hora final. Fiz muito carinho nela, cantei uma canção de ninar e deixei-a seguir seu caminho, um caminho que todos temos que percorrer sozinhos.
Uma hora depois fui vê-la e seu corpo estava esticado e rijo. Descansou de tanta dor. E eu me pus a chorar em cascatas. Durante quase toda a noite.
Na manhã seguinte, encontramos um lugar lindo para ela ficar definitivamente. Sob um bambuzal. Tenho certeza de que ao ouvir um bambu se curvar e soltar aquela espécie de suspiro, é como se reverenciássemos a vida e ficássemos encantadas.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui