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cronicas-->Ela -- 14/11/2000 - 23:08 (Mauro de Oliveira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
E L A
Conheci-a pela primeira vez após acabar um noivado quando tinha 21 anos. Chegou a mim sem apresentações, sem cerimónias e logo tornou-se companheira enquanto durou a dor de cotovelo. Não tinha grandes atrativos mas era inseparável nas noites vazias. Embora seja de todos, é de uma fidelidade quando se junta a alguém, que impressiona qualquer mortal.
Quando ainda não a conhecia, sempre a desejei principalmente quando estava exausto do trabalho e dos problemas da vida. Desejava ficar com ela numa praia distante, longe dos problemas e das pessoas que me rodeavam.
Quatro anos após o rompimento do noivado, ela me abandonou. Não sofri e até estava desejando a separação. Estava noutra e com outra. Quando foi embora, não se despediu, não deixou endereço e não reclamou. Soube semanas depois que estava com um amigo meu, vivendo muito bem. Em parte invejava a sua maneira de ser. Ela romàntica e eterna sentimental, era e é a tábua de salvação de muitos, embora de vez em quando leve alguns companheiros ao suicídio. Com todos os seus defeitos, de vez em quando nos encontramos e reatamos por algum tempo.
Nas minhas noites de insónia, não me sai do pensamento e fico esperando que ela chegue para revivermos os velhos tempos. Lembro-me, como hoje, quando em 68 estive em Veneza. Na praça de São Marcos, bebia
e ouvia as bandinhas regionais. Sentado sozinho, pensando no meu pessoal que deixara aqui. Ó medida que a noite ia perdendo lugar para a madrugada, os turistas iam se retirando e ficavam apenas os bêbados e alguns tenores Italianos. Quando o sino tocou 1 da manhã, ela surgiu do nada e se juntou a mim. Conversamos, revivemos as outras ocasiões em que nos encontramos, mas não perguntei de onde vinha, com quem veio, nem porque estava ali. O ultimo bar ia cerrar as portas, quando pedi uma garrafa de vinho e com ela segui para o hotel que ficava a 200 metros dali. No apartamento, abri a janela que dava para um canal e nos proporcionava uma vista extraordinária. A lua em minguante caía para o lado da Veneza continental. De vez em quando seu brilho era apagado por nuvens retardatárias do inverno. Naqueles instantes de escuridão bebia o vinho, sozinho, já que ela nunca bebeu, embora sempre tenha sido uma dama da noite e da madrugada. Lembro-me que dormi com a garrafa na mão. Quando o sol batia no meu rosto, acordei e ela já não estava lá. A noite voltei à praça com um amigo de São Paulo, que estava acompanhado de duas americanas. Ela como por encanto desapareceu. Como sempre, sem deixar recados.
Voltei a encontrá-la em Lucerne na Suiça. Estava cansado, sem ninguém conhecido por perto, num Hotel Familiar. O frio gostoso convidava ao Brandy com chocolate. Pela vidraça do hotel via a neve caindo em flocos, deixando as montanhas brancas e limpas como espírito dos inocentes. Depois de dois cálices, um calor torpe subiu-me à cabeça e logo meu espírito voou para o Recife, para junto dos meus familiares. Como em Veneza, ela apareceu do nada e sem palavras sentou-se a meu lado. Fui para o quarto com uma garrafa de Brandy. Ela me acompanhou. Conversamos coisas amenas e nos deitamos. Acordei às 9. Não havia almoçado, mas ainda estava claro. Lá a noite demora a chegar. Descemos e fomos jantar. Durante o jantar o dono do hotel me apresentou sua filha que falava português. Foi o suficiente para que ela fosse embora. Não a vi mais na Suiça.
Voltei a encontrá-la no avião quando retornava ao Brasil. Foi fácil reconhecê-la. Na classe turista havia pouco mais de 20 pessoas, cansadas e loucas para chegar. A maioria vinha dormindo. Acordados, só eu e ela. Conversamos até o Recife. Quando encontrei meus pais no aeroporto, ela desapareceu.
Depois de casado, estivemos algumas vezes juntos. Normalmente quando saía a serviço do banco e a viagem durava mais de 2 dias. Ela adora viajar. Acho que é por essa razão que tem tantos companheiros diferentes. Embora passe de mão em mão, é fiel e só vai embora quando sente que não é mais necessária. Nunca pede nada a ninguém, mas vive muito bem e faz muita gente viver bem. Quase todo homem já desejou tê-la como eu, em alguma ilha deserta ou algum lugar distante. É a companheira ideal para colocarmos em dia e em ordem nossas vidas desarrumadas. Precisamos apenas usá-la o tempo necessário para compor a ocasião e partir para outra.
Raramente ela vem aqui em casa. Normalmente chega quando a mulher está fora e os meninos de férias ou dormindo. Ultimamente no entanto ela tem aparecido com frequência. Meu filho mais velho costuma chegar tarde, minha filha de 15 anos conversa pouco e o meu pequeno dorme muito cedo. Basta um desentendimento corriqueiro com minha mulher, que ela vai dormir e deixa-me sozinho com minha insónia. Procuro ler, escrever, ver televisão, ouvir música, em suma, faço tudo para esquecê-la mas não consigo. Ela me entende, adivinha e aparece no começo da madrugada. Chega solerte, tranquila, mesmo sabendo que não a quero mais; que é perigosa; que é gostosa; que eu a quero muito, mas não agora, aqui. Se minha mulher e meus filhos souberem, como vai ser? Ela então me diz: Você está precisando de mim e eu estou aqui. Doravante, após os cinquenta anos, você vai ter que me aturar e gostar de mim muito mais do que ao tempo em que era moço. Procure se conformar, porque eu sou tão necessária quanto a sua mulher e seus filhos. A única hora em que você descansa e foge de seus problemas é quando fica comigo. - Então respondi: Está certo, vou me conformar, mas já passa das duas da madrugada e desta vez sou eu que quero desaparecer. Deixe-me dormir. Boa noite SOLIDÃ…O.

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